População da China: bônus demográfico e envelhecimento, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
População da China: bônus demográfico e envelhecimento, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
[EcoDebate] A China é o país mais populoso do mundo e, desde 2014, possui a maior economia (quando medida em paridade de poder de compra). Desde o início das reformas promovidas por Deng Xiaoping, em 1978, a China apresentou – em 40 anos – o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) mais robusto de toda a história econômica global. Diversos fatores contribuíram para este desempenho excepcional e dentre os mais importantes está a dinâmica demográfica e a janela de oportunidade criada pela mudança da estrutura etária.
O gráfico abaixo, com dados das novas projeções demográficas divulgadas pela Divisão de População da ONU (revisão 2019), mostra a população total e por grupos etários da China entre 1950 e 2100. Como a China passou pela transição demográfica no século XX, terá, no século atual, uma grande mudança na estrutura etária. A população total que era de 554 milhões de habitantes, em 1950, cresceu nas décadas seguintes e deve atingir o pico de 1,46 bilhão em 2031. A partir daí vai iniciar um processo de decrescimento até ficar com 1,06 bilhão em 2100. Do pico ao final do século a China vai perder 399 milhões de habitantes.
Como a taxa de fecundidade chinesa começou a cair rapidamente no início da década de 1970, a população de 0 a 14 anos passou de 188,7 milhões de jovens para o pico de 370 milhões em 1976, iniciando um longo período de declínio, devendo ficar com 146,8 milhões de jovens em 2100 (uma redução de 223,5 milhões em 124 anos). Já a população em idade ativa (PIA) – que é fundamental para o desenvolvimento econômico de qualquer país – passou de 341 milhões de pessoas em 1950 para o pico de 1,02 bilhão em 2015. Portanto, a quantidade de pessoas em idade de trabalhar (15-64 anos) na China já está diminuindo e deve ficar com 579 milhões em 2100. Cabe destacar que a PIA vai ter uma perda de 443,6 milhões de pessoas em 85 anos, valor superior à perda da população total.
Enquanto caem a população de 0-14 anos e a população de 15-64 anos, cresce a população idosa. O envelhecimento populacional na China vai ser intenso e rápido. A população de 60 anos e mais que era de 41 milhões em 1950 vai continuar crescendo, mesmo depois do declínio da população total chinesa, e deve atingir o pico em 2052 com um montante de 490 milhões de idosos, caindo posteriormente para 402,8 milhões em 2100. A população de 65 anos e mais vai atingir o pico em 2057 com 400,1 milhões de idosos (quase o dobro da população brasileira). E a população de 80 anos e mais que era de somente 1,5 milhão de pessoas em 1950 deve atingir o pico de 157,6 milhões em 2072 e cair para 151 milhões em 2100. Todos estes números estão resumidos na tabela abaixo.
O que os dados da dinâmica demográfica da China mostram é que o momento mais favorável do bônus demográfico já passou, conforme mostra o gráfico abaixo. Em 1966, a População em Idade Ativa (PIA) representava 55,1% da população total e a Razão de Dependência (RD) estava em 81,4%. Portanto, a proporção de pessoas em idade de trabalhar era a mais baixa e a proporção de pessoas dependentes (jovens e idosos) era a mais alta. Mas a partir de 1967 a estrutura etária ficou mais favorável e, em 2011, a PIA representava 73,2% e a RD representava 36,6%. Ou seja, tinha alta proporção de pessoas em idade produtiva e baixa proporção de dependentes. Portanto, era o auge do bônus demográfico.
A partir de 2012 a PIA chinesa começou a crescer menos que a população total e a RD começou a subir. Portanto, a janela de oportunidade chegou ao ponto de abertura máxima e passou a reduzir a abertura. O impacto sobre o crescimento econômico é imediato, pois enquanto a janela se abria o crescimento do PIB chinês ficou em torno de 10% ao ano, mas depois que a janela começou a se fechar o crescimento do PIB diminuiu para a faixa de 6,5% ao ano. A PIA chegou ao pico em 2015 (1,02 bilhão de pessoas) e a disponibilidade de pessoas em idade ativa começou a diminuir e deve ser reduzida em 442,6 milhões de pessoas até 2100. Para lidar com esta diminuição na oferta de trabalho, a China tem investido em automação e robotização da linha produtiva. Assim mesmo, não será fácil elevar a produtividade para compensar a redução da PIA.
O principal desafio futuro será o intenso e rápido processo de envelhecimento populacional. Como vimos antes a população de 60 anos e mais que era de 41 milhões de pessoas em 1950 subiu e deve atingir o pico de 490 milhões em 2052. A população de 65 anos e mais era de 24,6 milhões em 1950 e deve atingir o pico de 400 milhões em 2057. A população de 80 anos e mais era de 1,5 milhão em 1950 e deve subir até o pico de 157,6 milhões (um aumento de cerca de 100 vezes). Depois do pico, as 3 categorias de idosos diminuem em termos absolutos. Mas como mostra o gráfico abaixo, o Índice de Envelhecimento vai continuar crescendo ao longo de todo o século XXI.
Considerando o IE para o grupo de 60 anos e mais, a China vai se tornar idosa em 2021, quando houver mais habitantes com 60 anos e mais do que jovens de 0-14 anos. Considerando o IE para o grupo de 65 anos e mais, a China vai se tornar idosa em 2029, com IE acima de 100. Considerando o IE para o grupo de 80 anos e mais, a China vai ter uma estrutura etária idosa em 2098, quando houver mais habitantes de 80 anos e mais do que jovens de 0-14 anos. Em 2100, o IE para a categoria de 60 anos e mais será de 274 idosos para cada 100 jovens, o IE de 65 anos e mais será de 231 idosos para cada 100 jovens e o IE de 80 anos e mais será de 103 idosos para cada 100 jovens de 0-14 anos.
Em síntese: o período mais favorável da estrutura etária já passou. Na década de 2020 a janela de oportunidade vai, progressivamente, se fechar. Mas as dificuldades maiores surgirão após 2030, quando uma estrutura etária idosa reduzirá a disponibilidade da oferta de força de trabalho. Tudo indica que os dias de alto crescimento do PIB vão ficar para trás e a China tem pouco tempo para enriquecer antes de envelhecer.
José Eustáquio Diniz Alves
Colunista do EcoDebate.
Doutor em demografia, link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 05/07/2019
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