Líder arrozeiro diz que grupo não sai da terra indígena Raposa Serra do Sol. Índios vão esperar que governo retire os arrozeiros até março
Não há possibilidade de grandes produtores agrícolas entrarem em acordo com o governo federal para deixar a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, área de 1,7 milhão de hectares em Roraima. A afirmação foi feita ontem (29) pelo presidente da Associação dos Arrozeiros de Roraima, Paulo César Quartiero. Em entrevista à Agência Brasil, ele disse não acreditar na realização de uma operação para retirar os produtores à força. Por Marco Antônio Soalheiro, repórter da Agência Brasil
“Isso já é um assunto superado porque não tem condição de ser efetivada uma operação dessa. A população de Roraima não aceita o intervencionismo do governo federal com medidas antidemocráticas e ditatoriais”, disse Quartiero.
A homologação da terra indígena, em abril de 2005, é definida pelo arrozeiro como “medida fraudulenta”. Ele ressalta que a atividade agrícola gera R$ 130 milhões de faturamento bruto por ano e fortalece a economia do estado.
Quartiero desqualificou as declarações do coordenador executivo do Comitê Gestor do governo federal em Roraima, José Nagib Lima, para quem a retirada dos arrozeiros da Raposa Serra do Sol é prioridade.
“Parece até que não tem governo estadual nem representante eleito aqui”, criticou o arrozeiro.
“O senhor Nagib só vai para a imprensa mentir à população e acredito que faça o mesmo ao presidente Lula [Luiz Inácio Lula da Silva], passando uma imagem diferente da realidade que acontece em Roraima.”
Os reassentamentos propostos pelo governo federal aos arrozeiros são, segundo Quartiero, “campos de extermínio da população”.
O produtor também enxerga a influência de interesses estrangeiros nos argumentos de ambientalistas e índios que cobram a retirada dos produtores da Raposa Serra do Sol. Para ele, a classe produtora é vítima de perseguição. “Já nos chamam de grileiros, de devastadores e é tudo isso mentira. Daqui a pouco vão dizer que usamos trabalho escravo ou que estupramos não sei quem.”
Quartiero também negou que todos os seus bens tenham sido bloqueados pela Justiça em razão de irregularidades que teria cometido na prefeitura de Pacaraima (RR), de onde saiu cassado por compra de votos. Admitiu apenas o bloqueio de R$ 21 mil, contra o que já recorreu.
Quartiero ironizou as acusações de corrupção. “Me acusam de ter roubado travesseiro, colchão, mesa e cadeira. Graças a Deus a prefeitura não tinha galinheiro, porque senão iam dizer que roubei as galinhas.”
O líder arrozeiro reiterou não abrir mão da permanência na terra indígena. “Nós representamos a resistência de Roraima e a defesa do território nacional na Amazônia.”
Índios vão esperar que governo retire até março arrozeiros da Raposa Serra do Sol
Se o governo federal não realizar, até o fim do mês de março, uma operação para retirar os produtores de arroz da terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, os índios da região estão prontos para expulsar os fazendeiros de suas terras. Foi o que garantiu ontem (29) à Agência Brasil o coordenador geral do Conselho Indígena de Roraima (CIR), Dionito José de Souza.
“Já estamos cansados de sofrer violência, ameaça e abuso dentro da nossa própria casa. Isso a gente não aceita mais. Esperamos só até março, e se não ocorrer [a operação de desintrusão], vamos ter que fazer o trabalho que o governo prometeu”, afirmou Souza.
Segundo o líder indígena, a resistência de rizicultores e fazendeiros em deixar a Raposa Serra do Sol é um desrespeito à decisão do governo brasileiro e aos povos indígenas. Cerca de 18 mil índios das etnias Ingaricó, Macuxi, Patamona, Taurepang e Wapixana ocupam a área. “Os brancos dizem que somos invasores, mas ninguém invade sua própria terra”, disse Souza.
O coordenador do CIR informou que se encontrou recentemente com representantes da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do governo federal em Roraima, quando lhe foi dito que a operação de desintrusão está prevista e vai sair. Entretanto, acrescentou Souza, a data da medida não foi informada.
Dionito de Souza confirmou que o CIR formalizou reclamação na Organização das Nações Unidas (ONU) sobre a demora do governo brasileiro em cumprir a promessa de retirar os arrozeiros da Raposa Serra do Sol: “Fizemos isso para que saibam que estão brincando com a lei no Brasil.”
De acordo com Souza, a produção de alimentos para a população de Roraima não seria prejudicada com a mudança de local dos arrozeiros. “Eles [os arrozeiros] estão perdendo tempo. Já deveriam ter ido para onde o Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária] quer reassentá-los, em áreas até maiores do que as de hoje.”