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Erradicação do sub-registro: A cada ano, 400 mil crianças deixam de ser registradas no país

Legião de invisíveis – Lucas tem quatro meses de vida, mas ainda não é considerado um cidadão. “É ninguém”, segundo a mãe, Irdeane Pereira de Sousa, de 15 anos. É que, como ela própria não tinha documentos, não pôde registrar o filho. Como Lucas, a cada ano, mais de 400 mil brasileirinhos deixam de ser registrados até o primeiro ano de vida. Segundo o último levantamento do IBGE, divulgado neste mês, em 2007, 12,2% dos nascidos não foram registrados. Não há estatísticas sobre os brasileiros adultos sem registros. Matéria de Soraya Aggege, do O Globo, 29/12/2008.

O sub-registro de nascimento é definido pelo IBGE como o conjunto de nascimentos não-registrados no próprio ano de ocorrência ou até o fim do primeiro trimestre do ano subseqüente. Na análise da série 2000-2007, apresentada este mês, o percentual de sub-registro de nascimento no país variou de 21,9%, em 2000, para 12,2%, em 2007, sendo que no último ano praticamente não houve alteração, com leve redução de 0,5 ponto percentual.

Irdeane é mãe solteira e saiu do Maranhão em maio para viver com a família em Polvilho, um bairro de Cajamar (SP). Sem documentos, nem emprego, mal sabe ler e escrever. No cômodo de 16m que divide com Lucas, seus dois irmãos e o pai, que é deficiente físico, falta comida e muito mais. Irdeane não soube explicar o que significa a palavra cidadania, mas sente na pele a falta dos seus direitos mais básicos. Ela afirma que o pior mesmo é viver sem documentos. É como se não existisse legalmente.

– Gente sem documento é ninguém. Quero que o Lucas seja doutor, para cuidar dos velhinhos doentes. Mas até agora, não consegui nem entrar no Bolsa Família – conta Irdeane, que graças à ajuda de vizinhos, acaba de receber a própria certidão de nascimento.

Secretaria faz campanha nacional

Nascida em Caxias (MA), Irdeane mudou-se para Polvilho em maio, ainda grávida. Não sabia que precisaria de documentos:

– Na viagem, ninguém me pediu nada. Nunca na vida me pediram documento. Agora, aqui em São Paulo, me disseram que podem até dizer que roubei o meu filho. Vou parar na polícia, presa. Cidadania é isso, poder ser presa? Fico com medo. Se levar o bebê no hospital, se ele passar mal. Melhor não levar, não é?

Quando a Pastoral da Criança descobriu a situação da família Sousa, em Polvilho, percebeu que não adiantava apenas oferecer a multimistura para Irdeane se alimentar melhor e incentivá-la a amamentar Lucas. A entidade participa da campanha que o governo federal mantém para reduzir o número de sub-registros no país.

– No caso da Irdeane, não conseguimos fazer o registro. Ela nasceu no Maranhão e ficou tudo muito complicado. Então procuramos os vicentinos (outra entidade católica), que a ajudaram – conta Fabiana Regina Oliveira da Silva, vizinha dos Sousa.

Com a chegada do registro, Irdeane começou a procurar trabalho e vai tentar ser uma das beneficiárias do Bolsa Família:

– Agora vou caçar trabalho. Quero ter dinheiro para a comida. Eu sei fazer as coisas. Bolo, eu adoro e sei fazer direitinho. Mas não tenho as coisas para fazer, para misturar. Com o documento, eu vou ter tudo.

A campanha nacional para o registro civil e a documentação básica, criada pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos e seguida por 20 instituições, como a Pastoral, Unicef e bancos federais, terminou dia 19, e o balanço será divulgado no início de 2009. A meta é atingir menos de 5% de sub-registro em todo o país até 2011. No Censo de 2010, o IBGE deverá contar também os adultos sem registros.

Entre 2000 e 2007, segundo o IBGE, houve uma redução progressiva dos percentuais de sub-registro de nascimento, com destaque para a Região Norte, que passou de 47,1% para 18,1%. Embora o Norte tenha apresentado a maior redução nos percentuais, a cobertura em conjunto com o Nordeste ainda é bastante deficitária. Em 2007, Norte e Nordeste mantiveram sub-registros de 18,1% e 21,9%, respectivamente.

Já o Sul do país tem a melhor cobertura de registros de nascimento, com percentual de sub-registro de apenas 1,4%, em 2007. No mesmo ano, o Sudeste atingiu a proporção de 5,5% e o Centro-Oeste, 10,6%.

Ainda segundo a análise do IBGE, de 2000 a 2007, as maiores reduções de sub-registro de nascimento, em pontos percentuais, ocorreram no Maranhão, Pará, Amazonas e Tocantins, respectivamente, 38,8%, 37,2%, 33,8% e 29,1%. Contudo, em 2007, esses estados ainda estavam classificados na faixa de sub-registro superior a 10%.

O estudo do IBGE mostra ainda que, em 2007, o Distrito Federal, São Paulo e Rio Grande do Sul foram os únicos estados cujas proporções de registros de nascimentos de mães com menos de 20 anos foram inferiores as proporções das mães entre 30 a 34 anos.

O Paraná e o Rio também se aproximam desse perfil. Em contraposição, o Maranhão e o Pará tiveram as maiores proporções de registros cujas mães tinham entre 15 e 19 anos, em torno de 25%. Por outro lado, as maiores proporções de registros de nascimentos com mães entre de 35 a 39 anos foram verificadas no Rio Grande do Sul (10,9%), São Paulo (9,5%), Distrito Federal (9,4%), Santa Catarina (9,0%) e Rio de Janeiro (8,9%).

Nota do Ecodebate: sobre este tema leiam, ainda, “Erradicação do sub-registro enfrenta dificuldades“.

[EcoDebate, 30/12/2008]

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