Repressão ao crime é uma necessidade psicossocial, artigo de Montserrat Martins
[EcoDebate] Parece óbvia a frase-título, mas no Brasil não é. “Repressão” aqui é palavrão, sinônimo de ditadura – como se fosse possível uma sociedade democrática não ter órgãos de repressão ao crime. A intervenção federal no Rio está em sintonia com o sentimento popular mas os “especialistas” tem teses nas quais rejeitam a medida.
Minha experiência profissional me diz o oposto de tais especialistas. Sou psiquiatra há 35 anos e nos últimos 20 atendi centenas de jovens infratores, aprendi algumas coisas com eles que é hora de compartilhar. Para começar, ao contrário dos que muitas pessoas acreditam, a fome não é a motivação mais comum para o crime, mas a necessidade de ‘status’, de se sentir importante, de ter autoestima.
Aprendi ouvindo os infratores que eles desejavam, na maioria das vezes, realizar sonhos de consumo dirigindo automóveis e se sentir “importantes” para as garotas, passando de carro na frente delas para impressionar. Muitas vezes fazem isso ‘chapados’ porque a droga, além de um prazer físico em si, viciante, também lhes tira a autocrítica e dá coragem para roubar.
São motivos “capitalistas” e não “socialistas” que os levam a roubar, são bem mais raros os casos de “Robin Hood” e alguns ‘patrões’ do tráfico às vezes posam de benfeitores da comunidade apenas como artifício de ‘marketing’, para ganharem proteção ou cumplicidade das comunidades locais.
A grande maioria dos jovens, quando privados de liberdade, se arrependem pelos sofrimentos que causam a suas famílias – muitos sem pais, só com mães, ou então só com avós. Sim, são histórias de dramas sociais e há muitos fatores psicológicos envolvidos, a falta da figura paterna – um dos problemas não enfrentados da nossa sociedade – tem suas consequências também.
Ao ouvir livremente esses jovens – a maioria dos quais já em torno dos 18 anos – o que ouço quase sempre é que “entrei no mundo do crime pra conseguir as coisas mais rápido, mais fácil”, sabendo que a vida de trabalhador de salário mínimo não lhes daria perspectivas imediatas.
Sim, há fatores sociais evidentes, mas que não mudam facilmente nem rapidamente, em nenhum país do mundo. O combate à fome é uma necessidade social, tirar as pessoas da linha de pobreza, mas isso não gera resultados imediatos de redução da criminalidade – nem dispensa a necessidade de repressão ao crime.
O comportamento social tem sua lógica e não existem soluções mágicas, tais como a ilusão de que a liberação das drogas faria os traficantes se legalizarem, ou perderem seu poder. A repressão apenas, obviamente, não resolve o problema, mas nem por isso deixa de fazer parte da equação dos fatores necessários contra o crime.
Montserrat Martins, Colunista do Portal EcoDebate, é médico psiquiatra, bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais e ex-presidente do IGS – Instituto Gaúcho da Sustentabilidade
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 23/02/2018
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Muito obrigada pelo seu artigo. Como policial, principalmente, é algo que faz bem ouvir de vez em quando, ao invés da ojeriza normal que o emprego inspira nas pessoas.
O cerne da questão não é a ausência de repressão policial. Mas considerar como um (des)governo que corta investimentos na segurança pública na ordem de 5,9 bi para 2,9 bi tem autoridade moral para intervir na segurança pública de um Estado. Claramente uma intervenção espetáculo. E tem policiais que não enxergam que não se é contra a ação policial contra facções criminosas. Pelo contrário, mas o que se vê é absurdamente inconsequente e perverso com essa intervenção.