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33 teses para reformar a Economia ensinada

 

33 teses para reformar a Economia ensinada

Tradução Vila Vudu
O debate pode ser visto em “
The Economics Reformation Debate (ing.)”.
(Seguem-se as
assinaturas de apoio a uma Reforma da Economia Ensinada, lista atualizada)

“Nova Reforma”:
33 teses para reformar a Economia ensinada 
12/12/2017,
Andrew Simms, New Weather Institute (em outros idiomas em Tlaxcala)


Dia 12 de dezembro passado, coincidindo com os 500 anos das Teses de Lutero, um grupo de economistas e estudantes ‘cravaram’ na porta da London School of Economics uma lista de recomendações para uma reforma da Economia ensinada.

Estas 33 Teses, elaboradas por estudantes, economistas e acadêmicos reunidos por Rethinking Economics e New Weather Institute, respaldadas por importantes economistas e dirigentes políticos, como a deputada britânica Caroline Lucas, resumem uma detalhada crítica da corrente dominante no ensino e na prática da Economia.

Economistas de renome como Mariana MazzucatoKate RaworthSteve Keen, além de Sally Svenlen, aluna do Rethinking Economics, tomaram parte num ato presidido por Larry Elliott, editor da seção de Economia do jornal The Guardian, no qual se debateram as 33 teses e a demanda por reformas.

O ato aconteceu na 3ª-feira 12 de dezembro, no University College de Londres. Ao final, os participantes, público e estudantes encaminharam-se à entrada principal da London School of Economics, em cuja porta fixaram suas Teses e exigiram a Reforma.

Os estudantes de Rethinking Economics vêm protestando já há cinco anos. Desde ações de levantar-se e sair das salas de aula como forma de protesto, até a publicação de um manifesto para que o programa acadêmico seja reformado, buscando apoios para elaborarem seu próprio livro-texto, até a publicação de The Econocracy, livro sobre a história e os argumentos do movimento (Rethinking Economics).


33 TESES PARA REFORMAR
A ECONOMIA ENSINADA

O MUNDO ENFRENTA MISÉRIA, DESIGUALDADE,
CRISE ECOLÓGICA E INSTABILIDADE NAS FINANÇAS …


Preocupa-nos que a Economia faça hoje muito menos do que poderia para abrir caminho para intuições que ajudem a resolver esses problemas. Acontece assim por três razões:

Primero, porque se desenvolveu, no seio da Ciência Econômica, um insano monopólio de ideias. A perspectiva neoclássica domina escandalosamente o ensino, a pesquisa, o assessoramento para políticos e o debate social. E marginalizaram-se e excluíram-se muitas outras vias que podem levar a intuições valiosas. Esse processo nada tem a ver com uma teoria ser ou não ser melhor que outra. Só tem a ver com a noção de que o debate é o único meio para fazer avançar a ciência. No seio da Economia ensinada esse debate morreu.

Segundo, por mais que a Economia neoclássica tenha feito contribuição historicamente relevante, ainda útil hoje, há enormes possibilidades para melhorar, para debater e para aprender outras disciplinas e perspectivas.

Terceiro, a corrente dominante da Economia parece ter-se tornado impotente para se autocorrigir. Com isso passou a desenvolver-se mais como fé, que como ciência. Com excessiva frequência nos casos em que teoria e evidência empírica se contradizem, tudo se faz para salvar as teorias, mesmo que ao preço de ignorar a evidência empírica.

Propomos essas Teses como desafio ao ensandecido monopólio intelectual pela corrente que hoje domina a Economia.

Exemplos do dano que esse monopólio provoca são as falhas persistentes no corpo da teoria principal; e a persistente ignorância (i) das muitas intuições que as perspectivas alternativas podem oferecer; e (ii) dos variados modos pelos quais um enfoque mais pluralista pode tornar a Economia mais eficaz e mais democrática.

Afirmamos aqui que uma melhor Economia é possível. E convidamos todos ao debate.


FINALIDADE DA ECONOMIA


1. É direito da sociedade decidir qual a finalidade da Economia. Nenhuma meta econômica pode ser isolada das metas políticas. Indicadores de êxitos são decisões políticas bem-sucedidas.

2. A distribuição da riqueza e da renda são decisões fundamentais para a realidade econômica. Nada explica que não o sejam também a teoria econômica.

3. A Economia não é estranha aos valores sociais. Os economistas têm o dever de expor com transparência os juízos de valor que façam. Essa exigência aplica-se especialmente aos juízos de valor que olhos pouco experientes e sem treinamento específico não saibam ver.

4. A política não ‘aplaina’ ou ‘nivela’ o campo de jogo. Ao contrário disso, o inclina numa determinada direção. Faz falta à sociedade uma discussão clara sobre o tipo de Economia as maiorias desejam e como alcançá-la.


O MUNDO NATURAL


5.
A Economia é um subconjunto da natureza e das sociedades em cujo seio a Economia brota. A Economia não é e não existe como entidade independente. As instituições sociais e os sistemas ecológicos são portanto centrais, não externos, ao funcionamento da Economia.

6. A Economia não sobrevive nem prospera sem insumos do mundo natural. Nem sem os muitos sistemas de apoio à vida que a natureza oferece. Ela depende de um fluxo contínuo de energia e de matéria, e atua no seio de uma biosfera de delicado equilíbrio. Teoria econômica que trate o mundo natural como se fosse externo ao modelo não tem meios para bem compreender o modo pelo qual a degradação do mundo natural pode afetar o próprio modo de a teoria interpretar a realidade.

7. A Economia deve reconhecer que a energia e os recursos não renováveis não são disponíveis para sempre, em quantidades infinitas; e que o uso dessas reservas, para extrair delas a energia que contêm, altera os equilíbrios de energia agregada do planeta – o que acarreta consequências que chegam até a transtornos do clima.

8. Não se pode ignorar que Economia e Ecologia mantêm relação de retroalimentação. Ignorar essa relação levou, hoje, a uma Economia global que opera já fora dos limites de viabilidade da Ecologia global e que, para funcionar, requer sempre mais e mais crescimento. Diferente disso, a Economia deve considerar as limitações objetivas da ecologia do planeta.


INSTITUIÇÕES E MERCADOS


9.
Todos os mercados foram criados e estão configurados pelas leis, costumes e culturas, sempre influenciados pelo que fazem e pelo que não fazem os governos.

10.  Os mercados são o resultado das interações entre diferentes tipos de organismos públicos e privados (e também pelo setor do serviço voluntário e pela sociedade civil). É necessário e urgente estudar mais o modo como esses organismos realmente se organizam, como funcionam e como poderiam ser as inter-relações entre todos eles.

11. Os mercados são também mais complexos e menos previsíveis do que se pode supor a partir das simples relações de oferta e demanda. Falta à Economia compreensão mais profunda de como os mercados se comportam – muito poderia aprender do estudo de sistemas complexos, como se vê acontecer na Física, na Biologia e na Informática.

12. As instituições dão forma aos mercados e influem no comportamento dos agentes econômicos. Portanto, a Economia deve considerar as instituições como parte central do próprio modelo.

13. Dado que diferentes economias têm diferentes instituições, uma política que gere bom resultado numa Economia pode gerar resultados péssimos, em outra. Por essa razão, dentre muitas outras, é improvável que um único conjunto de medidas de política econômica pressupostas de aplicação universal, baseado exclusivamente na teoria econômica abstrata, tenha qualquer serventia.

 

TRABALHO E CAPITAL


14.
 Pode-se demonstrar que salários, benefícios e lucros sobre ativos dependem de amplo leque de fatores, dentre os quais o poder relativo de trabalhadores, empresas e proprietários de ativos, e não simplesmente do seu aporte relativo para a produção. Faz falta à Economia uma melhor compreensão, mais ampla, desses fatores, para que informe melhor sobre as escolhas que afetam a porção da renda capturada pelos diferentes grupos da sociedade.


NATUREZA da TOMADA DE DECISÕES


15.
  Erro, viés, reconhecimento de padrões, aprendizagem, interação social e contexto são todos influências importantes sobre o comportamento, que não aparecem reconhecidas na teoria econômica. A corrente principal da Economia carece, portanto, de melhor compreender, de compreensão mais ampla do comportamento humano. Muito tem a aprender da Sociologia, Psicologia, Filosofia e outras linhas de pensamento.

16. Seres humanos são imperfeitos, e também é imperfeita a tomada de decisões econômicas ‘perfeitamente racionais’. Toda decisão econômica que aposte sobre o futuro implica algum grau não quantificável de incerteza e requer, portanto, avaliação e juízo. A corrente dominante da teoria e da prática econômicas têm de reconhecer o peso da incerteza.


DESIGUALDADE


17.
 Numa Economia de mercado, quem que conta com capacidades, preferência e dotes similares não tende a alcançar igual nível de riqueza, sujeita apenas a uma variação aleatória. Os efeitos de pequenas diferenças de sorte ou nas circunstâncias podem levar a resultados enormemente diferentes, para pessoas semelhantes.

18. Seguidamente os mercados mostram tendência a desigualdade crescente. As sociedades desiguais dão-se ainda mais mal numa série de indicadores de bem-estar social. A corrente principal da teoria econômica poderia fazer mais para compreender melhor por que e de que modo isso é assim e o que é preciso fazer para evitar esse resultado.

19. Já se demonstrou que é falsa a ideia segundo a qual à medida que um país enriquece a desigualdade necessariamente aumenta, antes de começar a cair. São possíveis todas e quaisquer combinações de desigualdade e PIB crescente.


CRESCIMENTO DO PIB, INOVAÇÃO E DÍVIDA


20.
 Crescer é uma opção política, assim como econômica. Se escolhemos buscar o ‘crescimento’, passa a ser indispensável responder de modo implícito ou explícito as seguintes perguntas: “crescimento de que, por que, para quem, por quanto tempo e até que ponto definido como suficiente?”.

21. A inovação não é exterior à Economia, mas parte inerente da atividade econômica. Podemos começar a compreender melhor o crescimento do PIB, se tomarmos a inovação como algo que acontece em ecossistemas que evoluem em desequilíbrio, configurado pelo desenho dos mercados e pelas interações entre todos os agentes em seu seio.

22. A inovação por sua vez tem um ritmo e um rumo. O debate sobre o ‘rumo’ da inovação exige que se compreenda a ‘finalidade’ das políticas traçadas.

23. A dívida privada também influi profundamente no ritmo em que a Economia cresce – mas permanece excluída da teoria econômica. A criação de dívida soma-se à demanda financiada pelo crédito, e afeta tanto os mercados de bens como os mercados de ativos. É impossível separar Economia e finanças.


DINHEIRO, BANCOS E CRISE


24.
 A maior parte da nova moeda que circula na Economia é criada pelos bancos comerciais, cada vez que concedem um novo empréstimo.

25. A forma pela qual se cria o dinheiro afeta a distribuição da riqueza no seio da sociedade. Por conseguinte, o modo como o dinheiro é criado tem de ser entendido como questão política, não simplesmente técnica.

26. Posto que criam dinheiro e dívida, os bancos são agentes importantes na Economia. É importante incluir os bancos nos modelos macroeconômicos. Modelos econômicos que não incluem os bancos nunca poderão antever crises bancárias.

27. A Economia precisa compreender com mais clareza como se criam internamente a instabilidade e as crises nos mercados, em vez de continuar a tratar as crises como se fossem ‘choques’ que atingem os mercados de fora para dentro.

28. A financeirização tem duas dimensões: as finanças especulativas de curto-prazo; e a Economia real financeirizada. Esses dois problemas têm de ser estudados em conjunto.


ENSINAR ECONOMIA


29.
 Uma boa formação em Economia tem de oferecer aos estudantes vários enfoques teóricos. Deve incluir não só história e filosofia do pensamento econômico, mas também um leque amplo de perspectivas atuais, com as institucionalistas, as austríacas, as marxistas, as pós-keynesianas, as que pregam a igualdade dos gêneros, as ecologistas e as da complexidade.

30. A própria Economia não deve ser um monopólio. Os cursos interdisciplinares são chaves para que se compreendam as realidades econômicas das crises financeiras, a pobreza e a mudança do clima. A política, a Sociologia, a Psicologia e as Ciências do Meio Ambiente devem ser integradas, portanto, no programa acadêmico, sem que recebam tratamento inferior ao dado à teoria econômica dominante.

31. Não se deve ensinar Economia como estudo neutro, que não atribuiria valores a modelos e indivíduos. Os economistas têm de ser versados em ética e política, e devem ser capazes de se envolver de modo significativo com a opinião pública.

32. Concentrar-se obcecadamente na estadística e nos modelos quantitativos pode acabar por cegar os economistas outros modos de pensar. É preciso apoiar os estudantes para que explorem outros enfoques metodológicos, dentre os quais a pesquisa qualitativa, a entrevista, o trabalho de campo e argumentação no campo das teorias.

33. Sobretudo, a Economia terá de fazer mais para fortalecer o pensamento crítico, em vez de simplesmente recompensar a capacidade para memorizar teorias e para aplicar modelos. É preciso animar os estudantes para que comparem, contrastem e recombinem teorias, e para que as apliquem criticamente a estudos em profundidade do mundo real.

 

Colaboração de Amyra El Khalili, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 19/01/2018

 

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