Estimativa da população do Paquistão e cenários de projeção: 1950-2100, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
[EcoDebate] O Paquistão fazia parte da Índia até 1947. Ambos foram completamente dominados pela Inglaterra entre 1858 e 1947. A ideia da criação de um Estado que unificasse politicamente todos os muçulmanos da região foi lançada por Mohammad Iqbal, presidente da Liga Muçulmana, que a partir de 1934 passou a ser dirigida por Mohammed Ali Jinnah (1876-1948), considerado o criador do país. O Paquistão comemora a data de sua independência no dia 14 de agosto, um dia antes da Índia.
O nome Paquistão surgiu em 1933 e a independência ocorreu com a descolonização da Índia. O Paquistão foi criado com base nas províncias de maioria muçulmana. O Paquistão Ocidental e a Bengala Oriental, que fez a sua independência do Paquistão em 1971, passando a se chamar Bangladesh.
O Paquistão tinha uma população de 37,5 milhões de habitantes em 1950 e passou para 197 milhões de pessoas em 2017, segundo dados da Divisão de População da ONU. O Paquistão é o sexto país mais populoso do mundo e deve passar para o quinto lugar ainda na atual década, ultrapassando o Brasil. Na projeção média da ONU, a população do Paquistão vai atingir 352 bilhões de habitantes em 2100.
Mas como o futuro é incerto, ONU trabalha com outras duas projeções. Na projeção alta o Paquistão atingiria 528 milhões de habitantes em 2100 e na projeção baixa atingiria 223 bilhões de habitantes no final do século XXI.
As diferentes projeções se devem fundamentalmente às diferentes hipóteses sobre o comportamento das taxas de fecundidade. O gráfico abaixo mostra que a taxa de fecundidade total (TFT) no Paquistão era muito alta (quase 7 filhos por mulher) e só ficou abaixo de 5 filhos nos anos 2000, quando a transição para baixos níveis começou a ocorrer. No quinquênio 2015-20 a TFT paquistanesa está em 3,4 filhos por mulher. Na projeção média, a TFT do Paquistão só deve ficar abaixo do nível de reposição a partir de 2060, devendo ficar em torno de 1,85 filho por mulher nas últimas décadas do atual século. Se a TFT ficar meio filho (0,5) acima da média a população irá para 558 milhões de habitantes em 2100 e se ficar meio filho abaixo da média, a população será de 223 milhões de habitantes em 2100. Ou seja, pequenas variações na taxa de fecundidade podem significar uma diferença de mais de 300 milhões de habitantes até o final do século (muito mais do que um Brasil).
Os gráficos abaixo mostram a distribuição por sexo e idade da população paquistanesa para alguns anos selecionados. Nota-se as pirâmides de 1950 e 2017 tinham uma estrutura jovem, com cada novo grupo etário com volume maior do que o precedente. Isto ocorre devido às altas taxas de fecundidade do século passado. Somente na pirâmide de 2050 haverá o início da redução do grupo mais jovem.
Na pirâmide de 2100 (de acordo com a projeção média) a distribuição etária vai mudar, refletindo o contínuo processo de envelhecimento populacional. Ou seja, a transição demográfica do Paquistão vai se desenvolver no século XXI e o país terá uma quantidade de jovens muito grande nas próximas décadas.
Para aproveitar esta janela de oportunidade e garantir a melhoria da qualidade de vida da população, o país deveria investir pesadamente em educação, saúde e, principalmente, na geração de emprego para se atingir a plena ocupação e o trabalho decente. Porém, o desempenho econômico e social do Paquistão é sofrível e o país ainda enfrenta muitas disputas com a Índia. Os altos gastos militares reduzem o orçamento para os investimentos sociais. As disputas religiosas e de facções políticas também atrasam os avanços no bem-estar.
No mês de agosto de 2017 foram divulgados os dados do censo demográfico do Paquistão. A população total do Paquistão atingiu 207,7 milhões de habitantes (maior do que a previsão da ONU). Em 1998, a população total do Paquistão era de 130 milhões. Nos últimos 19 anos, a taxa média anual de crescimento da população foi de 2,4%. Sucessivos Governos repetiram que a taxa de crescimento da população caiu para 1,8% aa, e isso foi visto como um grande sucesso. Mas os resultados do censo mostraram que o ritmo de crescimento demográfico continua elevado.
Segundo o jornal The Print, “Estudos demonstraram que há uma alta demanda por serviços de planejamento familiar, mas muitas vezes eles não alcançam as pessoas. Os clérigos também estão divididos sobre a questão do planejamento familiar e alguns argumentam que é contra os ensinamentos do Islã. Isso é problemático porque os países de maioria muçulmana, como o Irã e Bangladesh, promoveram campanhas de planejamento familiar, muitas vezes com a ajuda de clérigos. Mas os objetivos do Paquistão para reduzir a taxa de natalidade não foram alcançados apesar dos compromissos políticos”.
Para agravar a situação, o Paquistão que é um dos países mais pobres da Ásia tem sérios problemas na área ambiental. O país já sofre com a desertificação e a crise hídrica, enquanto o déficit ambiental cresce de forma alarmante. Dados da Footprint Network, mostram que a biocapacidade total do Paquistão era de 21,4 milhões de hectares globais (gha) em 1961 e a pegada ecológica total era de 23,5 milhões de gha na mesma data. O déficit ambiental era bastante pequeno. Mas em 2013 a biocapacidade total passou para 63,2 milhões de gha e a pegada ecológica para 132 milhões de gha. Portanto, o Paquistão, mesmo sendo um país pobre e de baixo nível de consumo, tem um déficit ambiental de mais de 100%.
Além da falta de recursos e da desigualdade social, um fator que pode comprometer o futuro da população são as consequências do aquecimento global. O Paquistão depende das águas provenientes das geleiras do Himalaia, que são responsáveis por 75% a 80% dos recursos hídricos do país. O derretimento das geleiras é a fonte principal da rede de irrigação no Paquistão, que alimenta 90% das terras agrícolas. Uma alteração no fluxo da água terá graves consequências para a produção agrícola paquistanesa. Além disto, a China tem construído represas e diminuído a disponibilidade de água para o Paquistão e a Índia.
O desenvolvimento sustentável do Paquistão não será alcançado facilmente, pois haverá dificuldade para alimentar e melhorar o padrão de vida da população que tinha um Índice de Desenvolvimento Humano de 0,55 em 2015 (147º lugar no ranking), menor do que o IDH da Índia, de 0,624 (131º lugar no ranking).
Tudo isto dificulta a saída da armadilha da pobreza. Os conflitos internos e a violência são outros elementos que dificultam a melhoria das condições de vida da população. Somente com o esforço interno e a cooperação internacional as condições atuais do país poderão ser revertidas.
Referência:
ALVES, JED. Estimativa da população da Índia e cenários de projeção: 1950-2100, Ecodebate, 11/08/2017
https://www.ecodebate.com.br/2017/08/11/estimativa-da-populacao-da-india-e-cenarios-de-projecao-1950-2100-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
Raza A. Rumi. Pakistan’s new census: What has changed in 20 years, The Print, 28/08/2017
https://theprint.in/2017/08/28/pakistans-new-census-changed-20-years/
Pakistan birth rate a ‘disaster in the making’ as population surges, AzVision, 11/092017
http://en.azvision.az/news/71662/pakistan-birth-rate-a-disaster-in-the-making-as-population-surges.html
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 16/11/2017
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