Jericoacoara e os cavalos-marinhos, artigo de Roberto Naime
[EcoDebate] Jericoacoara é uma das principais praias do país, considerada pelo New York Times como uma das mais belas do mundo. Região litorânea cercada de dunas, e adjacente a manguezais, a praia se notabiliza pela presença de um arco o representando antigo morro testemunho, preservado da geologia pretérita existente no local, e posteriormente totalmente erodida por ação marítima e de ventos.
A região é protegida pela presença de um Parque Nacional, uma unidade de conservação federal, gerida pelo Instituto Chico Mendes de Biodiversidade, no território do estado do Ceará. No lado oeste do parque nacional que abrange a área de Jericoacoara, se registra a existência, nas áreas de manguezais, de um berçário de cavalos-marinhos. Esta é uma das espécies mais conspícuas existentes no mar, ocorrendo em todo manguezal patrocinado pela foz, aparentemente anastomosada, do Rio Guriú.
O parque de Jericoacoara objetiva promover o turismo ecológico e a educação ambiental, em um cenário de proteção da área, com monitoramento e fiscalização ambiental efetivos. Os cavalos-marinhos, no entanto, a despeito das belezas naturais registradas nas praias constituem no notável riqueza da área. Um dos principais sítios de ocorrência dos cavalos-marinhos é a comunidade de Mangue Seco. Este local tem o início de seu local de ocorrência, identificado pela presença de uma barraca e uma canoa, ambos abandonados a beira-mar, que estão sendo cobertos pelas areias das dunas próximas. Deste local até o braço de mar onde se encontra grande quantidade de cavalos-marinhos ainda existe uma boa distância.
Faz bom tempo que a população nativa da área explora passeios de canoas com turistas para observar cavalos-marinhos em seu habitat. Só muito recentemente começaram os trabalhos de conscientização das comunidades locais, para evidenciar a importância desta riqueza natural e da necessidade fundamental de conservar e preservar os cavalos-marinhos. Para isto, as atividades devem ser padronizadas e normatizadas.
Os cavalos-marinhos estão na lista de espécies vulneráveis de espécies ameaçadas de extinção da União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN). Se recomenda nunca pegar estes animais com as mãos e somente com vidro transparente e não contaminar as águas próximas com o uso de protetores solares.
Cabe registrar que ainda não existe controle da pesca do cavalo-marinho no Brasil, onde também não existem leis específicas de proteção. Assim, muitas peculiaridades que envolvem a vivência desta espécie se tornam mais vulnerabilizadas e ameaçadas. O cavalo-marinho possui uma espécie de “bolsa” no indivíduo masculino, que permite a proteção de filhotes. Os rituais de reprodução da espécie são muito diferenciados e merecem atuação específica. A fêmea deposita seus óvulos no macho, após singular “performance”, e após período de gestação na bolsa, são produzidos em média 500 a 1000 ou 1500 indivíduos. No entanto, a taxa de sobrevivência é bastante reduzida, situando-se em torno de 2 a 3%. O maior estímulo a este fato é que os filhotes de cavalos-marinhos são presas fáceis para outros animais carnívoros, que habitam os manguezais e integram as pirâmides alimentares deste ambiente.
Os cavalos-marinhos apresentam locomoção preferencial no sentido vertical e a variação de cor lembra episódios miméticos, com alterações de cor que propiciem camuflagens de acordo com o ambiente. Estudos e observações já registraram que em situação de liberdade, os casais de cavalos-marinhos permanecem juntos todo ciclo de vida, e só eventualmente realizam trocas de parceiros. Isto legitima os cuidados com a manutenção dos sítios de vida para estes animais.
cavalos-marinhos incluem camarões, crustáceos, alevinos e larvas de peixes, desde que estejam vivos, em seu cardápio. Mas não é somente a degradação do ambiente que ameaça os cavalos-marinhos. Hábitos culturais de usar o animal como adorno ou amuleto, ou comercialização “in natura” para aquários, ou usos medicinais, comprometem a sobrevivência e a manutenção da espécie.
Em meio a este contexto, o Laboratório de Aquicultura Marinha (LABAQUAC), organização descrita como de direito privado e sem fins lucrativos, dedicada a conservação e educação ambiental, originada no estado do Rio Grande do Sul, segundo informação de seu site, e estabelecida em Porto de Galinhas desde o ano de 2001, estabeleceu um programa de cooperação com a administração do parque de Jericoacoara, focado no estudo e conservação dos cavalos-marinhos.
A instituição é especializada em estudos genéticos de populações, que muito auxilia no entendimento e nas ações de conservação e também no domínio de técnicas de cultivo em cativeiro, morfologia e histologia das espécies, taxonomia e dinâmica populacional dos cavalos-marinhos em ambientes naturais.
No mundo, existem mais de 50 espécies de cavalos-marinhos, em regiões tropicais e temperadas, mas no Brasil, a instituição reconhece a presença de 3 espécies. Os cavalos-marinhos são peixes com ossos, que pertencem ao gênero conhecido como “hippocampus”.
Apresentam um período de incubação dos ovos em torno de 12, atingindo no máximo 22 dias e se reproduzem o ano inteiro. Site do LABAQUAC informa que as três espécies que são registradas e presentes no litoral brasileiro, apresentam comportamento e preferências alimentares muito semelhantes, sendo estas, à base de pequenos crustáceos. E que os cavalos-marinhos, exibem ainda baixa mobilidade e fecundidade, quando comparados às outras espécies de teleósteos. E que ainda assim, essas características são suficientes para a manutenção dos estoques naturais, não fosse a pressão imposta através da pesca incidental ou direcionada e a degradação ambiental causada pela perda de habitats naturais.
Todos conhecem e registram em suas memórias, a praia de Jericoacoara pelas suas originais belezas naturais. No entanto, a presença de um sítio natural, de importância fundamental para a preservação do mitológico e exuberante cavalo-marinho, apresenta uma magnificência inesperada para a maioria das pessoas e demonstra como a biodiversidade natural do país é impressionante.
Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.
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in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 31/08/2017
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