Ressaca danifica trecho da Enseada de Botafogo, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
[EcoDebate] O fim de semana passado foi de ressaca no Rio de Janeiro, com ondas de até 4 metros. A Marinha do Brasil avisou que o fenômeno afetaria a cidade entre os dias 12 e 14 de agosto de 2017. A Prefeitura do Rio recomendou aos cariocas, fluminenses e visitantes ficarem distantes dos mirantes da orla ou de locais próximos ao mar durante o período de turbulência marinha.
O balanço da segunda-feira mostrou que a entrada da Baía da Guanabara foi bastante atingida. As ondas fortes arrastaram pedras para a praia do Flamengo, além de uma grande quantidade de lixo. Equipes da Comlurb (Companhia Municipal de Limpeza Urbana) foram mobilizadas para limpar o local.
Um local que corre sério risco de erosão devido à força das ressacas é o dique de contenção que protege as pistas do Aterro do Flamengo, na Enseada de Botafogo, na altura do monumento Estácio de Sá (fundador da cidade do Rio de Janeiro).
A pista de caminhada e ciclismo que contorna a praia de Botafogo, especialmente em frente ao Morro da Viúva, está a dois metros do nível do mar e acima também das pistas do Aterro do Flamengo, que fazem a ligação do Centro para Copacabana, Lagoa e outros bairros da Zona Sul. As pistas funcionam como um dique que contém as águas e protege o bairro do avanço do mar.
Se a força da ressaca destruir os diques de proteção, o efeito sobre a mobilidade urbana pode ser desastroso. Existem muitas pedras protegendo a pista e os arrimos construídos para garantir a manutenção da pista. Porém, é difícil conter a fúria do mar, se não for feita uma manutenção adequada.
Como mostram as fotos acima, a ressaca do último fim de semana provocou rachaduras no dique de proteção e ameaçam a pista de caminhada e ciclismo. Se nada for feito para reparar os danos, uma próxima ressaca pode provocar uma erosão ainda maior e inundar toda a pista de trânsito do Aterro do Flamengo. Como morador do bairro, já comuniquei verbalmente o ocorrido ao administrador do Parque e escrevi um e-mail para a Secretaria de Obras da Prefeitura.
O Rio de Janeiro é uma cidade que vai enfrentar problemas de erosão cada vez mais sérios, devido ao aquecimento global e ao consequente aumento do nível do mar. Nos próximos anos e nas próximas décadas os desastres ambientais vão se agravar e no futuro a cidade pode ficar inviável, se as metas do Acordo de Paris não forem alcançadas e aprofundadas.
O problema não é de apenas uma cidade. As praias do Rio de Janeiro e da maioria dos aglomerados urbanos do planeta correm o risco de serem “varridas do mapa”. Este processo pode ser socialmente grave na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, que é a maior e mais complexa aglomeração urbana da zona costeira brasileira, com mais de 12 milhões de habitantes.
Os professores Orrin Pilkey, da Universidade de Duke, nos EUA, e Andrew Cooper, da Universidade de Ulster, no Reino Unido, lançaram o livro “The Last Beach”, em que mostram que as intervenções humanas nas áreas costeiras, junto com a elevação do nível do mar e as tempestades e furacões, por conta das mudanças climáticas, estão provocando vasta erosão de areia em direção ao fundo dos oceanos, promovendo a “varredura” do solo costeiro. Para eles, a sentença de morte já foi proclamada para grandes extensões de praias densamente povoadas.
As estradas, as barreiras e os muros de concreto erguidos pela civilização para proteção contra as tempestades e elevação das águas são incapazes de deter as ondas e servem apenas para acelerar o processo de erosão dos terrenos litorâneos. As barreiras colocadas pelo ser humano fornecem o cenário para as destruições daquilo que foi construído em áreas de baixa altitude. Provavelmente, a subida dos oceanos será impiedosa com as construções antrópicas.
Se o nível dos oceanos subir 2 metros o impacto será devastador para a região metropolitana do Rio de Janeiro. Enquanto isto não acontece, a prefeitura precisa fazer a manutenção das barreiras que protegem o fluxo de pessoas e do trânsito. O estrago que aconteceu no último fim de semana no Aterro do Flamengo foi relativamente pequeno. Mas, se a erosão não for reparada rapidamente, uma nova ressaca pode provocar um rombo muito maior, com grandes prejuízos para as pessoas e a própria prefeitura que, em crise financeira, terá que desembolsar recursos mais vultosos.
Referências:
Orrin H. Pilkey Jr J. Andrew G. Cooper. The Last Beach. Duke University, 2014
https://www.amazon.com/Last-Beach-Orrin-Pilkey-Jr/dp/0822358093
ALVES, JED. Rio de Janeiro: cidade submersa, Ecodebate, RJ,27/05/2016
https://www.ecodebate.com.br/2016/05/27/rio-de-janeiro-cidade-submersa-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
ALVES, JED. O fim da Barra da Tijuca? Ecodebate, RJ, 05/10/2016
https://www.ecodebate.com.br/2016/10/05/o-fim-da-barra-da-tijuca-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
ALVES, JED. Rio debaixo d’água e o fim da praia de Copacabana, Ecodebate, RJ, 14/12/2016
https://www.ecodebate.com.br/2016/12/14/rio-debaixo-dagua-e-o-fim-da-praia-de-copacabana-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
ALVES, JED. A translação do oceano no Leblon e a erosão do litoral brasileiro, Ecodebate, RJ, 03/11/2016
https://www.ecodebate.com.br/2016/11/03/a-translacao-do-oceano-no-leblon-e-a-erosao-do-litoral-brasileiro-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 17/08/2017
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