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Artigo

Superar a dependência do petróleo e construir uma matriz energética 100% renovável, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

 

“The future will be renewable-based or there won´t be a future”
(Adolfo Rebollo, CEO of Ingeteam)

 

uma matriz energética 100% renovável nos EUA até 2037

 

[EcoDebate] Os Estados Unidos se envolveram em uma série de guerras visando garantir o egoístico acesso aos recursos petrolíferos globais. As guerras do Afeganistão e do Iraque são exemplos recentes de intervenções militares desastrosas para todos os países envolvidos e para o mundo. Calcula-se que os EUA gastaram cerca de US$ 6 trilhões de dólares nestes dois conflitos militares (fora as perdas de vida humana, não humana e os desastres ambientais).

No governo Barack Obama, os EUA gastaram anualmente cerca de US$ 550 bilhões em despesas de guerra e no aparato bélico. Agora em 2017, o governo Donald Trump pretende aumentar estes gastos em 10%, elevando-os para a casa dos US$ 600 bilhões anuais. O discurso oficial argumenta que são despesas para garantir a segurança interna e a liberdade no mundo. Mas muitos críticos mostram que o exagerado arsenal militar dos EUA tem a função de garantir o acesso do país aos combustíveis fósseis depositados nos territórios estrangeiros.

Porém, existe um outro caminho para os EUA e o mundo. Ambientalmente, a “Era do Petróleo” está com os dias contados (seja pelo Pico de Hubert ou pelo Orçamento Carbono). Assim como a Idade da Pedra não acabou por falta de pedras, a “Idade do Petróleo” vai acabar não por falta de petróleo, mas por avanços tecnológicos que vão permitir a construção de uma nova matriz energética, não-fóssil, de baixo carbono, renovável e mais limpa do ponto de vista ambiental.

Artigo de Tom Solomon (26/10/2016) mostra a viabilidade da transição da matriz energética dos EUA nas próximas duas décadas. Para ele, existe uma maneira viável de superar os combustíveis fósseis e sair da crise climática a tempo de evitar os piores efeitos do aquecimento global. O plano se baseia no trabalho realizado pela equipe de Mark Jacobson, da Universidade de Stanford (www.thesolutionsproject.org), que descreve um futuro com 100% de energia renovável até 2050.

Considerando as metas do Acordo de Paris (de dezembro de 2015) – para manter o aquecimento global abaixo de 1,5º C. – será preciso substituir todos os combustíveis fósseis por energias renováveis e ??limpas, com 50% até 2030 e com 100% até 2050. No caso dos EUA, para transformar a matriz energética seria preciso atingir: 3.966 GW de energia fotovoltaica (PV-solar); 2.421 GW de eólica; e 61 GW de novas capacidades de hidroelétrica + geo + onda + maré. Para atingir 100% destes 6.448GW em 2050 e 50% até 2030 deveria haver um esforço redobrado.

Em 2015, os EUA instalaram 7,3 GW de PV solar e 8,6 GW de eólica. Se estes acréscimos de capacidade forem mantidos seria preciso 405 anos para atingir 100% dos 6.448 GW. Portanto, é preciso investimentos maciços na área, com pelo menos 488 gigafactories até 2029.

A tabela abaixo mostra a estimativa do custo financeiro para a mudança da matriz energética dos EUA. Os investimentos anuais seriam de US$ 283 bilhões. Nota-se que este valor é menos da metade do orçamento anual de defesa, proposto por Donald Trump, de cerca de US$ 600 bilhões.

 

preço para mudar a matriz energética do EUA para 100% renovável até 2037

 

O custo total para a efetivação de uma matriz 100% renovável até 2037 seria de US$ 6,3 trilhões. Isto é semelhante ao custo total gasto nas guerras do Iraque e do Afeganistão. Por outro lado, haveria uma economia no gasto com combustíveis fósseis, além de mitigar o efeito estufa.

O prefeito de Chicago, Rahm Emanuel, anunciou em abril de 2017 que a cidade se comprometeu a garantir que todos os edifícios governamentais serão alimentados por 100% de energia renovável até 2025, o que tornaria a cidade de Chicago a maior cidade do país a manter todas as suas instalações públicas abastecidas por energia não fóssil.

O que o artigo de Tom Solomon (26/10/2016) mostra é que as barreiras para uma matriz 100% renovável são políticas, não técnicas. A resistência vem dos setores econômicos que perderão negócios (petróleo, gás, carvão e indústria automobilística com combustão interna), além do complexo industrial-militar.

Este mesmo raciocínio vale para o mundo. O relatório de 2016 do Instituto Internacional para a Investigação da Paz de Estocolmo (SIPRI, sigla em inglês) mostra que os gastos militares no mundo chegaram à impressionante cifra de cerca de US$ 1.700.000.000.000,00 (um trilhão e setecentos bilhões de dólares), representando 2,5% do PIB mundial.

 

gastos militares no mundo: 1988-2015

 

Assim, fica claro que é preciso inverter a lógica militarista da estratégia de fortalecer o poder de guerra para garantir acesso aos combustíveis fósseis. Ao invés dos gastos de morte, é preciso investir na paz e no aproveitamento das enormes reservas de sol e vento que estão à disposição de todos os países. O sol nasceu para todos, cabe saber transformá-lo em energia e em fonte de progresso pacífico para a sociedade e o meio ambiente. A metade dos recursos gastos com despesas militares seria suficiente para mudar a matriz energética mundial e para ter uma chance de salvar o mundo do desastre do aquecimento global.

Neste sentido, os senadores Jeff Merkley (D-OR), Bernie Sanders (I-VT), Edward J. Markey (D-MA) e Cory Booker (D-NJ) fizeram uma proposição legislativa visando 100% de energia limpa e renovável até 2050. O chamado “100 by Act 50” estabelece um roteiro para uma transição para 100% de energia limpa e renovável até 2050. É o primeiro projeto de lei introduzido no Congresso americano que vai prever completamente uma transição de combustíveis fósseis para os Estados Unidos, inclusive visando a segurança energética para eliminar a dependência dos combustíveis fósseis do Oriente Médio.

Segundo a organização Sierra Club, já existem 25 cidades nos EUA que se comprometeram a implementar 100% de energia renovável até 2035. No início de maio, a cidade de Atlanta, na Georgia, aderiu à campanha “Ready For 100%” e se tornou a maior cidade do Sul dos EUA a se comprometer com o fim do uso de combustíveis fósseis.

Portanto, a batalha pela justiça social e pela preservação da natureza passa necessariamente pela luta contra a corrida armamentista, pela redução dos gastos militares, pelo desarmamento, pela harmonia entre os povos, pelo redirecionamento da energia de guerra para a energia de paz e pela democratização da produção e da oferta de energia renovável.

Referências:

ALVES, JED. A economia verde e os gastos militares. Ecodebate, Rio de Janeiro, 14/04/2011
http://www.ecodebate.com.br/2011/04/14/a-economia-verde-e-os-gastos-militares-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/

SIPRI Yearbook 2016. World military expenditure between 1988 and 2015. Stockholm International Peace Research Institute 2016
https://www.sipri.org/research/armament-and-disarmament/arms-transfers-and-military-spending/military-expenditure

Tom Solomon. Here’s how to build 100% clean renewable energy in the US before 2040, Energy Post, 26/10/2016
http://energypost.eu/heres-build-100-clean-renewable-energy-us-2040/

KTVZ. Merkley, Sanders goal: U.S. on all renewables by 2050, From greener grid to auctioning ‘Climate Bonds’, 27/04/2016
http://www.ktvz.com/news/merkley-sanders-goal-us-on-all-renewables-by-2050/466592141

Jodie Van Horn. Cities and Towns Continue to Lead the Way with New “Mayors For 100% Clean Energy” Push, Sierra Club, April 26, 2017
http://www.sierraclub.org/compass/2017/04/cities-and-towns-continue-lead-way-new-mayors-for-100-clean-energy-push

 

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 17/05/2017

[cite]

 

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4 thoughts on “Superar a dependência do petróleo e construir uma matriz energética 100% renovável, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

  • Muito bom o artigo indicando um caminho factível para fazer a mudança ambiental e diminuir a dependência do petróleo. Mas para reflexão ambiental e ver como o mudo atual anda, pontuo que Obama “liberou” o shale gas e oil internamente e tornou o EUA de importador a exportador de petróleo e que o Trump está a liberar o uso de carvão e liberar áreas antes proibidas para exploração e quer ainda construir novos oleodutos e quer abandonar o Acordo de Paris.

  • Vicente Lassandro Neto

    Prezados Leitores:
    A humanidade precisa entender que a vida, do ponto de vista humano, vai acabar assim que terminar o CO2 da atmosfera. Isto posto, para postergar este fim, temos que enviar GIGANTESCAS quantidades de CO2 para a atmosfera, o que só pode ser feito com a queima de derivados de petróleo e carvão “in natura”. País algum queima energia para fazer fogueiras ou soltar balões.
    Quando um país consome energia, ele o faz num parque industrial, residencial e num sistema de transportes, de modo que quanto mais energia ele consome, mais trabalho ele gera e mais conforto ele proporciona à população.
    Por outro lado, as energias renováveis são sazonais e temporárias e quando não usadas precisam ser estocadas, gerando mais custos. Energia solar, só pelo dia, eólica depende do vento e se não ventar não tem energia, além do que elas são de baixa intensidade, quando comparadas à energia fóssil e não irão, JAMAIS, conseguir superar um consumo da ordem de 91 milhões de barris de derivados petróleo por dia e 74 milhões de barris equivalentes de carvão por dia.
    Por outro lado, o petróleo é uma fonte inesgotável de energia e nada melhor do que consumir algo que não acaba, não é sazonal, É PRAGA e as empresas que se dedicam à pesquisa e extração do mesmo usam 4 defensivos contra esta PRAGA
    1 – Apoio sísmico
    2 – Técnica de construção de poços, no Brasil, inadequada à gênese das bacias sedimentares
    3 – Valorização em demasia dos chamados perfis elétricos feitos nos poços de petróleo
    4 – Técnica de extração de petróleo, no Brasil, inadequada à gênese das bacias sedimentares
    Vicente Lassandro Neto
    GEÓLOGO-ECOLOGISTA e Engro. em Petróleo.

  • Vicente Lassandro Neto

    Prezados

    Gostaria de saber se é possível ver todos os comentários feitos no Ecodebate, por todas as pessoas. Se possível gostaria de saber o PASSO a PASSO sobre o assunto.

    Sds
    Vicente

  • Prezado Vicente,

    Os comentários são postados nas matérias e artigos, onde podem ser visualizados, mas não todos em todos em tudo que foi publicado.

    Atenciosamente

    Henrique Cortez
    editor

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