Rompimento da barragem de rejeitos da Samarco em Mariana: além de tudo, um clássico exemplo de irresponsabilidade na gestão de riscos, por Álvaro Rodrigues dos Santos
Não resta dúvida da determinante participação de inaceitáveis descuidos com fatores de ordem hidráulica e geotécnica entre as causas essenciais do rompimento de duas barragens de rejeito da SAMARCO (Vale + BHP Billiton) no município de Mariana – MG, e que vai tragicamente se consagrando como uma dos mais graves e letais desastres em obras da engenharia brasileira.
No entanto, há um fator importantíssimo que não vem sendo considerado, que se refere à inadmissível ausência no âmbito da empresa de procedimentos inerentes a um Plano de Gestão de Riscos. Ao menos, algo consistente e funcional.
Uma barragem, por maiores e mais confiáveis que sejam os cuidados com sua segurança, será sempre uma bomba armada. Pelo que, a áreas do vale a jusante das barragens que teoricamente pudessem ser atingidas pelas águas e detritos liberados por uma eventual ruptura devem ser sempre consideradas, na classificação internacional de riscos, como de Muito Alto Risco (risco 4, o mais elevado). Esse nível de preocupação com as áreas a jusante de barragens foi especialmente aguçado após a catástrofe de Banquiau. Em agosto de 1975, na província de Henan, na China, ocorreu um dos mais graves e espetaculares acidentes em obras e engenharia da história humana. O rompimento das barragens de regularização de cheias de Banquiao, no rio Ru, e Shimatan, no rio Hong, provocou a morte de mais de 230.000 pessoas, 145.000 diretamente e 85.000 em conseqüência de uma série de desgraças que se seguiram (fome, falta de atendimentos de emergência, doenças…).
Isso posto, salta aos olhos o absurdo da inexistência de um Plano de Gestão de Riscos que levasse em consideração as atividades humanas e os fatores ambientais no vale atingido, com especial atenção para a ocupação urbana representada pelo o distrito de Bento Rodrigues.
Houvesse atenção para esses cuidados e de há muito a empresa SAMARCO deveria ter providenciado a desocupação das áreas potencialmente mais vulneráveis, com o deslocamento de seus ocupantes para áreas próximas garantidamente seguras. Essas áreas então desocupadas, e que coincidem hoje com a mancha de lama que pode ser vista em imagens aéreas pós-rompimento, seriam então utilizadas para funções de baixa presença humana, como bosques florestados e parques. Ou seja, inaceitável que nessas áreas de extremo risco tenha-se convivido todo esse tempo com a instalação urbana de residências, escolas, comércio, etc.
Da mesma forma chama a atenção a ausência de um Plano de Contingência que envolvesse, devidamente para tanto treinada, a população do referido distrito. Um Plano de Contingência pelo qual cada cidadão saberia de antemão o que fazer de imediato e urgente na eventualidade de um sinal combinado que indicasse qualquer evidência de acidente com a barragem.
De imediato, talvez essa a maior lição que situações similares que se espalham por todo o território brasileiro possam tirar do doloroso desastre de Mariana: com a maior urgência possível estruturar Planos de Gestão de Riscos que, por determinações de caráter preventivo de relativamente fácil implementação, possam ao menos evitar que vidas humanas sejam tão gratuita e estupidamente ceifadas.
Geól. Álvaro Rodrigues dos Santos (santosalvaro@uol.com.br)
Ex-Diretor de Planejamento e Gestão do IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas
Autor dos livros “Geologia de Engenharia: Conceitos, Método e Prática”, “A Grande Barreira da Serra do Mar”, “Diálogos Geológicos”, “Cubatão”, “Enchentes e Deslizamentos: Causas e Soluções”, “Manual Básico para elaboração e uso da Carta Geotécnica”.
Consultor em Geologia de Engenharia e Geotecnia
Articulista e Colaborador do Portal EcoDebate
* Artigo enviado pelo Autor e originalmente publicado no Portal UOL, Opinião
in EcoDebate, 16/11/2015
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Se existem realidades que a estrutura estatal não consegue enfrentar são a gestão de risco e a governança. Em qualquer setor. Os colaboradores tentam, mas as estruturas não favorecem…
Abs…
RNaime
Falta de plano emergencial e o silêncio e inatividade no nível que o problema pede por parte dos governos, e principalmente, da SAMARGO, que AMARGOU com LAMA de FEL A VIDA de pessoas e fauna/flora!
O governo já se manifestou e já achou um punhado de culpados. Estabeleceu multas milionárias e impôs sanções aos culpados. Esperaremos que as novas leis sejam mais coercitivas, punitivas e que inviabilizem o setor.
Onde estavam os órgãos governamentais (FEAM e todos os órgãos ambientais de Minas Gerais). Onde estava o IBAMA e outros órgãos federais – DNPM..?
Precisava que muitas vidas se perdessem, que muitos sonhos se desfizessem que muitos danos ambientais ocorressem para que se cumprissem as leis já existentes?
Ou estas empresas existem somente para bancar as contas de políticos e campanhas eleitorais? Por que nada se fez de prevenção antes que a tragédia acontecesse? Esta é a grande pergunta.
Os mortos não falam, mas certamente não estariam calados se tais planos de contingência, de emergência existissem.
A omissão dos órgãos estaduais é muito maior do que todos imaginam O Governo e seus representantes buscam culpados e sobrevoam a área todos os dias para aparecer na mídia.
A Dona Dilma apareceu uma semana depois e não falou coisa com coisa. Apenas falou em multar os culpados e lamentou os fatos. Temos uma Presidenta à altura das nossas necessidades….. .
O Governador do Estado dá um sobrevoos e dá uma satisfação ao eleitorado. Onde estavam os órgãos ambientais do Estado, responsáveis pela fiscalização, que sabe multar e punir pequenos produtores…
Estamos a pouco quilômetros do local do acidente e sabemos que ali falta tudo, muito mais do que se fala…