Desinformação sobre Alimentos Transgênicos, artigo de Silvio Valle
Em pauta no Congresso Nacional, o PLC 4148/2008, de autoria do deputado federal Luis Carlos Heinze (PP-RS), caso aprovado, acabará com a obrigatoriedade de rotulagem específica para os alimentos transgênicos. O assunto volta a ser discutido num momento em que uma série de outros projetos de matiz conservadora emergem, já que bancadas ligadas ao agronegócio, planos de saúde, entre outras, ganham força no Congresso Nacional. No Brasil, é permitido o cultivo de soja, milho e algodão transgênicos (recentemente, também recebeu parecer favorável da CTNBio um eucalipto transgênico que coloca em risco o mercado de mel orgânico). Diversas instituições, entre elas a Fundação Oswaldo Cruz, assinaram manifesto contra o PLC que pretende acabar com a rotulagem dos transgênicos. Atualmente, qualquer assunto que entre em pauta no Congresso representará um retrocesso, pois as bancadas partidárias foram substituídas por bancadas dos diversos interesses econômicos e sociais. Apesar de pequenas questões de redação, o Decreto 4.680/2003, sobre a rotulagem dos alimentos transgênicos, certamente foi uma vitória do consumidor e da Saúde Pública. É lamentável que os órgãos de Vigilância Sanitária, da Agricultura e da Saúde não implementaram devidamente o decreto em vigor, por falta de vontade política. Temos condições científicas e técnicas para executar a maioria dos diagnósticos relacionados aos alimentos transgênicos, em especial na Embrapa, Fiocruz e algumas empresas privadas. O referido PLC já foi questionado pela Abrasco , umas das mais importantes associações científicas ligadas à Saúde Pública.
Devido à falta de vigilância pós-comercialização, pouco se sabe sobre os efeitos adversos do consumo de alimentos transgênicos para a saúde humana e o meio ambiente. Na literatura científica, estão descritos distúrbios hormonais, alergênicos e relacionados a ganhos/perdas de peso em vários estudos pré-clínicos (testes em animais). Ressaltamos que os alimentos transgênicos não são submetidos a normas reguladoras para estudos clínicos. Os efeitos adversos poderão ser identificados se for estabelecido um eficaz sistema de vigilância pós-comercialização pelos órgãos de Vigilância Sanitária em Saúde, algo que o Decreto 4680/2003, já em vigor, permite e que até o presente não foi feito pela ANVISA, a qual deveria regulamentá-lo. Mesmo a norma sobre recall de alimentos, recém-aprovada, não contempla a questão específica dos alimentos transgênicos.
Precisamos levar em consideração que algumas culturas transgênicas necessitam de uma maior quantidade de agrotóxicos, o que é um efeito adverso secundário grave para a saúde humana e ambiental. Defendemos a rotulagem e a informação como uma importante forma de lidar com esse tema. Basicamente, preconizamos dois tipos de rotulagem: uma com símbolos e frases claras para o público em geral e outro de forma mais especializada para os órgãos de Vigilância Sanitária. A informação sobre qualquer produto é um direito inalienável do consumidor. Além do símbolo que identifica o alimento transgênico, a população deve ser informada sobre quais genes foram inseridos, pois a Engenharia Genética permite inserir genes de espécies não correlatas, o que não ocorre com a Edição Genética. Dessa forma, genes de organismos potencialmente alergênicos/tóxicos podem ser transferidos e essa informação pode ser útil para os consumidores. Devemos considerar também os aspectos culturais (veganos, vegetarianos, orgânicos, Kasher e etc.) quanto ao consumo dos diversos alimentos, independentemente do processo de produção.
O site do Senado Federal está realizando uma enquete online para conhecer a opinião da sociedade sobre o tema. A participação de todos é importante para que os consumidores tenham direito de serem informados sobre o que consomem.
Silvio Valle – pesquisador na Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio da Fundação Oswaldo Cruz
Publicado no Portal EcoDebate, 15/06/2015
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As “pequenas questões de redação” do decreto 4.680 acabam por tornar a rotulagem um cipoal intransponível e é por isso que tantas empresas não usam o rótulo. No duro, ninguém consegue compreender como proceder nos vários casos. Além disso, o símbolo remete o leitor a um perigo hipotético, o que também é falso, uma vez que a autoridade nacional julgou (como TODAS AS DEMAIS agências de avaliação de risco no mundo) que os produtos hoje no mercado são tão seguros quanto seus equivalentes não transgênicos. Por fim, o decreto obriga a informação de coisas como: genes provenientes de Streptomyces viridochromogenes. Francamente, para um consumidor que não faz ideia do que seja transgênico, o que interessa saber que o novo gene vem desta bactéria ou de outro ser vivo qualquer?
O decreto tem que ser mudado, sim, para que atenda a seus objetivos: dizer que o produto contém algum transgênico numa porcentagem acima de um certo valor limite, que é o que fazem todos os países do mundo que adotaram a rotulagem. Manter o decreto como está é um desserviço ao consumidor. Como será sua forma final, isso é lá com os especialistas de mercado, que não tem nada a ver com os especialistas em avaliação de risco: esta etapa já está encerrada, com a liberação do produto e a garantia de sua inocuidade alimentar.