Caminho perigoso, sem descanso, artigo de Montserrat Martins
Foto: Valter Campanato/Agência Brasil
[EcoDebate] Muitas cidades do interior ficaram sem gasolina, faltando produtos no mercado, mesmo assim uma boa parcela da população compreendeu as razões dos caminhoneiros. Por convivência ou identificação, sabem que as casas de muitos destes motoristas profissionais já estão “desabastecidas”, que é o que começaria a ocorrer com a população toda se o movimento durasse mais algumas semanas. A volta só ocorreu depois de algumas vitórias parciais em questões práticas como custos de pedágios, diesel, isenções de multas e ampliação de pontos para parada.
Mas há sérias polêmicas na regulamentação da atividade dos caminhoneiros, que teria atendido entidades patronais e não de trabalhadores. As entidades de empregados, os motoristas profissionais, repudiaram a lei 13.103 de 2015 sancionada pela Presidenta, que modifica a lei 12.619 de 2012, sendo que um dos principais retrocessos é flexibilizar a “lei do descanso”, que obrigava a cumprir períodos de descanso dos motoristas profissionais a cada 4 horas, tal como já acontece na Europa, o que agora ficou estendido para até 5 horas e meia. Como as entidades patronais conseguiram esse retrocesso?
Segundo as entidades de trabalhadores, grandes empresas fizeram “uma campanha de contra-informação”, nos postos, pontos de parada e conseguiram “vender para os motoristas autônomos que eles eram empresários e que com a nova lei (a 12.619, que estabelecia o descanso obrigatório), jamais poderiam ter lucros com seus transportes”. O Presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Terrestres (CNTTT) postulava que com a lei do descanso “na verdade quem teria seus lucros diminuídos seriam os grandes embarcadores e os contratantes de fretes, nada mais justo do que eles terem que reajustar os fretes para os motoristas autônomos e transportadoras, para que se adequassem à nova lei (12.619)”, escreveu Omar José Gomes em artigo apoiado pelas Centrais Sindicais UGT, Força Sindical, NCST e CTB (ou seja, todas menos a CUT).
Autônomos ou empregados, são duas realidades dentro de uma mesma categoria, de motorista profissional. Um milhão dos 2,2 milhões de caminhões no Brasil são dirigidos por autônomos (com média de 17 anos de uso dos caminhões, contra 8 anos das frotas), com dificuldades em ter força política, ao contrário de donos de frotas negociaram com o governo, sendo que apenas 5% seriam empresas grandes, pois há ao todo 172 mil pequenas empresas no ramo, associações entre os caminheiros autônomos. Fica a dúvida até que ponto vivemos uma “greve de caminhoneiros” ou uma “greve locaute”, ou seja, um movimento com manipulação de grandes empresas, diminuindo os direitos dos próprios trabalhadores ao descanso – que interessa não só a eles mas a toda sociedade, pela segurança no trânsito.
Montserrat Martins, Colunista do Portal EcoDebate, é médico psiquiatra, bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais e presidente do IGS – Instituto Gaúcho da Sustentabilidade.
Publicado no Portal EcoDebate, 12/03/2015
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O ponto mais grave dessa história me parece ser a carta-frete, que é uma forma disfarçada de escravidão. Ela chegou a ser proibida na lei? Houve tantos vais e vens nessa história que fiquei na dúvida.