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Estudo da Escola Politécnica da USP diz que o uso da bacia hidrográfica como unidade de gestão dos recursos hídricos é a melhor opção


Rio Madeira

A bacia hidrográfica passou a ser adotada como unidade de gestão das águas brasileiras em 1997. Embora a adoção do conceito apresente limitações e inconvenientes que geram divergências, ela representa um avanço para as políticas de aproveitamento de recursos hídricos no país. A conclusão é de uma pesquisa realizada na Escola Politécnica (EP) da Universidade de São Paulo (USP) e publicada na revista Estudos Avançados.

De acordo com um dos autores do artigo, Rubem La Laina Porto, professor do Departamento de Engenharia Hidráulica e Sanitária da EP, uma das principais dificuldades é que os limites administrativos entre municípios, estados e países não coincidem obrigatoriamente com os limites das bacias hidrográficas. Isso pode, segundo ele, criar dificuldades técnicas e legais ao planejamento e à gestão do aproveitamento dos recursos hídricos de uma bacia.

A Lei 9.433, de 1997, segundo Porto, iniciou a implantação da gestão integrada das águas no Brasil, com a descentralização para o nível local. Mas ainda há uma grande dificuldade de efetiva descentralização. A outra autora do artigo é Monica Ferreira Amaral Porto, também professora do Departamento de Engenharia Hidráulica e Sanitária da EP-USP.

“Outro exemplo de dificuldade de adoção do conceito de bacia ocorre no semi-árido brasileiro porque o aproveitamento dos seus recursos hídricos ocorre de forma muito concentrada em torno dos açudes. É possível, entretanto, que essa tendência se altere em razão da realização recente de obras integradoras, como construção de adutoras e transposições de águas”, disse Porto à Agência FAPESP.

O pesquisador salienta que não se encontrou até hoje um recorte territorial que represente uma alternativa melhor à bacia hidrográfica. “Qualquer outro recorte que se adote deixará de considerar as importantes inter-relações do ciclo hidrológico. Essa constatação reforça a importância de ações de articulação, integração e negociação em todo o processo e planejamento e gestão de recursos hídricos”, disse.

O objetivo do trabalho, segundo Porto, foi apresentar o conceito de bacia hidrográfica, o modo como o país se encontra organizado para essa forma de gestão e também discutir os pontos difíceis da gestão integrada e a necessidade de aperfeiçoamento do sistema de decisão.

De acordo com o pesquisador, o termo “bacia hidrográfica” é um conceito objetivo, baseado em elementos topográficos, que faz parte da política brasileira do setor desde 1997. Mas, embora não haja divergências em torno do conceito, pode haver diferentes pontos de vista em relação ao espaço territorial que se deve adotar como unidade de gerenciamento.

“A adoção da bacia hidrográfica como unidade de gestão é coerente porque ela guarda relação física direta com a água. Tudo o que ocorre em uma bacia hidrográfica, em termos de quantidade e qualidade de suas águas, costuma estar altamente inter-relacionado”, afirma.

Segundo ele, os sistemas de gestão de recursos hídricos brasileiros, o federal e os estaduais, adotam conceitos modernos e democráticos como a descentralização do processo decisório e a ampla participação da sociedade.

“A possibilidade de cobrança pelo uso da água, introduzida pela Lei nº 9433, de 1997, é também um instrumento eficiente para a conservação dos recursos hídricos e para o financiamento parcial das necessidades dos sistemas de gestão”, disse. Os resultados obtidos desde a promulgação da lei, segundo ele, foram significativos, mas os resultados obtidos estão muito aquém das necessidades.

“Para melhorar a eficiência do sistema é mais ou menos consenso entre especialistas que alguns aspectos deveriam ser tratados em profundidade. Um deles é a excessiva burocracia do Estado brasileiro, que resulta em baixa eficácia e altos custos de transação do sistema”, afirmou. Outro ponto é o aperfeiçoamento do sistema de comitês de bacia, além de investimentos em capacitação de recursos humanos e desenvolvimento de instituições técnicas.

No caso do Estado de São Paulo, Porto salienta que é “importante rever o funcionamento do Fundo Estadual de Recursos Hídricos (Fehidro), importante fonte de financiamento do sistema, para colocá-lo efetivamente a serviço da melhoria do processo decisório”.

Para o professor da EP-USP, a descentralização é uma doutrina pregada por muitos, mas praticada por poucos. Segundo ele, existem setores que julgam que perderão poder com a descentralização do processo decisório e tenderão a reagir contra o conceito.

“Outros fatores entram também em jogo. Os processos de decisão descentralizados tendem a ser mais complexos, mais dispersivos, mais demorados, resultando em maiores custos de transação e não garantindo, a priori, que levarão às melhores decisões. Por outro lado, a descentralização pode conferir mais legitimidade às decisões e maior eficácia na obtenção de resultados, desde que todo o processo seja conduzido de forma competente”, disse.

Apesar desses entraves, o pesquisador aponta que os Comitês de Bacias Hidrográficas representam um enorme avanço em termos conceituais, pois constituem o palco no qual atuam, com poder decisório, diversos segmentos da comunidade. Representatividade e descentralização são os princípios em que se baseiam esses comitês.

“Entretanto, somos obrigados a reconhecer que, com raras exceções, o funcionamento do sistema ainda é pífio. As razões, numerosas e complexas, merecem análises mais abrangentes e profundas. O que deve ser considerado central na área de recursos hídricos é somar avanços, a cada dia, mesmo que sejam pequenos. Acho que isso a sociedade brasileira está conseguindo”, disse.

Para ler o artigo Gestão de bacias hidrográficas, disponível na biblioteca on-line SciELO (Bireme/FAPESP), clique aqui

Por Alex Sander Alcântara, Agência FAPESP

[EcoDebate, 23/10/2008]

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