Pesquisadores da UFRJ desenvolvem técnica inédita no mundo para produzir propeno a partir de biodiesel
Glicerina para gasolina e petroquímica verde – Depois dos combustíveis renováveis para veículos, como o álcool e o biodiesel, surge a possibilidade de progredir uma indústria petroquímica a partir da biomassa. Um grupo de pesquisadores do Instituto de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) desenvolveu uma tecnologia inédita no mundo que permite produzir o “propeno verde”, que poderá ser usado como matéria-prima básica da indústria petroquímica. O “propeno verde” é feito a partir da glicerina, que, por sua vez, é um subproduto da produção do biodiesel a partir de oleaginosas, como soja e mamona. O propeno, no Brasil e no mundo, é produzido a partir da nafta, originária do petróleo. Também pode ser gerado a partir do gás natural. Por Ramona Ordoñez, jornal O Globo, 17/02/2008.
Outra linha de pesquisa desenvolvida pelo grupo visa a produzir um derivado da glicerina para ser adicionado à gasolina, como o álcool.
O professor Cláudio José de Araújo Mota, do Instituto de Química da UFRJ, coordena as pesquisas de um grupo de cientistas que concluíram ser possível produzir esse “propeno verde”. Ele explicou ao GLOBO que tudo começou há cerca de três anos, com a preocupação sobre o que fazer com os excedentes de glicerina a serem despejados no mercado com a produção em grande escala do biodiesel, cuja adição ao diesel tradicional, na proporção de 2%, é obrigatória a partir deste ano. Mota explicou que a glicerina é liberada espontaneamente pelas oleaginosas (soja, mamona, girassol, dendê, caroço de algodão ou qualquer outra gordura vegetal ou mesmo animal) no processo de produção do biodiesel.
Produção de biodiesel gerará 80 mil toneladas de glicerina Pelas estimativas de Mota, com a produção de 2,4 bilhões de litros de biodiesel por ano, serão produzidas aproximadamente 80 mil toneladas anuais de glicerina pelas 45 usinas autorizadas pela Agência Nacional do Petróleo (ANP).
— A glicerina é um subproduto das indústrias de sabão e, agora, será gerada a partir da produção do biodiesel.
Isso porque as origens para produzir o sabão ou o biodiesel são as mesmas: as oleaginosas, que são gorduras vegetais, os triglicerídios — explicou o cientista.
O pesquisador explicou que, atualmente, são produzidas no país cerca de 30 mil toneladas anuais de glicerina, pela indústria do sabão. Segundo ele, não há mercado para os elevados excedentes que resultarão da produção do biodiesel. Hoje, a maior parte da produção de glicerina, cerca de 28%, é utilizada em sabões e fármacos. Outros 12% são usados na indústria química (poliglicerina); 8%, em alimentos e bebidas; 5%, em tabacos, entre outros.
— Não existe mercado para tanta glicerina, e sua queima fará um grande mal ao meio ambiente. Então, desenvolvemos duas linhas de pesquisa, uma na área petroquímica e outra na de combustível para ser adicionado à gasolina — explicou Mota.
O pesquisador disse que o desenvolvimento dos estudos nos últimos três anos, com a parceria da Suzano Petroquímica, levaram à produção, a partir da glicerina, de propeno, matéria-prima para a indústria petroquímica. É a partir do propeno que se produzem os polipropilenos, que, por sua vez, são matéria-prima para a indústria do plástico.
— Estamos desenvolvendo uma petroquímica renovável, um propeno verde. Atualmente, o propeno tem origem apenas no petróleo ou no gás natural — destacou Mota.
O processo desenvolvido pelo grupo da UFRJ já foi patenteado.
Para este ano, está prevista a construção da primeira fábrica piloto, nas instalações da Suzano no pólo petroquímico de São Paulo.
Segundo Mota, já foram investidos no desenvolvimento tecnológico cerca de R$ 3 milhões, e a Suzano contará também com recursos da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) para a unidade piloto. O professor explicou que ainda não foi estabelecida qual será a capacidade da fábrica, mas seu objetivo será testar, em escala industrial, a produção de propeno a partir da glicerina gerada pelas oleaginosas.
Mota ressaltou também que acredita em um espaço, tanto no mercado brasileiro como no exterior, para se adicionar o que ele chama de biogasolina à gasolina tradicional: — Em vários países, como nos Estados Unidos, especialmente em Los Angeles, começase a se exigir a adição de compostos oxigenados à gasolina para reduzir as emissões, caso do álcool.
Nessas pesquisas, o grupo de cientistas da UFRJ conta com a parceria da distribuidora de combustíveis Repsol/ YPF. Mota disse que, inicialmente, as pesquisas são no sentido de se adicionarem 1% a 5% desse novo combustível à gasolina.
Segundo o professor, a idéia não é ter um concorrente para o álcool, mas apenas a opção de mais um produto oxigenado — que reduz as emissões de monóxido de carbono — que possa ser adicionado na proporção de 1% a 6% na gasolina.
Europa pode ser mercado para novo combustível verde Este ano, essas pesquisas também ganharão novo impulso com os primeiros testes em motores de veículos, ainda em bancada de laboratório. A parceria com a Repsol começou no ano passado, com investimentos estimados em R$ 600 mil até o momento. Com as metas fixadas pela Comunidade Européia de redução das emissões de gases nos próximos anos, Mota acredita que a Europa poderá ser um importante mercado potencial para a colocação dessa biogasolina.
— As pesquisas mostram que um derivado da glicerina poderá ser usado no setor de combustíveis, tanto na gasolina como no diesel — afirmou Mota.
Ele destacou ser fundamental, com o aumento da produção do biodiesel, encontrar um mercado para a glicerina excedente, a fim de evitar danos ambientais. Segundo Mota, uma usina produtora de biodiesel em Brasília teria jogado glicerina nos rios: — Temos de encontrar uma saída para a glicerina excedente, seja no mercado interno ou no extero .
De acordo com Mota, a produção de propeno a partir da glicerina é uma tecnologia exclusiva do Brasil. Ele disse ter tido notícias de que algumas multinacionais estariam estudando na Europa a construção de uma unidade para, a partir da glicerina, produzir o propilenoglicol.
Este é usado como aditivo para águas de refrigeração, para evitar que um determinado combustível ferva ou congele