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Artigo

Na moda, crônica de Nara França

 

consumindo-se no consumo

 

[EcoDebate] O velho “Aurelião” nos lembra: “Significado de Moda: s.f. Uso passageiro que rege, de acordo com o gosto do momento, a maneira de viver, de vestir etc. / Fantasia, gosto, maneira ou modo segundo o qual cada um faz as coisas. / Cantiga, ária, modinha. / Estatística. Valor do argumento central da classe de freqüência máxima. &151; Suponha-se que um menino conte os ovos de 77 ninhos de pássaros. Ele vê que quatro ninhos possuem um ovo cada um, 65 têm dois ovos cada um; cinco têm três ovos; e três têm quatro ovos. Os ninhos que contêm dois ovos são os que mais se repetem. Portanto, dois é a moda ou valor modal deste grupo de números. A moda é um tipo de média muito utilizada. // Estar na moda, estar em voga, ser geralmente usado. // Passar da moda, deixar de ser imitado, deixar de estar no gosto atual. // Bife à moda, prato feito de maneira especial por alguém, ou por um restaurante. // &151; loc. prep. À moda de, segundo o gosto de”.

Eu digo: Tem gente que gosta de viver na moda. Mas a moda, às vezes, passa rápido demais, sem dar tempo de mudar o modus vivendi. Outras modas sobrepõem ao tempo, e, por isso, volta e meia, ou meia volta, nos deparamos com algum casaco com ombreiras, ou qualquer coisa que nos remeta a antigos filmes (em preto e branco).

Pelo visto, a moda atual é sair por aí ateando fogo em ônibus, ou quebrando portas de vidro, em lojas, agências bancárias, ou veículos de televisão. Causar quebradeira – é o que conta, está na moda. Mas, também, a moda parece ser saquear supermercados, lojas, e até caminhão com mercadorias, envolvido em acidente. O mais irônico, nisso tudo, na minha insignificante opinião, é que ainda querem (os da moda) justificar que tudo isso é para reivindicar “mais saúde, mais educação, mais segurança”. Saúde? Falta sim – principalmente, mental. Educação? Até concordo, assistindo as manifestações, nas ruas. Segurança, deste jeito? É piada, né?…

Por isso, se você, feito eu, se sente fora de moda, depois de assistir um desses noticiários reprisados, o dia todo, em todos os canais de televisão, não se desespere. Ainda há tempo. Fique de olho nas redes sociais – sempre tem planos para mais uma manifestação moderna. Se preferir, você pode se informar com o vizinho, o colega, o primo, o cunhado, o dono do bar – alguém sempre sabe quando e onde haverá mais uma manifestação (desfile) da moda atual. Se você não quiser sair ateando fogo em ônibus, por aí, pode escolher acender rojões, sem alvo previsto, em plena via pública – a luz do dia facilita a moderna atividade.

Mas, se você quer estar na moda, no anonimato, use máscaras, ou até gorros desengonçados, fora de moda, ou coloque uma camiseta na cabeça. Se é para manter o anonimato, esconda a cara, da forma mais ridícula que puder, e saia quebrando tudo. A moda, agora, é não diferenciar privado, público – quebradeira geral.

Já ia esquecendo: há denúncias de que muitas pessoas recebem uma graninha, para desfilarem a dita moda, a exemplo de modelos, que frequentam eventos sociais, vestindo renomadas grifes, e levando cachês, pra isso. Nessa moda mais popular, que tem tomado conta das ruas brasileiras, ainda não lançaram as novas grifes de rojões, coquetel molotov, pedras, paus e ferros (aguardemos).

Como acontece na divulgação de moda, qualquer canalzinho de televisão contribui, ensinando (passo-a-passo) sobre os instrumentos de destruição – uma vara de pescar não quebra uma porta de vidro de uma agência bancária, ou de uma loja, e os rojões não precisam ficar estocados, até a festa junina. Moda é moda – vale tudo, ou vale nada.

Como em toda nova moda, há quem se destaque mais. Nesta modernidade atual, tem muita gente que está indo parar, bem além da televisão – vai pra cadeia mesmo. Lá fora, na arena gigante, entre vaias e aplausos, outros – incansáveis mascarados – persistem na busca da mesma fama. Faltam câmeras, para tantas imagens tão modernas, que, às vezes sempre, nos remetem à moda mais antiga, dos primórdios mesmo, bem antes do nascimento dos tios dos nossos tataravós, do cinema mudo.

E ainda tem gente que reclama que não tem grana, para manter-se na moda. Nessa moda, especificamente, não precisa ter dinheiro, gente. Quem paga os estragos são justamente os que não estão na moda. Tem gente que paga, inclusive, justamente por resistir à moda, não participar. Alguns, mais ousados, pagam (mais caro), por denunciarem a nova moda, que não é genuinamente brasileira – todos sabemos. Semelhante às demais modas, também esta chega de todos os cantos do planeta (que continua redondo). Tem gente que não resiste à nova moda, e acaba perdendo a noção do ridículo – isso já aconteceu, em outras épocas, outras modas – e modos.

Se é holofote que os moderninhos desejam – pronto! -, já tiveram os minutos de fama. Agora, está na hora de mostrarem a cara (com, ou sem, vergonha), e continuarem a vida, longe das passarelas. “O show já terminou” – não há mais público… (Moda sempre me cansa – escolho continuar na contramão.)

Dizem que toda moda tem prazo de validade – às vezes, a dita dura mais tempo. Não esqueçamos a velha e boa calça jeans, que perdura até hoje, nas vitrines e na maioria das pernas brasileiras e estrangeiras. Se essa é uma moda sem tempo de validade, necessário é que se faça alguns ajustes, penso eu – toda moda recebe pequenos retoques. Sugiro que, junto com “mais saúde, mais educação, mais segurança”, sejam acrescidos: mais IMLs, mais necrotérios, mais crematórios, mais cemitérios. E tudo vira moda.

Nara França é jornalista gaúcha, tendo sempre trabalhado em redação de jornal, e hoje atuando em entidades sindicais e movimentos sociais, no sul do Brasil. Também, mantém o blogue http://ironia-cronica.blogspot.com.br/

EcoDebate, 13/03/2014


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