MPF pede que Google retire do YouTube vídeos que promovem a intolerância religiosa
O Ministério Público Federal (MPF) no Rio de Janeiro expediu recomendação para que o Google do Brasil retire do YouTube 15 vídeos com mensagens que promovem a discriminação e a intolerância a religiões de matriz africana. O Google deve enviar, no prazo de dez dias, o relatório com as providências adotadas para o cumprimento da recomendação.
Veja a íntegra da recomendação aqui e da decisão aqui.
A Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC) instaurou um procedimento administrativo para apurar a denúncia da Associação Nacional de Mídia Afro de que conteúdos disponibilizados na rede mundial de computadores, por meio do site YouTube, disseminam o preconceito, a intolerância e a discriminação a religiões de matriz africana.
De acordo com a decisão do MPF que embasou a recomendação, a liberdade de manifestação do pensamento traz em si a responsabilidade por aquilo que se fala e o que se faz, sendo que a liberdade de crença não é um escudo para acobertar violações aos direitos humanos. No campo da comunicação social, cabe ao Estado organizar o espaço onde ocorrem essas manifestações, de modo que sejam ponderados e harmonizados os direitos de quem se manifesta com aqueles direitos de quem eventualmente seja agredido pelo uso abusivo das liberdades públicas.
Para o MPF, as mensagens veiculadas fazem apologia, incitam e disseminam discursos de ódio, preconceito, intolerância e de discriminação em face de outras religiões, notadamente aquelas de matriz africana. Quem produziu e divulgou os conteúdos fez isso de acordo com suas crenças e com base em suas próprias representações da realidade. A partir disso, os conteúdos pretendem estabelecer que há uma indissociável ligação do “mal”, do “demônio” ou de uma indigitada “legião de demônios” com as manifestações religiosas de matriz africana. Nesse sentido, os conteúdos disseminados na rede têm o inegável propósito de ofender, atacar e descriminar essas religiões.
“Para dar vazão a pregações, seus autores e divulgadores descambam para a demonização de símbolos, ritos e liturgias de outras religiões, vinculando-as, distorcidamente, a problemas de saúde, vícios, crimes praticados, atacando frontalmente a consciência religiosa de milhões de pessoas”, disse o procurador regional dos Direitos do Cidadão, Jaime Mitropoulos.
Para dar uma ideia dos conteúdos, o procurador afirma em sua decisão que “há um vídeo em que o pastor diz aos presentes que eles podem fechar os terreiros de macumba do bairro. Em outro, ele afirma que não existe como alguém ser de bruxaria e de magia negra, ou ter sido, e não falar em africano”.
Ainda segundo o procurador, “o exercício das liberdades públicas não é incondicional, pois elas não dão o direito a quem quer que seja de fazer discursos, apologias e incitar o preconceito, a intolerância, a discriminação, o ódio e a violência com base em motivos religiosos.” Ainda de acordo com a decisão, quando se “constata o nítido propósito de “demonizar” as religiões que figuram como alvos desses ataques, evidencia-se a necessidade de coibir a divulgação desses conteúdos, pois é dever do poder público adotar medidas necessárias inclusive para fazer cessar a difusão de proposições, imagens ou abordagens que exponham pessoa ou grupo ao ódio e à discriminação por motivos fundados na religiosidade”.
Audiência pública
Em dezembro de 2013, o MPF realizou a audiência pública “Liberdade religiosa: o papel e os limites do Estado e dos meios de comunicação”. O objetivo do evento foi debater a função do poder público e dos meios de comunicação para garantia da liberdade de consciência e pensamento e da inviolabilidade de crença religiosa.
Fonte: Procuradoria da República no Estado do Rio de Janeiro
EcoDebate, 27/02/2014
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Lamento muito essa decisão. Não que tenha visto os vídeos, muito menos que concorde com eles. Mas, como dizia Voltaire, “Não concordo com nada do que dizes, mas defendo até a morte sua liberdade em dizê-lo”.
Podem palavras incitar o ódio? Claro, podem incitar o ódio, o ridículo, a humilhação, muitas coisas. Mas no final do dia, palavras são apenas palavras. Elas não vão incitar um ódio que já não exista.
O silêncio forçado, porém, é mais do que apenas silêncio. Pois o silêncio é onde as sombras se escondem, é o que oculta o mal quando ninguém ouve falar dele, assim como qualquer defensor da imprensa livre e da liberdade de expressão sabe. Claro que se nunca se forçar o silêncio haverá uma cacofonia de expressões dissonantes, e se ouvirá muito do que não se queria ouvir, como os vídeos em questão.
Mas quando se começa a proibir a palavra de alguém, onde estará o limite? Um religioso cristão poderia ficar ofendido com as piadas do grande humorista George Carlin, com facilidade, até. Seria plausível impedir as pessoas de ouvir George Carlin por causa disso?