Sensação de impunidade mantém trabalho escravo, diz presidente da CPI que investiga o tráfico de pessoas
O presidente da comissão parlamentar de inquérito (CPI) que investiga o tráfico de pessoas, deputado Arnaldo Jordy (PPS-PA), considera que a crença de que não serão punidos faz com que empresários mantenham trabalhadores em situações semelhantes à de escravos.
Jordy comentou os dados divulgados na semana passada pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), que mostram que, pela primeira vez, no Brasil, o número de trabalhadores nas cidades libertados de condições análogas à de escravos superou o de resgatados no campo. Em 2013, foram 2.208 trabalhadores libertados no Brasil, sendo 56% deles nas áreas urbanas.
O parlamentar ressaltou que o tráfico de pessoas está muito relacionado ao trabalho escravo, inclusive para fins de exploração sexual. Ele citou algumas dessas ocorrências investigadas pela CPI, como o resgate de mulheres na Usina de Belo Monte, no Pará, onde eram exploradas sexualmente, e a situação dos trabalhadores da construtora Camargo Corrêa nas usinas de Santo Antônio e Jirau, em Rondônia.
Mais recentemente, em dezembro do ano passado, os deputados estiveram em Guarulhos, São Paulo, onde ouviram reclamações dos operários das obras de ampliação do Aeroporto Internacional de Cumbica, a cargo da construtora OAS.
Arnaldo Jordy manifestou surpresa com o grande número de parlamentares que tentam limpar a barra das empresas que colocam seus trabalhadores em situação degradante. “Quando começamos a investigar o caso da Camargo Corrêa, lá no caso de Jirau, o caso da OAS, no caso do Aeroporto de Congonhas, não tínhamos ideia do lobby, da pressão que a CPI recebeu de deputados do Congresso Nacional no sentido de jogar esse problema para debaixo de tapete, de minimizar o problema.”
O deputado reclamou que uma das formas de impedir o trabalho da comissão era a falta de quórum. “Diziam: olha aí, é uma empresa importante, nós não podemos…’ É impressionante. Nós chegamos, inclusive, a ter a CPI, durante um mês e meio, inviabilizada por falta de quórum, enquanto não se concluiu essa questão do Aeroporto de Guarulhos, da OAS.”
Conceito de trabalho escravo
Um projeto de lei em análise na Câmara dos Deputados quer modificar o conceito de trabalho escravo (PL 3842/12). Entre outros pontos, o texto retira os termos “jornada exaustiva” e “condições degradantes de trabalho” do Código Penal (Decreto-Lei 3.689/41) e inclui a necessidade de ameaça, coação e violência para ser caracterizado o trabalho escravo.
O coordenador da Campanha da Comissão Pastoral da Terra de Combate ao Trabalho Escravo, frei Xavier Plassat, afirma que esse projeto foi apresentado para tirar a eficácia da proposta em análise no Senado que muda a Constituição e permite o confisco das propriedades rurais e dos prédios onde a fiscalização encontrar a exploração do trabalho escravo. “Os ruralistas inventaram uma nova barganha para evitar que ela possa surtir os efeitos esperados. O que eles dizem? ‘Podemos até votar, somos contra o trabalho escravo. Mas somos contra sobretudo a definição atual do trabalho escravo no Brasil.’ E vem todo um discurso completamente hipócrita para dizer que a definição ideal que o Brasil tem desde 2003, que é parabenizada pela OIT, pela ONU, pela comunidade internacional, que é uma definição é vaga, é subjetiva e não reflete as condições de hoje.”
O frei Xavier Plassat lembrou que, desde 1995, mais de 45 mil pessoas foram libertadas do trabalho escravo no Brasil. Segundo ele, esse número não tem como base invenções subjetivas dos fiscais do trabalho, mas as condições degradantes de trabalho, onde pessoas eram tratadas como coisas.
A PEC que permite o confisco das propriedades onde houver trabalho escravo, de autoria do Senado, já foi aprovada na Câmara e voltou para análise dos Senadores, pois foi modificada pelos deputados (na Câmara – PEC 438/01 e, no Senado – PEC 57/99).
Íntegra da proposta:
Edição – Regina Céli Assumpção
Matéria da Agência Câmara de Notícias, publicada pelo EcoDebate, 24/02/2014
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