Pará oficializa lista vermelha e cria programa Extinção Zero
Medida é vista por cientistas e ambientalistas como ato históricoe exemplo pioneiro de proteção às espécies ameaçadas – Uma medida cujas conseqüências ainda são de difícil percepção pela sociedade, mas que coloca o Pará, segundo maior estado da Amazônia Brasileira, numa posição de vanguarda no mundo no campo das ações de preservação de espécies ameaçadas pelo desmatamento. Matéria de Lázaro Magalhães, da Agência Museu Goeldi, publicada pelo EcoDebate, 23/02/2008.
Esse foi o tom dos participantes da mesa de cerimônia que marcou na última quarta-feira, 20, no Auditório do Museu Paraense Emílio Goeldi, em Belém (PA), a assinatura pelo Governo do Pará do decreto que estabeleceu a abertura do programa “Extinção Zero”.
O programa reconhece a existência de 181 espécies ameaçadas de extinção no Pará e cria um comitê gestor que efetivará um plano de preservação de espécies mais ameaçadas, com a colaboração entre instituições científicas, ONGs e poder público.
A cerimônia de lançamento do Programa e de oficialização da Lista Vermelha do Pará contou com a presença de representantes de setores produtivos, estudantes da rede pública estadual paraense, do Clube do Pesquisador Mirim (Museu Goeldi), de pesquisadores e técnicos da área ambiental e científica.
A mesa da cerimônia foi composta pela Governadora do Estado, Ana Júlia Carepa; Ima Vieira, diretora do Museu Goeldi; Valmir Ortega, Secretário Executivo de Meio Ambiente do Pará (Sema); Egon Krakhecke, titular da Secretaria de Extrativismo e Desenvolvimento Rural Sustentável do Ministério do Meio Ambiente; José Maria Cardoso, Vice-Presidente de Ciências para a América do Sul da ONG Conservação Internacional; Aníbal Picanço, Superintendente do Ibama no Pará; e Maria Vitória Torres, responsável pela vara ambiental do Estado e que representou Albanira Bemerguy, presidente do Tribunal de Justiça do Estado (TJE).
O programa Extinção Zero resulta de uma ação articulada pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente, Museu Goeldi (MPEG) e Conservação Internacional (CI).
O decreto assinado nesta quarta pela governadora Ana Júlia Carepa institui o programa e oficializa a chamada Lista Vermelha de espécies em perigo, reconhecendo a existência de 181 espécies ameaçadas de extinção no Pará. Após sua assinatura, serão elaborados imediatamente planos de gestão para as 13 espécies criticamente ameaçadas. O mesmo ocorrerá depois com as demais.
“Este ato representa muito frente ao desafio de criar estratégias para a conservação da biodiversidade no Pará. Precisávamos de foco nas espécies mais pressionadas atualmente. O Extinção Zero deve envolver setores produtivos, ONGs, instituições e políticas para proteger espécies e ecossistemas”, resumiu Valmir Ortega, titular da Sema, se referindo à importância das parcerias feitas com a Conservação Internacional e o Museu Goeldi. “Esse esforço depende muito das informações da comunidade científica”.
“O Pará cumpre uma função histórica. A extinção de espécies é um dos maiores problemas globais e sinaliza a saúde dos ambientes. Este é o programa mais ambicioso e estruturado de preservação de biodiversidade no mundo. A meta é muito clara e nenhum governo ao redor do globo assinou um compromisso de extinção zero”, avaliou José Maria Cardoso, da Conservação Internacional.
“Além de envolver vários setores, o programa é fundamentado em parcerias e ciência. O grande diferencial dessa lista é justamente a espacialização dessa informação a partir dos mapeamentos feitos pelo Museu Goeldi, o que contribuirá decisivamente com o zoneamento ecológico e econômico e para planejamento de desenvolvimento sustentado do Pará”.
Lista
A coordenação do programa Extinção Zero terá um comitê gestor e técnico para elaborar o plano de preservação das espécies ameaçadas da Lista Vermelha, bem como cuidar de sua constante atualização e do reconhecimento de áreas críticas prioritárias para a preservação da biodiversidade e esforços de recuperação.
A lista de espécies ameaçadas resulta do Projeto Biota Pará, que iniciou trabalhos com esse objetivo ainda em 2004. Pesquisadores do Museu Goeldi elaboraram uma lista prévia com 928 espécies candidatas a integrar a lista final de ameaçadas.
O Pará é hoje campeão em desmatamento entre os estados da Amazônia Brasileira. Soma 202,9 mil quilômetros quadrados de áreas desflorestadas – 16% de seu território e 30% de toda a área já degradada na Amazônia. Com o decreto assinado hoje, passa a ser o primeiro da Amazônia brasileira a compilar sua lista de espécies ameaçadas de extinção, chamada de Lista Vermelha. Das 181 espécies da lista, 91 são vertebrados, 37 invertebrados e 53 plantas.
“Esses dados reunidos são constrangedores, mas ao mesmo tempo são de grande importância para nosso desafio. Até 2005, estima-se que o desmatamento na Amazônia afete mais de 1,7 bilhão de árvores e entre 43 e 50 milhões de aves. Isso nos dá a dimensão da perda de recursos provocada pelo desmatamento. Teremos agora ações de monitoramento baseadas em ciência. Há muito a fazer”, justificou Ima Célia Vieira ao citar que o Museu Goeldi já inicia em breve projeto específico com a Conservação Internacional para futuros mapeamentos.
“Os dados disponíveis ainda são poucos. Esperamos que em outras oportunidades possamos anunciar a redução expressiva dessa lista vermelha”.
Madeireiras
“Um programa de extinção zero é um desafio para ser enfrentado por vários atores sociais nacionais” avaliou por sua vez o secretário do Ministério do Meio Ambiente Egon Krakhecke, lembrando que os produtores rurais têm um papel destacado nesse processo, bem como vários outros setores produtivos e instâncias do poder público.
Para a governadora Ana Júlia Carepa, essa busca de modelos de desenvolvimento e preservação na Amazônia também torna-se peculiar no Pará, já que seu território “vivem mais de sete milhões de pessoas distribuídas em todo o estado”.
Ana Júlia aproveitou o lançamento do programa para comentar os recentes protestos e conflitos registrados em Tailândia (PA) contra as ações de fiscalização a madeireiras que atuam ilegalmente. “Já esperávamos atos como esses. Eles acontecem porque é verdade que estamos combatendo o desmatamento. Aquilo foi fruto da ação de pessoas inescrupulosas, que mobilizaram inocentes com ameaças de demissão”.
A governadora confirmou que a madeira apreendida nas fiscalizações será submetida a um leilão e os recursos levantados irão para um fundo destinado aos programas de preservação no Pará. “Os madeireiros estão tentando intimidar o Estado. Doa a quem doer, e leve o tempo que for necessário, vamos tirar de lá toda a madeira apreendida. Vamos continuar. Nem que eu e o secretário de meio ambiente tenhamos que passar a usar coletes a prova de balas”.
Ao final da assinatura, acompanhados pela diretora do MPEG, Ima Vieira, a governadora Ana Júlia Carepa, o secretário Walmir Ortega, e o biólogo José Maria Cardoso, plantaram no Parque Zoobotânico do Museu Goeldi, o mais antigo do gênero no Brasil e especializado em fauna e flora da Amazônia, três mudas de espécies regionais ameaçadas de extinção – pau-rosa (Aniba rosaedora Ducke), ipê-roxo (Tabebuia impetiginosa) e o mogno (Swietenia macrophylla King). Ao final do evento, os participantes foram convidados para percorrer a trilha das espécies ameaçadas no Parque do Museu Goeldi.