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Artigo

Mais hidrelétricas e termelétricas até 2021 – O futuro que ‘eles’ querem, por Telma Monteiro

 

[Correio da Cidadania]

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Em mais uma edição, Plano Decenal de Expansão de Energia (PDEE) (1) é uma peça de ficção do planejamento energético brasileiro projetado para os próximos 10 anos, elaborado pelo Ministério de Minas e Energia (MME) e a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), com a colaboração de empresas e agentes do setor energético. No final do texto, podem-se encontrar os agradecimentos aos membros da “Nomenklatura” do setor que manda no Brasil. Cerca de 150 empresas nacionais, transnacionais, entre elas Vale, Petrobras, Odebrecht, Brasken, Eletrobras, Eletronorte, Furnas e associações do setor como ABRACE, APINE, BRACELPA e instituições governamentais, participaram do planejamento energético do país.

Procurei na lista os nomes das organizações da sociedade civil, pesquisadores e ambientalistas, especialistas da academia e representantes daqueles que sofrem na carne os impactos das políticas do MME calcadas em premissas mirabolantes de crescimento econômico desacompanhado de sustentabilidade. Procurei, também, alguma menção à Rio+20 ou, como bem disseram alguns, à Rio-40 sobre “O futuro que queremos”, e só encontrei, enveredando pelas 386 páginas do Plano, “O futuro que eles querem”.

A título de esperança, o PDEE traz apenas uma trégua nos planos de novas termonucleares, que foram postergados para um futuro além da abrangência deste Plano e que dependem da escolha de “locais propícios” entre as regiões brasileiras. Isso não quer dizer que o planejamento de mais usinas nucleares esteja descartado, mas apenas que aqui elas não estão sendo cogitadas. Vale uma reflexão e preocupação sobre o que os elaboradores consideram como “locais propícios” no Brasil ou neste nosso planeta. Angra III, no entanto, continua sendo construída.

Quanto às mudanças climáticas, o PDEE informa que o Decreto 7390/2010 (2) decidiu que, no setor de energia, o responsável pela ação de prevenção e controle do desmatamento nos biomas e planos setoriais de mitigação e de adaptação às mudanças climáticas é o PDEE. Essa responsabilidade parece incompatível com o planejamento que tem sido proposto nos planos decenais.

O grande engodo deste PDEE 2021 é a pretensão de inserir entre seus objetivos o atendimento de metas específicas de emissões de gases de efeito estufa, (des)considerando que o Plano prevê um crescimento da geração de energia por hidrelétricas em 40% e por Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) em 56% até 2021. Mais absurdo ainda é a geração de energia por termelétricas, que crescerá 52%, o que é incoerente com a proposta do Decreto 7390.

Premissas ou justificativas?

O PDEE continua pregando otimismo para tentar justificar o aumento da oferta de energia elétrica no próximo decênio. A equação aumento da população ativa versus aumento do consumo em ritmo maior não prevê campanhas de uso consciente de energia. No entanto, a presidente Dilma Rousseff acena com descontos na conta de luz, o que vai contribuir ainda mais com o aumento do consumo.

Com uma previsão de aumento de domicílios particulares de 62 milhões para 77 milhões em 2021, o PDEE 2021 considera que os grandes vilões do consumo são a população que utiliza equipamentos eletrodomésticos e o “sucesso” do Programa Luz para Todos. Apesar disso, programas de substituição dos chuveiros elétricos e incentivo ao uso de energia solar em novos empreendimentos de moradia social não estão previstos no Plano. Vai aumentar o endividamento da população. É crescimento sem desenvolvimento.

O setor industrial, que congrega as indústrias eletrointensivas (alumínio – inclusive alumina e bauxita, siderurgia – aço bruto, ferroligas, pelotização, cobre, celulose e papel, soda-cloro, petroquímica e cimento), é responsável por utilizar 40% do consumo industrial de energia elétrica. O Plano também prevê um aumento considerável de consumo no setor eletrointensivo.

A alternativa fotovoltaica não foi sequer considerada no horizonte do PDEE.

Geração hidrelétrica

O capítulo sobre geração de energia elétrica reafirma o objetivo do governo federal em perseguir a integração energética entre os países latino-americanos, com a maciça atuação de grandes empreiteiras, Eletrobras e subsidiárias na elaboração de estudos de aproveitamentos hidrelétricos em diversos países. Sob a lógica reversa de considerar a hidroeletricidade como “energia renovável e de baixo custo” – custo baixo que não considera a destruição dos ecossistemas, o aumento do desmatamento, a invasão e destruição da vida dos povos indígenas e das populações ribeirinhas, as mudanças climáticas, as emissões de metano, as alterações dos regimes de vazões dos rios, o inchaço das cidades -, o PDEE 2021 planeja uma escalada sem precedentes sobre os “potenciais” do Peru, Bolívia, Guiana, Argentina e Uruguai.

O planejamento do parque gerador hidrelétrico apresenta novos projetos, num total de 19.673 MW, que serão viabilizados entre 2017 e 2021. Estão listadas no PDEE oito grandes usinas na região Norte, nos rios Teles Pires, Araguari, Tapajós, Branco, Tocantins e Juruena, e outras dez nas demais regiões. Sem considerar aquelas já licitadas e em construção, como as duas no rio Madeira, Estreito no rio Tocantins, Belo Monte, no rio Xingu, que têm previsão de início de operação até 2016. As usinas planejadas para o rio Tapajós, São Luiz do Tapajós e Jatobá constam como “estratégicas de interesse público, estruturantes e prioritárias para efeito de licitação e implantação, conforme Resolução CNPE Nº3 de maio de 2011 “.

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O gráfico 21 mostra que o PDEE prevê um aumento da capacidade instalada de hidrelétricas, usinas contratadas e planejadas de 2012 a 2021, e que essa expansão seria especialmente na Amazônia.

O PDEE assume que as hidrelétricas nas bacias hidrográficas da região Norte e Centro-Oeste são um grande potencial a ser explorado para atender à crescente demanda de eletricidade do país, mesmo com todos os problemas socioambientais inerentes.

Não ficam dúvidas sobre a terrível realidade que a expansão dos empreendimentos hidrelétricos pode impor à Amazônia. O PDEE, no entanto, não se satisfez em apresentar esse destino funesto, mas deixa no ar que a concretização do Plano depende da emissão das Licenças Prévias Ambientais. Sem elas, haveria atraso dos projetos hidrelétricos e uma “expansão concentrada em projetos termelétricos” se imporia para atender à demanda.

Notas

1 – http://www.epe.gov.br/PDEE/20120924_1.pdf

2 – http://www.epe.gov.br/PDEE/20120924_1.pdf

 

Leia também:

Mineradoras valem ouro nos projetos hidrelétricos do Tapajós e Teles Pires

Telma Monteiro é ativista sócio-ambiental, pesquisadora, editora do blog http://www.telmadmonteiro.blogspot.com.br, especializado em projetos infra-estruturais na Amazônia. É também pedagoga e publica há anos artigos críticos ao modelo de desenvolvimento adotado pelo Brasil.

 

Artigo enviado pela Autora e originalmente publicado no Correio da Cidadania, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação.

EcoDebate, 23/10/2012

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One thought on “Mais hidrelétricas e termelétricas até 2021 – O futuro que ‘eles’ querem, por Telma Monteiro

  • Não me arrisco, mais, a tentar entender ou combater as atuações do planejamento de energias do nosso governo federal.
    Quando ainda lutava pela não instalação de UHEs na bacia do Rio Piranga-Doce, tive a primeira grande surpresa no momento em que um expositor oficial da “concessão”, não tendo explicações sobre quesitos indispensáveis inexistentes no EIA-RIMA, remeteu-nos ao site da EPE para vermos nos diagnósticos dessa empresa, “aparentemente estatal”, da entourage organizacional do governo federal submetida a interesses privados.

    Vorazmente me dirigi ao tal “endereço”. Surpresa total: não era e não é nenhum diagnóstico ambiental com base em informações “in loco” e sim e enorme “copia e cola” de pesquisas nos anais de empreendimentos já apresentados à ANEEL e até de imagens do GOOGLE-EARTH, se não incorro em indesejado engano.

    O identificar volumes de água represáveis em ambientes propícios, de queda de nível, não é definitivamente planejamento de viabilidade.

    Pareceu-me um trabalho voltado para satisfazer uma “pré-dissertação oficializado e pré-aceito pela estrutura governamental de tudo que puder ser feito para explorar, à exaustão, toda e qualquer aparente oportunidade de se implantarem usinas hidrelétricas no território nacional.

    Até uma Universidade, tendo partido de uma elaboração de projeto teórico para uma PCH, acabou sendo nova porta aberta à intensiva promoção de PCHs, que, no meu parco entender, são, no conjunto, muito mais disseminadoras de males à vida e ao ambiente do que uma só UHE gigante se erigida em local realmente apropriado.

    Depois de “contribuir” com os grupos nacionais e internacionais do “poder elétrico”, um personagem dessa estória virou conselheiro mor em governos que, na contramão da tendência universal, querem continuar a exaurir a exploração de nosso território em proveito próprio contra os direitos nativos das gerações futuras.

    E, diga-se de passagem, interessados não só no consumo da energia como também nas explorações minerais e madeireiras aquinhoados direta ou indiretamente com os projetos (interesses postados nas duas pontas).

    A posteridade vai, certamente, estranhar e classificar devidamente o que está acontecendo no Brasil em termos de subserviência, de subordinação, de traição aos destinos do país, com o único fim de dar mercado a fabricantes e construtores de um modelo energético no paroxismo da pré-extinção, de ciclo de vida já “morto”, fazendo o que não deviam nem estão “honradamente” autorizados a fazer, em termos de marcar passo tecnologicamente por não aceitar as novas perspectivas que se apresentam aos povos do planeta.

    Felizmente, por sobre uma praia do nordeste, nessa imensa costa brasileira nunca inserida como potencial energético, já se montou e está em operação uma usina movida aos movimentos das ondas e gerando eletricidade usando cilindros de compressão hidráulica, com água doce retida em circuito fechado (a mesma água circulando), um belo exemplo do que é visão futurista e do mais alto respeito ambiental, utiliza o mínimo espaço, e não degrada nada, podendo representar até uma aceitável inserção na visão de todos que a virem, significativa de real progresso tecnológico.

    Não conheci, não convivi, mas conhecendo textos e um pouco da história dele, “tenho saudades e sinto falta de não termos, hoje, nenhum Ruy Barbosa”. E sinto verdadeiramente o teor do protesto que nos deixou. Tenho vergonha…

    Obrigado por seus artigos, Dra. Telma Monteiro.

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