Urbanização e Cidades Ecológicas, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
Urbanização e Cidades Ecológicas, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
[EcoDebate] A população mundial passou de 2,5 bilhões de habitantes para 7 billhões entre 1950 e 2011. No mesmo período a população urbana passou de 730 milhões (29%) para 3,6 bilhões de habitantes (51% da população total). Enquanto a população total cresceu 2,8 vezes, a população urbana cresceu 4,9 vezes, em seis décadas, segundo dados da divisão de população da ONU.
As projeções para 2050 indicam uma população mundial de 9,3 bilhões de habitantes, sendo 6,3 bilhões no meio urbano, o que significará cerca de 70% da população mundial vivendo em cidades. Ou seja, nas próximas quatro décadas a população rural do mundo vai diminuir de 3,4 bilhões de habitantes para 2,8 bilhões, enquanto a população urbana vai absorver todo o contingente de pessoas que vão nascer (2,3 bilhões) mais a migração líquida dos 600 bilhões que vão sair do rural para o urbano. Ou seja, a população urbana do mundo vai passar dos atuais 3,6 bilhões para 6,3 bilhões de habitantes em 2050, um acrescimo de 2,7 bilhões de pessoas nas cidades em apenas 40 anos.
Portanto, em termos absolutos, a humanidade vai ter o maior crescimento urbano para um período de quatro décadas, de toda a história. Isto é bom ou ruim?
Evidentemente, um crescimento demográfico de mais de 2 bilhões de habitantes em 40 anos vai ser um grande desafio para o mundo humano e não-humano, pois as atividades antrópicas já ultrapassaram em cerca de 50% a capacidade de regeneração do Planeta. Para pressionar ainda mais os recursos naturais, o crescimento populacional deve vir acompanhado de crescimento econômico. Estima-se que o PIB mundial vai crescer entre 3 e 4 vezes entre 2010 e 2050, com enorme impacto na pegada ecológica. Portanto, os desafios vão ser realmente de enormes proporções.
Mas a questão que se coloca é a seguinte: é melhor enfrentar os desafios do crescimento populacional na cidade ou no campo?
Existem muitas pessoas saudosistas que falam em des-urbanização ou até mesmo “desmigração”. Alguns sonham com uma casa no campo, de preferência de “pau-a-pique e sapê, com carneiros e cabras pastando solenes no jardim”, como na música de Zé Rodrix. Mas o próprio mundo rural atualmente é bastante diferente do que foi no passado e a urbanidade já avançou para além das cercas que dividem o campo da cidade.
Diversos estudos mostram que os indicadores sociais e econômicos melhoram com o aumento da urbanização. Os países mais urbanizados tendem a ter maior renda, maior nível educacional, menor mortalidade infantil, maior esperança de vida, maior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), menores níveis de violência, menor proporção de pessoas passando fome, menor mortalidade materna, menor desigualdade de gênero, etc. Em geral, a concentração urbana permite ganhos de escala e ganhos do efeito de aglomeração, ao contrário da dispersão rural ou das pequenas cidades.
David Owen, no livro Green Metropolis, mostra que os impactos ambientais (emissões, resíduos, ou consumo de terra per capita) é menor nas cidades densas do que nas cidades espraiadas ou nos países com população rural dispersa. Ele mostra que Nova Iorque, especialmente Manhattan, é muito mais eficiente no uso da energia e tem menor pegada ecológica per capita do que cidades como Washington ou Los Angeles. Por exemplo, a verticalização das moradias e escritórios torna mais eficiente o transporte coletivo, pois seria impossível manter metrôs e trens de alta velocidade em áreas rurais ou mesmo em áreas suburbanas de baixa densidade populacional.
O fato é que a urbanização é uma tendência que veio para ficar e vai se expandir nas próximas décadas, como bem mostrou o demógrafo George Martine, no relatório do UNFPA de 2007.
Portanto, a discussão mais interessante é como tornar as cidades mais sustentáveis e ecologicamente mais amigáveis. A construção de cidades ecológicas pode ser um caminho nesta direção, especialmente para a China que tinha 64 milhões de habitantes (12% do total) vivendo nas cidades em 1950, passou para 635 milhões em 2010 (47%) e deve ultrapassar 1 bilhão de habitantes (73%) em 2050.
A cidade de Tianjin Eco-city, na China, está sendo construída para receber até 350 mil habitantes e pretende inovar em termos de transporte coletivo, utilização da água, reciclagem de resíduos, construções de prédios ecológicos, uso de energias renováveis, baixa emissão de dióxido de carbono, etc. O projeto deve estar pronto por volta de 2020 e pretende ter mais sucesso do que outros projetos de ecópoles como Dongtan (perto de Xangai) e Masdar (perto de Abu Dhabi). A construção de Tianjin Eco-City tem sido feito em parceria com Cingapura, país 100% urbanizado e que tem um inovador sistema de tratamento de lixo e resíduos sólidos (aterro Pulau Semakau).
Como a literatura mostra, voltar com a população mundial para o campo não é viável, nem em termos ecológicos e nem em termos das liberdades individuais, pois as pessoas têm o “Direito à Cidade”. Assim, qualquer solução ecológica envolvendo a população mundial tem que passar pelo meio urbano.
Resta saber se estas cidades ecológicas vão conseguir redirecionar o processo de urbanização, evitando os problemas de poluição atmosférica, sonora, visual, destruição dos córregos, falta de saneamento básico, acúmulo de lixo, favelização, congestionamentos de automóveis, baixa mobilidade, etc. De fato, é cada vez mais urgente se buscar soluções para conciliar as condições ecológicas com a crescente urbanização, pois inchar e amontoar pessoas em cidades não resolve nem os problemas urbanos e nem os ambientais.
Construir algumas cidades ecológicas pode até ser relativamente fácil, difícil vai ser tornar todas as demais cidades sustentáveis, com economia de baixo carbono e com baixo impacto ambiental.
José Eustáquio Diniz Alves, colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
EcoDebate, 08/02/2012
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Esse crescimento populacional é insustentável, como também é insustentável o desenvolvimento. Se o planeta já não dá conta de sete bilhões…
Talvez, quando entenderem que o controle populacional é inevitável, seja tarde demais.
O Direito a cidade é mais do que acesso e livre passagem. O direito a cidade é a não exclusão, acesso a cultura, renda, moradia, livre expressão, muito mais e para além do que se projeta nas idealizadas cidades sustentáveis, ecológicas e qualquer outro adjetivo que queiram dar.
Não é desta cidade que o direito a cidade trata.