Decrescimento Econômico, artigo de Marcus Eduardo de Oliveira
[EcoDebate] Lançando uma rápida observação sobre os rumos da economia mundial, uma pergunta, de imediato, se arvora: o ritmo econômico atual baseado na produção excessiva e no consumo desenfreado é sustentável ou já se esgotou?
Na tentativa de encontrar-se a resposta, é imperioso entender que o processo econômico – esse emaranhado complexo que faz das ciências econômicas um campo de conhecimento capaz de captar as alterações em torno da produção, consumo, circulação e distribuição de mercadorias -, não cria matéria e energia, apenas as transformam.
Por isso, a dinâmica econômica deve ser vista mais que uma situação com potencial de transformação do que propriamente de produção em si. Disso resulta afirmar, contudo, que os recursos naturais, classificados pela tradicional teoria econômica como sendo um dos fatores de produção, podem se inscrever perfeitamente como fatores de transformação, pois agem como sendo matéria e energia atuando (transformando-se) dentro do processo econômico.
A partir dessa temática, cumpre ressaltar que a questão em torno do crescimento econômico, uma vez atingido em grau exagerado, sem, portanto, o uso racional de critérios balizadores, além de exercer forte exploração de recursos, submetendo todo o ciclo ambiental a constante agressão, resulta, ainda, num final preocupante: a poluição ao meio ambiente decorrente da emissão de resíduos que sobra desse processo produtivo.
Assim, temos que o meio ambiente é “insultado” pelo sistema econômico (no ato da produção) que responde ainda com poluição (ao descartar os materiais que restam depois de serem produzidos).
Destarte, nos parece ser de fundamental importância comentar, na esteira dessa temática, que a ideia da exploração constante do meio ambiente pode, grosso modo, ser vinculada à uma das ideias que permearam os tempos antigos da economia, especificamente em torno do consagrado conceito da Lei dos Rendimentos Decrescentes; termo esse tão ao gosto dos economistas clássicos.
Vejamos que, de fato, “explorar” o sistema ambiental em nome (e em prol) do sistema econômico até atingir-se o ponto de saturação (que resultará na verdade em decrescimento) só poderá ter como consequência o “fim” do próprio sistema econômico. Quanto mais se usa, menor é o valor de troca. Para usos constantes, desgastes exorbitantes.
Inequivocamente, a partir do ponto saturado, qualquer tentativa de se obter novas taxas de crescimento econômico tornar-se-á totalmente inócua, gerando, apenas e tão somente, mais passivos ambientais.
É mister atentar-se ao fato de que ao atingir esse ponto de saturação, crescer economicamente (pelos critérios estabelecidos pela economia tradicional) deixa de ser salutar; é hora então de parar; quem sabe a hora seja mesmo de regredir.
A ideia do decrescimento econômico
É justamente aqui que entram as ideias de alguns teóricos que defendem, por exemplo, o conceito de “crescimento zero” (zero growth), de “decrescimento” (degrowth), e mesmo de “crescimento com o freio de mão puxado” para salientarmos apenas alguns “slogans” que corre em moda.
Ir contra essa premissa, achando que o crescimento exponencial é factível e salutar, é cair na estupidez intelectual, como bem salientou Kenneth Bouilding, quando, apropriadamente, afirmou que: “Propor um crescimento ilimitado num mundo limitado, só pode ser coisa de um estúpido, ou de um economista”.
Para corroborar com esse tipo de argumento, vejamos o que diz o professor Charles Mueller, um dos mais brilhantes estudiosos dessa temática: “Os materiais fundamentais transformados pelo sistema econômico existem no meio ambiente em quantidades limitadas, decrescendo com o uso e a capacidade de o ecossistema global assimilar os resíduos e a poluição que o sistema econômico vem gerando, pois isso é fixo e menor do que se supõe”.
Essa questão, assim, nos parece bem notória: enquanto existir limites ecológicos (e não há o menor indício que isso venha a deixar de existir) será incompatível se pensar em grandes mercados de consumo de massa que exigem, como condição sine qua non, elevadas taxas de crescimento. Expandir o mercado de consumo implica, automaticamente, agredir ainda mais o meio ambiente em troca de uma produção sem limites.
Assim como o óleo e a água não se misturam, um crescimento de bens fora dos padrões aceitáveis dados pela imposição ambiental, vinculado, em parte, ao atendimento do chamado consumo conspícuo não é (e nunca será) factível.
É preciso ressaltar que ao longo de mais de dois séculos de existência de textos que embasam todo o pensamento teórico das ciências econômicas, tomando como ponto de partida a publicação magna de A Riqueza das Nações (março de 1776), a recomendação em termos de políticas econômicas tem sido, desde então, uma só: é preciso crescer para formar um mercado de consumo de massas; ou seja, é fundamental fazer a economia se expandir, gerando uma grande sociedade de consumo, de tudo quanto for possível. Ora, será isso suportável num mundo que convive com a escassez?
É evidente que a resposta é negativa. Com isso, percebe-se que o erro está assentado sob as bases teóricas do pensamento econômico impregnado desde sua aparição seminal que confunde progresso com crescimento sem limites.
Essa sociedade de consumo que a economia tradicional (a velha economia) sempre recomendou, foi (e tem sido) erigida sob o ponto de vista do falso argumento de que é consumindo – adquirindo todo e qualquer tipo de produtos possíveis e imagináveis – que o bem-estar será alcançado. Assim, uma vez mais se confunde crescimento com progresso e aquisição material como sendo sinônimo de obtenção de felicidade. É necessário pontuar que, para tudo, há limites.
A idéia predominante de que o mercado de consumo nos levará ao tão prometido “paraíso” é errônea. Essa receita – comprar cada vez mais para assim ser feliz – “impera” fortemente ainda hoje. O pior é que os defensores desse modelo insistem em nos dar o seguinte recado: vá ao mercado (shopping center, de preferência) faça suas compras e, assim, progredirás! Ora, isso está longe de ser economia saudável que faz a vida prosperar.
Definitivamente, não é esse o tipo de economia que a maioria, consciente da existência de limites e do que seja de fato o verdadeiro conceito de felicidade, almeja. Uma economia cujo valor principal repousa sobre o materialismo não nos parece factível, e muito menos plausível.
Entendemos que o valor principal deva estar nas relações sociais e numa harmoniosa convivência de todos com a parte ecológica (a natureza que nos acolhe). Para tanto, faz-se necessário uma profunda mudança de valores, consciência e ação. Iniciemos essa tarefa antes que seja tarde!
Marcus Eduardo de Oliveira é Economista e professor universitário. Especialista em Política Internacional pela (FESP) e mestre pela (USP). prof.marcuseduardo@bol.com.br
EcoDebate, 18/11/2011
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A clareza da exposição e a importância social e ecológica do assunto tratado são elogiáveis. Parabéns ao autor.
Excelente e didático artigo, não deixa margens à dúvidas, altamente esclarecedor. Nosso papel agora é divulgar o material. Em muito boa hora!