Moral Nacional, artigo de Montserrat Martins
[EcoDebate] Passamos um “pito” nos Estados Unidos e na Europa, sob aplausos da Assembléia Geral da ONU, quem diria. Para uma nação com “complexo de vira-lata”, como diagnosticou Nelson Rodrigues, estamos progredindo não só na economia mas também na auto-estima. Dilma dar uma aula didática de como gerir as finanças – e ainda prometer “ajuda” aos países desenvolvidos em crise – foi especialmente reconfortante para as gerações brasileiras anteriores, criadas ouvindo que o país não “fazia a lição de casa” e devia cada vez mais para o FMI, nas últimas décadas do século passado.
Os economistas podem explicar ao público a importância das propostas como as de “regulamentação do mercado financeiro, fonte de instablilidade, controles à guerra cambial com a adoção de regimes de câmbio flutuante, de impedir a manipulação do câmbio tanto por políticas monetárias expansionistas como pelo artifício do câmbio fixo”. Esse trecho do discurso, além do ‘pito’ no neoliberalismo, também é para a China, que com um câmbio fixo e desvalorizado dificulta a importação e facilita a exportação de seus produtos, pelo que é contestada na OMC (Organização Mundial do Comércio).
Desde 2008 o Brasil vem surpreendendo o mundo – e aos próprios brasileiros – com o equilíbrio de sua economia e a evolução de suas políticas sociais. Algo que só se tornou visível diante da crise dos países ricos, mas que reflete a capacidade adquirida por esforços de sucessivas gerações, até chegar ao momento atual. Enfim, merecemos esse discurso na ONU, ponto máximo até agora da afirmação de nossa competência, diante da comunidade internacional.
O chato de uma conquista é que não se pode descansar diante dos louros momentâneos do sucesso. Conter pressões inflacionárias sem cair na recessão segue sendo um desafio permanente e as instabilidades financeiras exigem atenção constante, como a disparada do dólar essa semana, por exemplo. Para confirmarmos a “lição de moral” que pregamos aos países mais poderosos do planeta, ainda temos muito trabalho a fazer.
Para citar duas questões importantes, nesse mesmo mês de setembro – glorioso na ONU – vimos uma decisão do STJ anulando provas contra o filho do presidente do Senado e uma comissão do Senado aprovando mudanças no Código Florestal, que na prática resultam em mais desmatamento. Essas decisões impopulares – como comprovam pesquisas de opinião pública sobre estes assuntos – não ocorrem sem protestos dentro do próprio Judiciário e do Legislativo. A ministra Eliana Calmon, do STJ (também corregedora do CNJ), deu uma entrevista explosiva essa semana, com grande repercussão na internet também.
Já no Senado, Lindbergh Farias (PT-RJ), Pedro Taques (PDT-MT) e Randolfe Rodrigues (Psol-AP) tentaram resistir à aprovação das mudanças que ameaçam nosso patrimônio ambiental. Esse momento em que estamos livres do “complexo de vira-lata” é uma oportunidade e tanto para valorizarmos os interesses maiores da sociedade, em questões tão importantes como essas, ainda à mercê de interesses predatórios – tanto do nosso ambiente natural, quanto da confiança nos nossos representantes políticos.
Montserrat Martins, colunista do EcoDebate, é Psiquiatra.
EcoDebate, 23/09/2011
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