Código Florestal: o desafio não está entre velho e novo, artigo de Ricardo Nunes
[EcoDebate] A mudança no Código Florestal é sem dúvida uma daquelas questões que dificilmente se chega a um consenso. Os ruralistas mais radicais acreditam “carregar o país nas costas” produzindo alimento e enfrentando todo o tipo de dificuldade e que apenas isso justifica o desmatamento. Os ambientalistas mais radicais acreditam que a maioria dos grandes produtores estão na ilegalidade, são criminosos, agem apenas para aumentar o seu patrimônio e que todos deveriam ser pequenos, pois pequenos produtores são mais sustentáveis e tal modelo de produção distribui melhor a renda no país.
Mas será que toda essa discussão justifica que podemos mudar o Código Florestal?
Será que não está dentre os direitos fundamentais previstos em nossa Constituição o de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum ao povo, essencial a sadia qualidade de vida, impondo ao Poder Público e a coletividade o dever de protegê-lo para as presentes e futuras gerações (art. 225 da Constituição Federal)?
Direito? Não sejamos ingênuos, pois a liderança política no Brasil goza de muitos direitos, mas mal cumpre os seus deveres. Nesse país, direito é a “preço de ouro” e os deveres são enfiados pela sua goela e não me venha com reclamações.
A mudança no código florestal é desnecessária, pois o antigo código florestal, na maioria, nunca foi respeitado e, por mais absurdo que seja, o novo dificilmente será.
Isso acontece, pois está no íntimo do agricultor querer aumentar a produção, se tornar mais eficiente, aumentar a renda e ter mais posses. Dizer que pequeno produtor é mais sustentável pode ser superficial e provisório, pois a maioria dos pequenos produtores tem como meta ser grande no mais curto prazo. Além do mais, não há mal nenhum em querer ser grande. Todos nós, de alguma forma, queremos.
O que não é permitido é ser grande à custa da nossa biodiversidade e do nosso direito de um meio ambiente protegido.
A questão então é o equilíbrio, pois a humanidade anda pelo caminho da importância, o caminho de que para merecer proteção e respeito tem de mostrar valor, mostrar produtividade e oferecer algo em troca.
Infelizmente, nem todos conseguem perceber o que as florestas bem conservadas, os rios não poluídos e a fauna em harmonia podem oferecer de valor e produtividade.
Talvez o grande desafio não seja lutar por um Código Florestal velho ou novo. O desafio está em convencer, antes que um desastre convença, que um meio ambiente preservado é capaz de gerar renda, melhorar a produtividade agrícola e garantir o direito de sadia qualidade de vida prevista na Constituição.
Ricardo Nunes, Engenheiro Florestal, ESALQ/USP
EcoDebate, 11/07/2011
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Pois é, falta justamente este equilíbrio, tão bem colocado pelo Ricardo Antunes. O assunto não tem que ser resolvido por “bancadas” , mas pela ciência ecológica, base da ciência econômica. Os ecossistemas – cadeias alimentares naturais – precisam ser mais preservados do que as cadeias produtivas comerciais. Esse fato é muito óbvio, mas parece que tem muita gente cega pela ânsia de produzir de modo insustentável e irresponsavelmente. Nós não temos obrigações apenas econômicas. Onde está a responsabilidade ecológica e social? E por que só o social humano? Onde está o social das bactérias, das plantas, dos vermes, dos cupins, das formigas e tantos outros. Parece que vivemos num mundo como a única e mais importante criatura do planeta. Isso é falso. Acordem, por favor. Nós não estamos sozinhos.!