Entamboramento de carga radioativa rende multa à INB
[Por Zoraide Vilasboas, para o EcoDebate] A Indústrias Nucleares do Brasil (INB), pivô de recente polêmica, envolvendo transporte de material atômico de São Paulo para Caetité, na Bahia, onde produz concentrado de urânio, acrescentou mais uma multa do IBAMA à sua coleção de embromações. Na véspera do São João (22.06), a Divisão de Licenciamento Ambiental\IBAMA lavrou a multa de R$600 mil, punição prevista em lei federal para empresa que fizer “funcionar atividades consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, em desacordo com a licença obtida” (art. 66 do Decreto Federal 6.514\2008.
Esta multa é um desdobramento do caso da carga de material radioativo do Centro Tecnológico da Marinha, em Iperó (SP), transportado para a Bahia, que foi impedida pela população de entrar na INB\Caetité, em 16 de maio passado. Por causa da suspeita de se tratar de lixo radioativo, os protestos se estenderam a outros municípios, como Guanambi, onde toneladas de concentrado de urânio ficaram retidas por cinco dias no batalhão da PM. O incidente mobilizou moradores da região, sendo constituída uma Comissão Institucional Provisória para dialogar com a empresa, constituída de representantes da Igreja, sociedade civil de Caetité, de Guanambi, ministério público e autoridades dos dois municipios.
O foco da confusão – A explicação pela INB, de que não transportava lixo, mas concentrado de urânio para ser reemtamborado em sua unidade baiana, puxou o fio da meada de uma série de desconfianças sobre a regularidade do transporte e se a reembalagem poderia ser feita em Caetité. Após quatro dias de reunião, em 19 de maio, um acordo gerou um Termo de Compromisso, estabelecendo que a carga iria para a INB\Caetité e permaneceria lacrada até que todos os requisitos de segurança para os trabalhadores, a população e o meio ambiente fossem garantidos pelo IBAMA, pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) e verificados pela Comissão Institucional Provisória.
Devido ao evento, a INB foi alvo de inspeções da CNEN, IBAMA, Eletronuclear e Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. A Comissão, tentando acompanhar o que ocorria na empresa, enviava ofícios ao IBAMA e CNEN buscando esclarecer aspectos nebulosos sobre o transporte e o processo de reentamboramento da carga. Em 24 de maio, pressionado pela Comissão, o IBAMA enviou notificação à INB requerendo, no prazo de 15 dias, um plano de trabalho para a reembalagem do material, cronograma, indagando sobre o destino final dos tambores utilizados (contaminados) e alertando que o reemtamboramento não poderia ser feito sem a autorização do IBAMA.
O último a saber? – Enquanto ofícios iam e vinham na burocracia adversária dos interesses da sociedade, a INB exercitava sua especialidade de driblar os órgãos fiscalizadores, ajudada pela lentidão benevolente dos agentes da lei, e colhia mais um triunfo. Em 6 de junho, embarcou, pelo porto de Salvador, 40 toneladas do urânio, em mais uma operação de transporte feita no mais absoluto sigilo. Para conseguir esta proeza, rompeu, outra vez, o compromisso público, selado com a sociedade e autoridades, e descumpriu determinações do IBAMA.
E o IBAMA, que segundo o Termo de Compromisso devia zelar pela evolução do caso, parece ignorar que parte da carga já está na França para enriquecimento: 17 dias depois da exportação do urânio (em 22 passado) deu mais 15 dias de prazo para a INB apresentar o cronograma do reembalagem, com inicio e prazo previsto para o transporte para Salvador! No mesmo oficio, o coordenador geral do Transporte, Mineração e Obras Civis\IBAMA, Eugenio Costa, justifica que a multa de R$600 mil foi lavrada porque a licença de operação da INB\Caetité não autoriza atividade de entamboramento de material, oriundo de outra instalação nuclear.
Aparentemente, o IBAMA está atuando, mas, agindo a todo vapor, a INB colocou o órgão numa “saia justa”. Segundo se comenta, a INB está devendo urânio a Areva, empresa francesa que faz o enriquecimento do produto, e caso o último carregamento não chegasse no prazo acertado, o urânio enriquecido não seria enviado para o Rio de Janeiro, comprometendo a próxima recarga de Angra I e II. Já conhecendo o faz-de-conta dos órgãos fiscalizadores das atividades nucleares (o IBAMA coleciona multas ambientais não pagas), as populações da região continuam alertas e aguardam ações por parte do Ministério Público Federal, que está investigando o caso.
Zoraide Vilasboas é jornalista, da Coordenação de Comunicação da ASSOCIAÇÃO MOVIMENTO PAULO JACKSON-Ética,Justiça,Cidadania
EcoDebate, 30/06/2011
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