Estudo avalia características e adesão ambulatorial de mulheres violentadas
Os pesquisadores lembram que a mulher vitimada sexualmente, além do tratamento médico, necessita do acolhimento de um profissional habilitado para dar conforto e ouvir suas angústias e medos
Causa de elevado custo financeiro ao país e grave problema de saúde pública, a violência sexual é um crime praticado contra a integridade e a liberdade sexual de uma pessoa. Estima-se que 18% das mulheres da população brasileira em geral sofram pelo menos um episódio de violência sexual durante a vida. Mesmo com esse grande percentual, ainda existem poucos dados referentes à adesão ao seguimento médico depois de ocorrida a agressão, o que estimulou pesquisadores da Universidade Católica de Campinas a avaliarem a evolução da adesão de 642 mulheres vítimas de violência sexual ao serviço de atendimento prestado no Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher (Caism) da Universidade Estadual de Campinas. Os resultados foram publicados na revista Cadernos de Saúde Pública da Fiocruz.
“No Brasil, assim como em outros países, a denúncia às autoridades policiais e a procura por ajuda médica são baixas. Apesar de existirem atualmente 397 delegacias especializadas no atendimento às mulheres vítimas de violência sexual e mais 1,5 mil serviços de apoio, entre hospitais, organização não-governamental e casa de abrigo, somente 20% das agredidas procuram esses serviços”, explicam os pesquisadores. “Esse crime assume uma característica multifacetada envolvendo a vítima, o agressor e o cenário onde acontece a violência, o que dificulta o seu diagnóstico, o seu entendimento e a organização de medidas preventivas. É definido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como todo ato sexual ou tentativa em obtê-lo sem consentimento da mulher, utilizando-se de atos coercivos e intimidatórios, como a força física, a grave ameaça, o uso de armas e a pressão psicológica”.
Foram incluídas na pesquisa todas as mulheres atendidas que passaram pelo serviço de urgência do Caism e que optaram por prosseguir o tratamento ambulatorial entre os anos de 2000 e 2006. Os dados apontaram que houve um aumento na adesão ao seguimento ambulatorial durante os seis meses depois a agressão, com taxa de abandono diminuindo de 59% para 31%. “A taxa de abandono diminuiu principalmente após a primeira consulta ambulatorial. Esse dado reforça a importância de uma orientação adequada no atendimento inicial para dar continuidade ao seguimento ambulatorial, principalmente focando as orientações sobre direitos legais da mulher, os potenciais riscos de gravidez indesejada, de aquisição de DST e de problemas psicológicos e sexuais futuros”, explicam os pesquisadores.
Além disso, foi possível observar um aumento de 13% para quase 70% no acompanhamento psicológico. “A mulher vitimada sexualmente, além do tratamento médico, necessita do acolhimento de um profissional habilitado para dar conforto e ouvir suas angústias e medos. Nos grandes centros de referência, o atendimento psicológico é realizado em conjunto com o atendimento médico, no próprio complexo hospitalar; contudo, para a realidade brasileira, apenas uma pequena parcela das mulheres tem oportunidade de comparecer a esses centros”, comentam os pesquisadores. “Portanto, é preciso redimensionar e definir o papel de atendimento psicológico, principalmente para o seguimento nas redes básicas de saúde, integrando-as à dinâmica do atendimento médico realizado nos hospitais. Isso facilitaria ainda mais o acesso dessas mulheres ao seguimento psicológico e diminuiria sensivelmente os custos financeiros para elas”.
A pesquisa também indicou que a prescrição da anticoncepção de emergência diminuiu consideravelmente de 82% para 50% durante o período analisado. “Essa redução se deve, em parte, ao maior acesso à medicação, seja por conta própria, seja por uma maior oferta das unidades básicas de saúde, que a disponibilizam sem os entraves burocráticos que existiam até pouco tempo”, elucidam os estudiosos. “Outro fator associado é que provavelmente houve um aumento do uso de métodos contraceptivos eficazes pelas mulheres nos últimos anos”.
O estudo ainda mostrou que o número de agressores conhecidos triplicou ao longo dos anos, mesmo sendo os desconhecidos o valor ainda predominante (65% das vezes). Mesmo com o número verificado, os pesquisadores destacam que as mulheres agredidas em ambiente doméstico são as que menos denunciam as autoridades. “Apesar de a polícia ter uma participação importante nesse tipo de atendimento, muitas mulheres se recusam a comparecer ao distrito policial para fazer a denúncia. O medo de retaliação por parte do agressor é referido, nesses casos, por 43% das mulheres que se recusam a fazer denúncia policial”, afirmam os estudiosos. “Outros motivos que dificultam as denúncias são os seguintes: 75% das mulheres estão preocupadas com a exposição pública, 60% sentem-se culpadas pela agressão sofrida e 74% têm vergonha do ocorrido”.
Reportagem de Renata Moehlecke, da Agência Fiocruz de Notícias, publicada pelo EcoDebate, 14/06/2011
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