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Artigo

Extremos demográficos: alto crescimento e decrescimento populacional, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

[EcoDebate] Na média, a população mundial tem reduzido o ritmo de crescimento e tende à estabilização na segunda metade do século XXI. Mas os números médios geralmente escondem o que está acontecendo nas extremidades. Os extremos demográficos ficam claros quando consideramos os países com menor e maior fecundidade.

Os 10 países que apresentavam Taxas de Fecundidade Total (TFT) de cerca de 6 filhos por mulher, no quinquênio 2005-10 são: Afeganistão, Burkina Faso, Chade, República do Congo, Malawi, Niger, Somalia, Uganda, Tanzania e Zambia. Em 1950, estes 10 países tinham uma população total de 50 milhões de habitantes (equivalente à população do Brasil na época), passando para 258 milhões em 2010 e, mesmo considerando que a fecundidade venha a cair rápido nas próximas décadas, devem chegar a 640 milhões de habitantes, em 2050. Como a população destes países é muito jovem, o ritmo de crescimento, mesmo diminuindo, deve continuar na segunda metade do século XXI e não é imposível que estes 10 países ultrapassem 1 bilhão de habitantes antes de 2100.

Os 10 países que apresentavam Taxas de Fecundidade Total (TFT) abaixo de 1,5 filho por mulher, no quinquênio 2005-10 são: Alemanha, Japão, Rússia, Grécia, Itália, Portugal, Espanha, Hungria, Coréia do Sul, Romenia. De 1950 a 2010 a população destes países aumentou de 389 milhões para 556 milhões, mas, mesmo na hipótese de aumento da fecundidade, a população vai diminuir até 2050, devendo cair para 488 milhões de habitantes.

O fosso demográfico entre estes 20 países é bastante acentuado. Os países de baixa fecundidade, além de serem de renda média e alta, possuem uma estrutura mais envelhecida e são receptores de migrantes. Já os países de alta fecundidade são pobres, possuem uma estrutura etária jovem e são expulsores de migrantes.

Enquanto os primeiros devem ter um declínio de no mínimo 70 milhões, nos próximos 40 anos, os segundos devem ter um crescimento de quase 400 milhões de habitantes, até 2050. O desafio é duplo, enquanto uns decrescem os outros devem crescer muito rapidamente. Mas a redução populacional pode ser resolvida via a imigração. Contudo, os 400 milhões de habitantes pobres que vão ser acrescentados nestes 10 países terão dificuldades para conseguir níveis adequados de vida.

A alta fecundidade nestes países acontece, em grande parte devido à falta de acesso aos serviços de saúde reprodutiva. Estados e governos falidos (e/ou corruptos) não possuem condições de garantir os direitos de cidadania da população. Portanto, o desafio de resolver os direitos humanos destas populações vai ser muito difícil e mais difícil ainda romper com a “armadilha da pobreza”.

Por conta disto, o resto do mundo e a ONU não devem abandonar estes países de alto crescimento demográfico à própria sorte. É preciso garantir a aplicação dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), especialmente garantir a universalização dos serviços de saúde reprodutiva. Não se trata de impor um controle populacional ou violar as liberdades individuais. Diversas pesquisas mostram que existe um alto percentual de gravidez indesejada e de necessidades não-satisfeitas de contracepção nestes países. O que o mundo precisa fazer é dar apoio para que as mulheres e casais – independente do nível de renda – possam ter o número de filhos que desejam, assim como reduzir a fecundidade indesejada. Estes países precisam da efetivação dos direitos reprodutivos, com acesso à informação e aos meios de regulação da fecundidade.

Os estudos econômicos mostram que a redução da fecundidade traz modificações na estrutura etária e cria uma janela de oportunidade ou bônus demográfico, em termos micro e macro econômicos, que – se bem aproveitado – pode ajudar na decolagem do desenvolvimento e na redução da pobreza. A opção preferencial pelos pobres, nestes 10 países de alta fecundidade, significa valorizar a qualidade da vida dos filhos e das pessoas já existentes e não a reprodução de uma elevada quantidade de habitantes para satisfazer o poder de chefes patriarcais.

Referência:
ALVES, J.E.D. O fosso demográfico: países com alta e baixa fecundidade. Aparte, IE/UFRJ, 2011

José Eustáquio Diniz Alves, colunista do EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE. As opiniões deste artigo são do autor e não refletem necessariamente aquelas da instituição. E-mail: jed_alves{at}yahoo.com.br

EcoDebate, 29/03/2011

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