Ação do MPT contra Imbralit pede substituição do cancerígeno amianto e R$ 5 milhões por danos morais
O Ministério Público do Trabalho (MPT) em Criciúma entrou com ação civil pública com pedido de liminar (ACP) contra a Imbralit Indústria e Comércio de Artefatos de Fibrocimento Ltda., para que esta substitua o amianto por outra matéria-prima em sua linha de produção, num prazo de 90 dias. O MPT também pede na ação, que a empresa pague R$ 5 milhões a título de dano moral coletivo por irregularidades no meio ambiente do trabalho.
O amianto é uma fibra mineral usada em alguns países, notadamente os pouco desenvolvidos ou em desenvolvimento, para produção de telhas e caixas d’água, entre dezenas de outros produtos. Desde a década de 1970, seu uso vem sendo restrito devido ao risco mortal a que ficam expostos os trabalhadores, principalmente. Já foi banido em 58 países da Europa, América do Norte, África, América Latina e na Arábia Saudita. A poeira liberada pelo amianto causa asbestose (endurecimento dos pulmões que leva lentamente à morte), câncer do pulmão e mesotelioma, tumor maligno 100% fatal que acomete o pericárdio (camada que reveste externamente o coração), o peritônio (camada que reveste internamente a cavidade abdominal) e a pleura (camada que reveste o pulmão). A Organização Mundial da Saúde (OMS), a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e o Instituto Nacional do Câncer, entre outras organizações nacionais e internacionais, consideram que não há níveis seguros para o uso do amianto.
Na ação de autoria do procurador do Trabalho Luciano Lima Leivas, constam os relatórios das fiscalizações à empresa Imbralit feitas pela Vigilância Sanitária em 2006 e no ano passado. Os documentos comprovam que a Imbralit sequer está cumprindo o “termo de acordo nacional do uso seguro e responsável do amianto”, do qual é signatária e que define ´pretensos parâmetros técnicos para manipulação do amianto em níveis defendidos por empresas do setor e pela Comissão Nacional dos Trabalhadores do Amianto (CNTA) como “seguros”.
Entre as principais normas desrespeitadas pela Imbralit estão a umidificação e ventilação precárias ou insuficientes, descarte das águas da lavanderia de roupas contaminadas com a poeira do amianto diretamente na rede de esgoto comum, inexistência de controle efetivo da poeira do amianto no ar. Um dos testes constatou que a quantidade de fibras de amianto suspensas no ar nos locais de trabalho chegou a 0,23 f/ml³ (fibras por milímetro cúbico) e o limite de tolerância fixado pelo “termo” para fibras suspensas respiráveis é de no máximo 0,10 f/ml³.
Outra obrigação estabelecida no “acordo” é a que determina que após o término do contrato de trabalho a empresa deve realizar o acompanhamento médico dos trabalhadores durante 30 anos. De acordo com a fiscalização, a empresa não realiza busca ativa dos ex-funcionários. O Centro de Referência em Saúde do Trabalhador está fazendo essa busca e já identificou um motorista autônomo de transporte de amianto que pode ter prestado serviços para a Imbralit e morreu vítima de mesotelioma. “O MPT não considera o ‘termo’ um instrumento capaz de legitimar a exposição de trabalhadores a esta matéria-prima carcinogênica e a Imbralit comprova nossa tese, visto que sequer atende ao que ela própria elegeu como uso seguro”, argumenta o procurador.
O “termo de acordo nacional do uso seguro e responsável do amianto” nasceu no final da década de 1980, época em que o banimento do amianto já era efetivo em vários países desenvolvidos, quando foi criada dentro da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Indústria (CNTI) a Comissão Nacional dos Trabalhadores do Amianto (CNTA). Em 1995, foi sancionada a Lei federal 9.055, que regulamenta a exploração, transporte e manuseio do amianto. A Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) questiona a lei em Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) que está desde 2008 aguardando decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Há dezenas de ações no STF, tanto de defensores do uso do amianto, quanto dos que querem seu banimento total, como já é realidade em tantos países industrializados.
Quatro estados e 20 municípios, no entanto, já aprovaram leis banindo o uso do amianto, como os estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Pernambuco, e os municípios de Osasco e São Paulo. Em Santa Catarina, por duas vezes nessa última década, a Assembleia Legislativa arquivou proposta de lei para proibir o uso da fibra no estado. A Imbralit fez lobby contrário nas duas oportunidades (2007 e 2008).
Substituição é viável
A substituição da matéria prima amianto crisotila por outras substâncias menos nocivas à saúde humana é uma das diretrizes fixadas pela Convenção 162 da OIT, da qual o Brasil é signatário. Desde 2001, se produz no Brasil, com absoluto sucesso, telhas e caixas d’água sem amianto, utilizando-se o poli álcool vinílico (PVA) ou o polipropileno (PP), materiais não nocivos à saúde humana. A própria Imbralit de Criciúma substituiu o amianto na produção de caixas d’água em meados de 2008. Recentemente, encomendou estudos para fazer o mesmo na produção de telhas, mas recuou e continua expondo centenas de trabalhadores ao amianto. “A Imbralit decidiu não fazer a substituição por razões meramente econômicas. Tecnicamente, inclusive, o estudo demonstrou que a empresa está preparada para adotar outras matérias-primas na sua linha de produção de telhas”, conta.
A Imbralit é a quarta maior empresa do setor de produtos de fibrocimento e a única do segmento instalada em Santa Catarina. Embora seu foco de distribuição esteja voltado para a Região Sul do país, a empresa atua nacionalmente e exporta para países da América do Sul e da África. Suas atividades envolvem cerca de mil trabalhadores, direta e indiretamente. A Imbralit detém 11% do mercado brasileiro de fibrocimento a base de amianto.
Além das irregularidades relativas ao amianto, o MPT ainda elenca outras normas de saúde, higiene e segurança descumpridas pela empresa, em número superior ao total de letras do alfabeto. “Desde a falta de fornecimento de equipamentos de proteção, passando pela inexistência de cuidados ergonômicos, até a falta de higienização das instalações sanitárias, demonstrando que a empresa não reúne condições elementares para controlar o uso da substância cancerígena”, conclui Luciano Lima Leivas.
O efeito cancerígeno do amianto foi diagnosticado pela primeira vez há mais de um século, em 1906, pelo médico francês Armand Auribault. Os males causados pela fibra podem levar de 15 a 50 anos para se manifestar. “Ainda que o amianto seja banido do Brasil, o pior está por vir”, afirma Eduardo Algranti, pneumologista da Fundacentro, órgão do Ministério do Trabalho e Emprego, sobre a legião de doentes terminais gerados pela fibra.
Fonte: Ministério Público do Trabalho em Santa Catarina
EcoDebate, 11/02/2011
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