Bahia: Morre mais um trabalhador rural em área de conflito
Antonio Plínio, liderança do movimento pela regularização fundiária das áreas de fundo de pasto, em Monte Santo, Bahia, foi assassinado no dia 6 de janeiro em sua propriedade.
O trabalhador rural Antonio do Plínio é mais uma vítima de conflito no campo. Ele foi assinado no município de Monte Santo – BA e ao que tudo indica resultado de um conflito agrário na comunidade de fundo de pasto da Serra do Bode. Foi morto a tiros e segundo informações ainda não confirmadas, teve a cabeça degolada, num ato de crueldade que deixa pistas sobre a verdadeira intenção dos algozes: silenciar pelo medo os trabalhadores rurais que resistem às tentativas de grilagem das áreas de Fundos de Pasto na região. Antônio do Plínio se destacava como liderança no movimento pela regularização fundiária das áreas de fundo de pasto da região. Ele foi encontrado morto em sua propriedade na noite de 6 de janeiro.
Histórico do conflito
Em 18 de dezembro de 2006 os membros da comunidade de fundo de pasto Serra do Bode, representados pelo Centro de Referência em Assessoria Jurídica Popular às Comunidades Tradicionais de Fundo de Pasto, Quilombolas e Pescadores Artesanais de Monte Santo – BA e Região (Centro ligado ao Projeto de Extensão da Universidade Estadual de Feira de Santana) requereram à Coordenação de Desenvolvimento Agrário da Bahia o georreferenciamento da área coletiva de fundo de pasto, no intuito de formalizar e regularizar a posse comunitária de 1.028,3885 ha.
Em 23 outubro de 2007 a área foi georreferenciada, com ampla divulgação e notificação dos confrontantes, conforme Edital publicado pela Coordenação de Desenvolvimento Agrário – CDA. Até esta data, não houve nenhum questionamento no que se refere ao uso da área para criação de animais por pequenos criadores da comunidade, em regime de fundo de pasto. Não houve também nenhum questionamento dos confrontantes quando ocorreu a discriminatória da área. O título definitivo ainda não foi concedido em razão da determinação da Procuradoria Geral do Estado que nenhum título fosse concedido até que houvesse adequação ao determinado no art. 178 da Constituição do Estado da Bahia, que indica ser o Contrato de Concessão Real de Uso o instrumento adequado para a titulação das comunidades de fundo de pasto.
Durante o ano de 2009, entretanto, alguns indivíduos passaram a circular pela área coletiva alegando serem proprietários desta. Apesar de alertados de que se tratava de um fundo de pasto, registraram diversas queixas perante o Delegado Local afirmando que membros da comunidade da Serra do Bode haviam “invadido” a área. Após algumas audiências, contando inclusive com a presença do procurador jurídico da CDA, foi esclarecido ao Delegado que se tratava de terra pública, discriminada, e que não havia motivo para conflito.
Entretanto, José Dantas de Andrade, conhecido por “Zezito”, que alegava ser representante do pretenso proprietário da área, não conformado, pôs-se a retirar estacas da mata nativa do fundo de pasto, chegando a um número não confirmado de mais de 300 estacas; a diretoria da Associação Comunitária formalizou queixa de crime ambiental junto ao Instituto de Meio Ambiente do Estado da Bahia – IMA, que fez vistoria no local e expediu multa, em nome do José Dantas, em razão da confirmação do dano.
Em 30 de junho de 2010 a comunidade foi surpreendida com uma medida liminar, expedida pelo Juiz de Direito da Comarca de Monte Santo, determinando a reintegração de posse da área em nome de José Francisco Dantas, indivíduo cuja qualificação no processo indica residir na Pituba, em Salvador, e que apresentou para tanto Escritura Pública lavrada no cartório de registro civil com base numa Ação de usucapião da área. Ocorre que a sentença é datada de 14 de maio de 2009, ou seja, em data posterior a Ação Discriminatória, e nenhum dos confrontantes que pertencem à Associação Comunitária foi citado em decorrência da referida Ação. O Ministério Público também não foi citado na Ação de Reintegração de Posse.
O Centro de Referência ingressou com Agravo de Instrumento perante o Tribunal de Justiça do Estado da Bahia em 24 de setembro de 2010, tempestivamente, tombado sob o nº 70213-0/2010, alegando as razões já referidas acima e anexando toda a documentação referente à Ação Discriminatória promovida pela CDA, além da comprovação da condição de posseiros dos trabalhadores rurais da comunidade. No mesmo sentido, protocolou contestação na Ação de Reintegração de Posse, tombada na Vara Cível da Comarca de Monte Santo sob o nº 0000307-71.2010.805.0168. Foi solicitada ainda a cópia da Ação de usucapião, de forma a garantir uma Ação Rescisória dentro do prazo legal.
Até o momento, não houve despacho nem no Agravo de Instrumento, tampouco na Ação de Reintegração de Posse no sentido de apreciar/reconsiderar a decisão liminar. José Dantas de Andrade informou na comunidade que levaria um trator para a área para derrubar a vegetação; em reunião (12/11/10) os membros da comunidade informaram que não estavam dispostos a deixar o trator adentrar a área.
Informe da CPT-Comissão Pastoral da Terra, publicado pelo EcoDebate, 11/01/2011
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