Seqüestro de carbono sob a ótica Econômica
Estudo observa emissão e retenção no setor produtivo rural da região
Foto de Mácio Ferreira. As florestas fazem, naturalmente, o seqüestro de CO2, através da fotossíntese, ajudando a reduzir o efeito estufa.
Um dos temas ambientais atualmente mais discutidos nos seminários nacionais e internacionais é o seqüestro de carbono (CO2). A complexidade sugerida pela expressão “seqüestro de carbono” pode afastar os não iniciados na discussão, mas ela está presente no dia-a-dia das pessoas, pois se reflete diretamente na qualidade do ar que respiramos. Por Walter Pinto, Jornal Beira do Rio, ANO VI Nº 62.
Dá-se o nome de seqüestro de carbono ao processo de absorção de grandes quantidades de gás carbônico presentes na atmosfera. A forma mais comum é, naturalmente, realizada pelas florestas. Em crescimento, elas absorvem gás carbônico e liberam oxigênio, ou seja, são fundamentais para a diminuição de poluentes na atmosfera terrestre.
Há vinte anos pesquisando a dinâmica agrária na Amazônia, o PhD em Economia Francisco de Assis Costa, professor do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Sustentável do Trópico Úmido do Naea (UFPA), percebeu que questões relacionadas ao tema não poderiam ficar de fora de seus estudos sobre sistemas rurais de produção, se pretendesse continuar ajudando os atores locais a enfrentar os desafios atuais.
A atenção do pesquisador voltou-se para a questão no ano passado, quando estava em Oxford, como professor visitante. Ao participar do seminário “O destino da Amazônia”, no Oriel College, percebeu que as discussões giravam em torno de temas ecológicos, entre os quais, emissão de gases, efeito estufa e mudanças climáticas. No mesmo período, foram divulgados o Stern Report e o IPCC Report, entre outros relatórios internacionais que buscam calcular o impacto das mudanças climáticas na economia mundial.
Avaliando que a temática das mudanças climáticas tem sido trabalhada de forma descontextualizada do ponto de vista social, histórico e econômico, Costa está desenvolvendo estudos que buscam contribuir para corrigir o enfoque, observando como as diferentes estruturas de produção na Amazônia são importantes para os balanços de CO2. Seu objetivo é tentar tornar inteligíveis questões econômicas e sociais do meio rural amazônico aos participantes da discussão internacional, orientadas por questões ecológicas. Ao mesmo tempo, pretende “colocar as temáticas ambientais, hoje incontornáveis, nas discussões locais, respeitando as especificidades de seus sujeitos”.
Pesquisador alerta para comércio
A pesquisa de Francisco de Assis Costa busca observar o volume de emissões e de seqüestro de carbono associado à produção rural, ou melhor, aos diversos sistemas de produção existentes no setor rural amazônico. Esse balanço (resultado da equação “emissão menos seqüestro”) é analisado de forma dinâmica no tempo, ou seja, nos diversos momentos de evolução dos sistemas de produção, como uso, reuso e não-uso das áreas incorporadas.
O estudo abrange os sistemas agrários e as economias locais da região. As diferentes formas de uso dos recursos naturais variam conforme a natureza do sistema de produção e se expressam também no balanço de carbono. “Alguns sistemas emitem mais, outros menos; uns seqüestram, outros não. Os balanços são, então, diferentes”, explica o pesquisador.
Ele chama a atenção para o viés comercial que a questão, até então, ambiental está assumindo: “A dimensão e o significado das diferenças dos balanços devem ser apresentados em toda sua complexidade, pois a retenção líquida de carbono virou, ou está virando, um serviço mercantilizável. Se não tivermos conhecimento suficiente sobre as implicações disso, corremos o risco de tornar o novo mercado, base para aprofundar a diferença entre ricos e pobres no Brasil, ao invés de oportunidade para reduzir esse fosso”.
A pesquisa já conseguiu mostrar, com modelos simples, os diferentes balanços de CO2 dos diversos sistemas de produção rural na região Norte e observar aspectos importantes de uma política de mitigação do carbono na economia do sudeste do Pará. Os resultados foram apresentados no World Congress da Regional Sciense International Association, em março passado, e no Congresso da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Ambiente e Sociedade, em junho passado, provocando discussões acaloradas e interessantes, segundo Costa.
Gases mantêm terra aquecida
Retirar gás carbônico da atmosfera é uma das principais preocupações dos estudiosos diante do avanço do aquecimento global em todo o mundo. O processo de remoção de gás carbônico ocorre por fotossíntese. Ao retirar o dióxido de carbono (CO2) da atmosfera, o processo libera oxigênio e contribui para reduzir o efeito estufa.
Segundo a pesquisadora Chang Man Yu, autora do livro “Seqüestro florestal de carbono no Brasil – Dimensões políticas, socioeconômicas e ecológicas” (Editora Peirópolis, 2004, 280 páginas), “o efeito estufa é um fenômeno físico que acontece naturalmente. A atmosfera é composta, principalmente, de oxigênio (21%) e nitrogênio (78%). Os principais gases de efeito estufa (GEE) são o vapor d’água, o CO2, o metano (CH4) e o óxido nitroso (N20). O vapor d’água é o gás mais volumoso, no qual, no entanto, as atividades humanas têm pouca interferência direta. Os gases, que se concentram, naturalmente, na atmosfera, representam menos de um milésimo da atmosfera total. Sem esses gases, que atuam como um cobertor natural ao redor da terra, a radiação infravermelha térmica solar absorvida pela Terra se dissiparia no espaço e a superfície do nosso planeta seria 33ºC mais fria do que é hoje.”
“O dióxido de carbono (CO2), o principal gás causador do efeito estufa, circula entre quatro principais estoques de carbono: a atmosfera, os oceanos, os depósitos de combustível fóssil e a biomassa terrestre e o solo. No balanço global de carbono na atmosfera de nosso planeta, dos 6,3 Gt C (giga tonelada de carbono) emitidos, 3,3 Gt C permanecem na atmosfera, provocando o aumento do efeito estufa, e o restante é reabsorvido pelos oceanos e pela biota terrestre, aproximadamente em partes iguais”.
O pesquisador responde
Qual a relação da economia com a questão do carbono?
“A economia como disciplina tem incursões nesse tema, seja no que se refere à formação de novos mercados e comodities, seja no que trata de uma nova economia política crítica. Georgescu-Roegen, um economista romeno que já, em 1971, teorizou sobre sustentabilidade ambiental e economia, indicou que as atividades econômicas constituem vetor de entropia dos sistemas físicos e naturais da terra, isto é, um fator de desestruturação irreversível do planeta. Pesquisando CO2 ligado ao sistema econômico pelos sistemas agrícolas, tento resgatar um pouco isso também. Recentemente, surpreendi-me ao ler um texto do Celso Furtado, do início dos anos 70, que trabalha com as idéias do Georgescu-Roegen e se refere também à segunda lei da termodinâmica para pensar o que chama de ‘mito do desenvolvimento’.
Francisco de Assis Costa
Jornal Beira do Rio é uma publicação da Universidade Federal do Pará.
[EcoDebate, 05/08/2008]