O TAV e sua segurança operacional, artigo de Álvaro Rodrigues dos Santos
Percurso do Trem de Alta Velocidade Rio-São Paulo. Imagem: Wikipédia
[EcoDebate] Em seu traçado Rio – Campinas o TAV (Trem de Alta Velocidade) cortará formações geológicas e geomorfológicas com comportamentos geotécnicos extremamente problemáticos para a implantação de obras de engenharia, especialmente as viárias. Por outro lado, as condições e os critérios de segurança exigidos para a operação de um trem de alta velocidade (velocidades superiores a 300 Km/h) são radicais, e somente seu pleno atendimento poderá evitar a ocorrência de acidentes, que nessas condições operacionais seriam terríveis e fatais.
Do ponto de vista geológico e geotécnico esse nível de segurança somente será alcançado com a participação, em projeto e obra, de empresas de engenharia com experiência acumulada no enfrentamento dos problemas típicos das feições geológicas que serão atravessadas. Para tanto será indispensável que a comprovação dessa experiência conste explicitadamente do Edital de Licitação que está por ser lançado como exigência a ser obrigatoriamente atendida.
No trato dessa questão é importante considerar que financeiramente, com valor estimado em mais de 30 bilhões de reais, o primeiro TAV brasileiro é um dos empreendimentos hoje mais atraentes no âmbito internacional, pelo que vários grupos estrangeiros (asiáticos, europeus e americanos) estão se preparando para participar acirradamente da disputa licitatória que ora se inicia.
Declarações oficiais dão conta de que cuidados especiais serão tomados para que se garanta a absorção pelo país das tecnologias que serão aplicadas na implantação do empreendimento. No entanto, é justamente nesse específico aspecto tecnológico que os interesses estratégicos maiores do país podem ser preteridos. Se na superestrutura viária do TAV (equipamentos, componentes e sistemas operacionais) teremos a oportunidade de absorver novas tecnologias, na implantação da infraestrutura viária somos nós que temos muito, ou tudo, a oferecer.
Baia da Guanabara, Baixada Fluminense, Serra do Mar, Bacia Sedimentar de Taubaté (Vale do Paraíba), Bacia Sedimentar de São Paulo, Mar de Morros cristalinos dos trechos de planalto. Sobre todos esses domínios geológicos a engenharia brasileira, com o suporte da Engenharia Geotécnica e da Geologia de Engenharia nacionais, implantou nas últimas décadas um expressivo número de grandes obras viárias: Ponte Rio-Niterói, Metrô Rio, Rodovia dos Imigrantes, Rodovias Airton Senna e Carvalho Pinto, Metrô São Paulo, Rodovia dos Bandeirantes, Rodoanel de São Paulo, e vários outros destacados empreendimentos. Todas essas obras contaram com a aplicação do vasto know-how brasileiro acumulado, assim como, elas próprias, permitiram avançar ainda mais a excelência desse know-how, condição essencial para a mais correta definição das concepções de projeto e da tipologia de soluções de engenharia capazes de assegurar para o TAV o elevado nível de segurança geotécnica exigido.
Ou seja, não se trata de apenas proporcionar procedimentos de absorção tecnológica, trata-se de, estrategicamente, garantir a aplicação efetiva de tecnologia nacional já dominada. E essa aplicação só será possível via real participação em projeto e obra da empresa nacional e das instituições nacionais de pesquisa tecnológica.
Geól. Álvaro Rodrigues dos Santos
-Ex-Diretor de Planejamento e Gestão do IPT e Ex-Diretor da Divisão de Geologia
-Autor dos livros “Geologia de Engenharia: Conceitos, Método e Prática”, “A Grande Barreira da Serra do Mar”, “Cubatão” e “Diálogos Geológicos”
-Consultor em Geologia de Engenharia, Geotecnia e Meio Ambiente
EcoDebate, 30/08/2010
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