Política Nacional de Resíduos Sólidos: Uma lei que não pode ir para o lixo, artigo de José Oswaldo Cândido Júnior
[A Tarde] Depois de duas longas décadas de tramitação no Congresso – dos quais 19 anos somente na Câmara dos Deputados – o Senado finalmente aprovou, no início de julho, a lei que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) do País.
Para nós brasileiros, que ficamos chocados com a tragédia do Morro do Bumba, em Niterói, quando dezenas de pessoas morreram soterradas por um lixão, essa é uma grande vitória. Daqui a quatro anos, por exemplo, não poderá haver mais lixões no País.
A PNRS é um avanço institucional importante para nortear o tratamento e a gestão integrada do lixo, que é reconhecido pelo MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE como nosso maior problema ambiental. De fato, a produção de lixo alcança 156 mil toneladas por dia. Desse total, 50% vão para os chamados “lixões” ou tem destinação desconhecida, conforme estimativas das entidades de classe do setor. Em 2008, apenas 405 dos 5.564 municípios brasileiros faziam coleta seletiva de lixo.
Assessorei o senador César Borges na apresentação do parecer sobre a matéria e vi que aprovar a proposta neste primeiro semestre foi uma grande vitória do Senado, porque foi preciso superar a tramitação por quatro comissões combinadas ao ano de Copa e eleição.
Qualquer atraso seria fatal. Para contornar os obstáculos, a estratégia do senador, que já estava indicado relator pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), foi buscar apoio para fazer o processo legislativo de forma simultânea nas comissões.
Pelo esforço, o senador baiano foi indicado relator do tema em mais duas comissões. Ele próprio pediu audiência pública conjunta para debater o projeto com a sociedade e, logo depois, as comissões se reuniram para votação conjunta, aprovando as cinco mudanças propostas por ele. Eu testemunhei especial consenso entre empresários, organizações sociais, cooperativas de catadores e o governo federal de que era preciso aprovar aquela proposta. A própria ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, elogiou o trabalho do relator pela rapidez e precisão.
De fato, não era possível esperar mais. O setor de reciclagem no Brasil já movimenta R$ 12 bilhões ao ano, mesmo sem os incentivos e a segurança de um marco regulatório. O potencial de expansão é enorme, pois apenas 13% do lixo nas cidades são reciclados. Além disso, as estimativas hoje apontam para a existência de um milhão de catadores, que auferem um ganho médio de um salário mínimo e meio nas regiões Sudeste e Sul e de um salário mínimo no restante do País. Portanto, trata-se deumprojeto de largo alcance social e econômico.
O eixo da PNRS é o princípio da responsabilidade compartilhada, em que fabricantes, importadores,distribuidores,comerciantes, consumidores e poder público dividem tarefas com relação ao manejo sustentável dos resíduos. Para isto, Estado e município instituirão seus próprios planos de gestão dos resíduos sólidos, assim como determinados segmentos econômicos. A prioridade é a articulação entre as três esferas do poder público e destas com o setor empresarial, com o objetivo de encontrar soluções para a gestão dos resíduos.
Outra boa novidade da PNRS é a instituição da logística reversa, que inverte o trajeto que levou o produto até o consumidor. Assim, o produto com vida útil esgotada, como pilhas, baterias, pneus,óleos lubrificantes,lâmpadas e eletroeletrônicos terá que ser devolvido ao vendedor, que fará seu retorno aos distribuidores e daí aos fabricantes, para reciclagem.
A lei prevê que a logística reversa será, progressivamente, estendida a produtos comercializados em embalagens plásticas, metálicas ou de vidro.
O longo tempo para ser aprovada não envelheceu a PNRS, como disse o senador. A lei nasce moderna, baseada na premissa de que a deposição do resíduo no aterro deve ser a última opção de um processo antecedido pela não-geração de lixo, a redução da emissão, a reutilização, a reciclagem e a queima para geração de energia. A lei é ambiciosa, mas sabemos que o lixo das ruas só vai acabar se estivermos comprometidos em obedecer a PNRS. É nosso trabalho fazer com que esta lei não vá para o lixo.
José Oswaldo Cândido Júnior Economista do IPEA, doutor pela FGV e co-autor do livro Economia do Meio Ambiente
Artigo originalmente publicado no jornal A Tarde, BA.
EcoDebate, 27/07/2010
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Um certo bom senso afirma que a melhor forma de cuidar do lixo é recuperar e reciclar o máximo de materiais e incinerar o resto para gerar energia elétrica. Aparentemente faz sentido, parece ser uma idéia razoável. Mas só aparentemente.
Mesmo sendo apenas aparentemente razoável, a idéia de incinerar o “resto”, não resistiu ao lobby feito no Senado, na recente aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos que traz possibilidades de grandes avanços. O “resto”, e todo o mais podem agora ser incinerados. Não é um detalhe. É um pacote. Junto com a opção por esta ou aquela forma de cuidar e tratar do lixo chegam estes ou aqueles impactos sociais e ambientais.
Mas afinal de contas, quais são os problemas com a incineração? Um Deputado do Estado de São Paulo costuma dizer que Deus recicla e o Diabo incinera.Não se trata de discutir religião, mas de atentar que o Diabo mora nos detalhes.
Alguns argumentos apresentados abaixo são do Dr. Paul Connett, Profesor de Química e toxicologia ambiental da Universidad de St. Lawrence, facilmente acessível na Internet.
Costuma-se lembrar que em outros países a incineração é uma pratica popular e bem aceita. Não é bem assim. Nos Estados Unidos, Alemanha, Japão, França as tentativas de expansão desse sistema encontram forte resistência da população. Não é por acaso. O Japão, por exemplo, que tem muitos incineradores em operação é o maior emissor mundial de Dioxinas.
Mas o problema não são apenas as invisíveis Dioxinas, que lentamente vão se acumulando nas pessoas, animais e plantas. Há outros subprodutos formados durante a incineração cujos impactos sobre a saúde pública e o meio ambiente sequer são conhecidos.
Mas esqueçamos as dioxinas e os demais subprodutos. Para as emissões que são parcialmente conhecidas é preciso que existam regras específicas, monitoramento adequado e forte controle para que se cumpram essas regras. Nas precárias
condições de gestão dos resíduos dos municípios e da maioria dos estados
brasileiros, tão bem conhecidas, é bem provável que o controle rigoroso seja uma quimera.
Mas esqueçamos os prováveis problemas de monitoramento e controle. De um melhor controle das emissões dos gases decorre que mais metais pesados e dioxinas vão parar nas cinzas. Então, de três toneladas de lixo incinerado, criamos uma tonelada de cinzas perigosas, que devem ser destinadas a um aterro especial.
Mas esqueçamos que a incineração cria resíduos perigosos. Pode-se gerar energia elétrica a partir do lixo. Para um mundo sedento (e embriagado) de energia (a maior parte oriunda de recursos não renováveis e destinada a manter uma forma de vida insustentável), é uma proposta pra lá de sedutora. Mas há um engano aí. Gera-se bem pouca eletricidade. Se pode economizar em torno de
4 vezes mais energia reutilizando, reciclando ou compostando os mesmos materiais que seriam incinerados; como esses não retornam à cadeia produtiva, é preciso substituí-los pela extração de matérias primas, que consome energia e contribui para o aquecimento global.
Mas esqueçamos que há formas mais econômicas de se economizar energia. A implantação de incineração irá gerar postos de trabalho formais, preferencialmente para catadores. É verdade. Mas o número de empregos gerados pela recuperação de materiais face aos gerados pela incineração são mais de 600 vezes maiores nos Estados Unidos e tende a ser maior no Brasil, onde a mão de obra é significativamente mais barata e onde há um extenso setor informal já atuando nessas atividades.
No Brasil, trabalham aproximadamente 1 milhão de catadores e catadoras. A maioria desses trabalha de forma autônoma e o restante está inserido em cerca de 500 organizações. Hoje, aproximadamente 2% dos resíduos sólidos domiciliares são reciclados no Brasil, estamos apenas no início da expansão deste setor.
Podemos esquecer das dioxinas e outros subprodutos; dos problemas de monitoramento e controle; da produção de resíduos perigosos; de que há formas mais inteligentes de economizar energia; até mesmo de que a incineração irá fragilizar ainda mais a situação de 1 milhão de catadores e catadoras e de um segmento crescente de empreendimentos que transfomam o material reciclável em novos produtos. Só não podemos esquecer, nesse tempo de avanço da incineração no país, de nos posicionarmos, firmes, contra a incineração e a favor da coleta seletiva.
Tenho pesado em colaborar com o meio Ambiente de uma maneira pratica como dar palestra em escolas publicas, falta-me material, orientação apoio didático. A minha proposta seria uma prateleira colocada próxima ao local de maior movimentação de resíduos sólidos, onde as pessoas colocariam separados os tipos de material. A proposta inclui o lava e deixa-los secar.
Prezado,
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É o que podemos fazer para ajuda-lo.
Atencioamente,
Henrique Cortez
coordenador editorial do Portal Ecodebate
Vamos qualificar a discussão.
Este senhor é um imbecil, quer criar o caos ambiental no Brasil.
É preciso reciclar os ambientalistas e os políticos.
Veja o Cidades e Souções da Globo News.
Na Alemanha desde 2005 a Lei Proibe o sepultamento do lixo, esta lei foi aprovada com forte apoio do Partido Verde.
Esta discussão é séria, não haverá espaço para enterrar todo o lixo nos próximos 50 anos, solo e aquíferos seriam contaminados.
Quanto a dioxinas e furanos a tecnologia esta plenamente dominada, pirólise e gaseificação, combinado com mais de dois segundos acima dos 800 graus centígrados, como as temperaturas da segunda câmara de combustão são de 1200 graus, tudo bem.
Além disso o sistema de monitoramento é em tempo real, não há risco de falha sistemática.
Voltem para sala de aula.
Tenham a humildade de aprender, sejam racionais.
PELO AMOR DE DEUS.
Concordo Senhor Almeida. Vamos qualificar a discussão, a começar com respeito e a boa educação. O contraditório é saudável e agradeço pela oportunidade de continuar a refletir sobre essa questão. A gestão do lixo é tema complexo, envolve diferentes atores e interesses e não deve ficar circunscrita a “especialistas” e suas discussões bizantinas sobre limites de emissão.
Afinal são “especialistas” que freqüentaram salas de aula que nos tentaram fazer acreditar que “há cada vez mais evidências de que fumar tem… efeitos farmacológicos realmente benéficos para os fumantes “(Joseph F. Cullman III, presidente da Philip Morris Inc., 1962); ou que os “resíduos gasosos” dos automóveis “não representam problema algum de contaminação do ar”, (Ford Motor Company, 1953); Os efeitos da fumaça do cigarro, e das emissões dos automóveis, por exemplo, causam danos sistemáticos, geralmente irreversíveis e permanecem invisíveis aos sentidos.
Me coloco nessa discussão, senhor Almeida, não como um equipamento orgânico que pode, sem “risco de falha sistemática”, garantido por especialistas, acumular este ou aquele nível da emissão dessa ou daquela substância. Circulam pelo meu corpo, assim como no do senhor, mais de 500 substâncias antropogênicas. Muitos desses venenos foram emitidos em níveis que, em determinado momento, foram considerados “seguros”, em outros, “inaceitáveis”.
Os riscos se baseiam em interpretações e, nesse saber, podem ser transformados, ampliados, reduzidos, dramatizados ou minimizados. Na diretiva européia sobre incineração 2000/76/CE é dito assim, meio de passagem, que “a incineração de resíduos perigosos e não perigosos, podem dar origem à emissão de poluentes do ar, da água e do solo e ter efeitos adversos na saúde humana.(…)”. Se podem, senhor Almeida, escolho não correr o risco.
Não haverá espaço para enterrar o lixo nos próximos 50 anos, o senhor afirma. Ok! Mas o incinerador não desaparece com o lixo: “Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma; de quatro toneladas de lixo que entram no incinerador, sai uma tonelada de cinza e escória. 10% composta de metais pesados misturados à toda sorte de produtos químicos oriundos da incineração.
O lixo não desaparece e continua sendo necessário dispor o lixo que sobra. Trocar mais espaço por resíduos perigosos: não parece uma troca vantajosa; adia-se o problema, com o agravante de que foram produzidos resíduos muito perigosos. Alguns “especialistas” propõem usar a escória na construção civil.
A partir da década de 1970 cinzas de incineradores foram misturadas ao asfalto para construção de estradas; entretanto, passados 40 anos, testes preliminares realizados pela União Européia indicam que em razão do processo de lixiviação desencadeado pelas chuvas ao longo dos anos, os lençois freáticos, rio e manaciais proximos às estradas onde essas cinzas foram depositadas, podem estar sofrendo uma séria contaminação pelos derivados das cinzas. Nada se cria, nada se perde, tudo se transforma. Se podem, senhor Almeida, escolho não correr o risco.
Há ainda mais aspectos interessantes, detalhes importantes. O Diabo mora nos detalhes. O alto custo dos incineradores impõe um modelo de negócios no longo prazo, com contratos de concessão de pelo menos 20 anos de serviço para unidades que podem durar até 100 anos. Isto quer dizer que os incienradores devem, para serem financiadas corretamente a juros baixos, ter garantias do setor público de que serão alimentadas com resíduos secos por pelo menos 40 anos (tempo mínimo de operação de uma usina desse tipo).
O incinerador não admite, além do mais, grandes variações de abastecimento de resíduos, e deve ser constantemente alimentando por uma quantidade estipulada em seu projeto técnico. Isso quer dizer que as cidades que decidem implantar um incinerador, estão se comprometendo à não reciclar uma boa quantidade de resíduos secos por todo esse período (40 a 100 anos), para manter a demanda de abastecimento de resíduos das usinas incineradoras. Isso aconteceu recentemente na França que importou lixo seco da vizinha Alemanha, para manter em funcionamento alguns de seus incineradores. Programas de coleta seletiva, intensivos em mão de obra, são bem mais flexíveis. E baratos. E geram muito mais postos de trabalho.
O incinerador de ISSEANE, por exemplo, o mais moderno da França, foi implantado em 2007 e custou 500 milhões de euros (1,250 bilhão de reais); incinera 460 mil toneladas de lixo por ano, produzidas por 1 milhão de pessoas, com uma despesa anual de quase 100 milhões de Reais; o número de empregados diretos na usina não chegam a 100 pessoas. Programas de coleta seletiva geram centenas de vezes mais postos de trabalho. E não produz resíduos perigosos. E o dinheiro fica no país.
É isso aí. Pela Coleta seletiva, contra a incineração.