País engordou 22% nos últimos três anos e já se aproxima dos EUA
Brasil obeso – Especialistas creditam à má alimentação os índices tão robustos das duas nações
Poucas frutas e hortaliças, muita carne engordurada e refrigerante todos os dias. O novo cardápio do brasileiro, revelado pela pesquisa Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), do Ministério da Saúde, colocou o país no caminho da obesidade. A enquete, realizada no ano passado com 54.367 adultos das 26 capitais e do Distrito Federal, mostrou que quase metade da população está acima do peso saudável(1) e 13,9% já pode ser considerada obesa.
O estudo investigou os hábitos do brasileiro, que, além de consumir poucos alimentos saudáveis, não costuma praticar atividades físicas. A mistura elevou rapidamente o ponteiro da balança: em apenas três anos, o percentual de indivíduos com sobrepeso aumentou quase 10%, enquanto que o de obesos subiu 22% no mesmo período. Reportagem de Paloma Oliveto, no Correio Braziliense.
Para o endocrinologista Alfredo Halpern, da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso), os índices vão crescer ainda mais e se igualarão, em breve, aos dos Estados Unidos, onde um terço da população é obesa e a doença já é considerada uma epidemia. “Essa prevalência vai aumentar devido ao estilo de vida, ao estresse, à falta de sono, ao consumo de gorduras trans e até por causa do ar-condicionado”, diz Halpern, explicando que a falta de variação térmica é um dos fatores que levam ao acúmulo de gordura corporal.
Ele destaca, além disso, a influência negativa dos disruptores endócrinos, substâncias artificiais amplamente utilizadas — da agricultura às embalagens plásticas, como copos e filmes de micro-ondas — que promovem depósitos de gordura no organismo. Além disso, o médico acredita que as pessoas estão encarando o excesso de peso com despreocupação. “De repente, virou algo natural. Mas faz mal, mata”, alerta o médico.
Estilo de vida
A nutricionista Brigitte Olichon, professora de nutrição da Faculdade Arthur Sá Earp Neto (Fase), de Petrópolis, também associa o aumento de peso da população ao novo estilo de vida do brasileiro. “Temos cada vez maior presença da mulher no mercado de trabalho e longe dos afazeres domésticos, optando pela alimentação fácil, pronta e rápida”, observa.
A endocrinologista Thalita Bittar, do Departamento de Transtorno Alimentar da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, lembra que, além da facilidade com os alimentos prontos, a modernidade suprimiu o esforço físico. “Antes, as pessoas precisavam se levantar para mudar o canal da televisão, tinham de se movimentar para levantar o vidro do carro. Agora, tudo é automático”, diz.
Para Brigitte as pessoas sabem dos riscos, mas não querem abrir mão do que trazem como hábito familiar, ou daquilo que lhes dá prazer, muitas vezes do que pode ser uma demonstração de status social. Ela cita, por exemplo, o consumo excessivo de carne gordurosa, um alimento que, até pouco tempo, não estava acessível para boa parte da população. “Comer carne era um luxo reservado à classe mais abastada. Com a melhoria na renda da população mais pobre, um dos primeiros alimentos que entram no cardápio dessas famílias é a carne, por uma questão emocional e social (status). As pessoas mais jovens associam, também, o consumo de carnes gordas a uma melhoria na saciedade. E não construíram o hábito de comer frutas e hortaliças na infância”, observa.
O consumo desse tipo de alimento está em baixa entre os brasileiros. O Vigitel revelou que somente 30% da população tem o hábito de incluir frutas e hortaliças no cardápio cinco ou mais vezes por semana. Para a professora da Fase, o dado é preocupante. “A Organização Mundial de Saúde preconiza consumo de cinco porções diárias (cerca de 400 g) desses alimentos para diminuir os riscos de doenças crônicas, incluindo aí a obesidade. Isso porque os estudos mostram que o baixo consumo de frutas e hortaliças está entre os dez principais fatores de risco associados à ocorrência dessas doenças”, alerta.
Mera aparência
A nutricionista lembra que, longe de estar bem alimentado, o brasileiro acaba sofrendo com a falta de nutrientes, mesmo acima do peso. “O sobrepeso/obesidade é um excesso na ingestão de macronutrientes, importantes para energia, saúde do sistema nervoso e construção dos tecidos. Mas muitas vezes não vem acompanhada de uma ingestão equivalente de micronutrientes, presentes nas frutas e hortaliças. É o que alguns pesquisadores chamam de ‘fome oculta’, deficiência que é silenciosa e leva ao mau funcionamento do organismo, culminando nas doenças crônicas. Uma alimentação saudável está equilibrada em três pontos: macronutrientes (carboidratos, proteínas e gorduras), micronutrientes (vitaminas e minerais) e água”, ensina Brigitte.
Medida certa
Para saber se uma pessoa está dentro da faixa de peso saudável, os médicos baseiam-se no índice de massa corporal, medida que resulta na divisão do peso pela altura elevada ao quadrado. O IMC abaixo de 18,5 significa estar abaixo do peso ideal, que se situa entre 18,5 e 24,9. De 25 a 29,9, a pessoa está com sobrepeso e, a partir de 30, pode ser considerada obesa.
143kg de problemas
Desde os 9 anos, Hadija Dawd Ibrahim, 43, luta contra a balança. Descendente de árabes, sempre foi acostumada à mesa farta, composta por legumes e verduras, mas também por muita gordura. Em setembro do ano passado, Hadija, que mede 1,60m, atingiu os 143kg. Mesmo acompanhada por uma endocrinologista e por uma nutricionista, não conseguia emagrecer.
Ela admite que sofre de compulsão alimentar, e que não vivia sem pão, margarina e cachorro-quente, entre outras guloseimas. “Minha mãe dizia que eu não passava margarina no pão, mas pão na margarina. E que não colocava açúcar no café, mas café no açúcar”, brinca.
Com hipertensão, varizes e um inchaço nas pernas que a impediam de andar os 2km que separam sua casa, na área rural de Sobradinho, da parada de ônibus, Hadija começou a achar que iria morrer. “Pensei que não fosse chegar aos 43 anos”, diz. Estimulada por uma amiga, passou a frequentar as reuniões do Resultado Positivo, um método de reeducação alimentar, que não proíbe nenhum alimento, mas adapta as quantidades e equilibra o consumo dos grupos alimentares.
Inatividade
Desde setembro, ela já perdeu 35kg. Com o emagrecimento, Hadija não precisou mais tomar os remédios para a pressão, que está controlada. Ainda faltam mais 35kg. “Sei que vai demorar, mas vou conseguir”, garante.
Além de gerar problemas de saúde, a obesidade prejudica a economia do país. “Um país muito obeso vai ter altos gastos de saúde pública e de previdência, o que já está acontecendo nos Estados Unidos. Temos obrigação de olhar para o que está acontecendo e aprender com a dificuldade dos outros. Ainda temos oportunidade de dar um passo adiante”, observa a endocrinologista Thalita Bittar.
“A obesidade e as doenças decorrentes dela deixam parte da população economicamente inativa e de alto custo para a saúde. Em termos de política pública, está no momento de se fazer um projeto de prevenção muito sério e efetivo”, acredita. (PO)
EcoDebate, 06/07/2010
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Mais uma colonização cultural para nossa História!
É fácil perceber nos EUA os problemas oriundos do seu estilo de vida.
Porém, ainda não aprendemos com os nossos erros, o que dirá com os dos outros.