Os segredos da economia azul. Entrevista com Gunter Pauli
“Fazer a barba acariciados pela suavidade de uma seda mais resistente do que o aço. Almoçar fungos superproteicos nascidos nos restos das plantações de café. Dormir em uma casa construída com o controle inteligente da temperatura e da umidade que os cupins desenvolveram ao longo de milhões de anos“.
Gunter Pauli (foto), o fundador da Zeri (Zero Emission Research and Initiatives), faz suas provocações com o ar divertido de quem sabe que causa admiração e com a segurança de quem pode colocar sobre a mesa projetos industriais. Da escola de Aurelio Peccei e do Clube de Roma, assumiu a radicalidade das propostas; da cultura centro-europeia, a atenção aos negócios: o mondo que ele descreve viaja suspenso entre a concretude das primeiras patentes e a sugestão de potencialidades ainda não aplicadas.
A reportagem é de Antonio Cianciullo, publicada no jornal La Repubblica, 03-06-2010. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Nos próximos meses, será publicado na Itália, pelas Edições Ambiente, o seu último livro, “La blue economy. Dieci anni, cento innovazioni, cento milioni di posti di lavoro” [A economia azul. Dez anos, centenas de inovações, centenas de milhões de postos de trabalho].
Que diferença existe entre a economia verde e a economia azul?
A economia verde é o hoje: é o conjunto de tecnologias quase largamente disponíveis e imediatamente convenientes. Alguns falam sobre ela no futuro, porque vivem em uma cultura velha, feita de balanços maquiados e de produções em liquidação, com os custos reais escondidos debaixo do tapete. Depois, chegam Chernobyl e o acidente da plataforma no Golfo do México, e todos entendem qual é o verdadeiro balanço das escolhas baseadas na energia nuclear e no petróleo. Portanto, a economia verde é uma possibilidade real, mas não é suficiente, não resolve os verdadeiros problemas.
Qual é o segredo da economia azul?
O verde expressa a vitalidade das terras emersas, um terço do globo. O azul é a cor do mar e é a cor do planeta visto do alto. O azul é o todo. Traduzido em termos industriais, quer dizer voltar-se à eficiência da natureza, eliminar completamente os dejetos. O ciclo linear de produção, com as mineradoras de um lado e os aterros de outro, produz desperdícios quase insustentáveis. Usamos as leis da física, da química, da biologia para inventar novos processos que eliminem a poluição e se transformem também em um bom negócio.
Uma bela teoria. E a prática?
Esse livro nasce de uma lista de 340 tecnologias inovadoras. Grupos de especialistas as analisaram durante um ano, selecionando 100 inovações consideradas realizáveis. Sobre estas, pode-se trabalhar de maneira concreta.
Dê-nos alguns exemplos.
Quando bebemos um café, utilizamos só 0,2% da biomassa das plantas usadas. Os materiais descartados podem servir para fazer com que cresçam fungos de grande qualidade: uma reconversão das plantações de café em 45 países criaria 50 milhões de postos de trabalho. Processos semelhantes podem ser idealizados para o açúcar de cana, que atualmente só se utiliza 17% do seu potencial, e para as árvores que são transformadas em papel, com um desperdício de 70%. O velho trabalho que produz mais dejetos do que objetos úteis deve ser substituído por uma biorrefinaria capaz, por exemplo, de extrair da celulose todos os componentes, da lignina aos lipídios: desse modo, podem-se substituir os polímeros derivados do petróleo.
Mas fazer a barba com seda parece um pouco difícil…
As potencialidades nesse campo são enormes. Basta pensar que centenas de espécies produzem seda, e só uma foi domesticada. A baba produzida por uma aranha tem a resistência e uma flexibilidade superiores ao do aço: para os materiais dos coletes à prova de balas, esses conhecimentos já foram utilizados. Pode-se abrir um novo campo de aplicação com as lâminas de barbear: significaria economizar a cada ano 10 bilhões de navalhas descartáveis, 250 mil toneladas de aço.
Muitos procuraram imitar a natureza, mas poucos conseguiram.
Mas esse é o caminho. Devemos aprender com as baleias a como utilizar a energia para mover centenas de litros de sangue em milhões de quilômetros de artérias e veias. Com os atuns, a como conservar o calor. Com as larvas da farinha, a como produzir anticongelantes de modo natural. Com os besouros dos desertos africanos, a como coletar a água das chuvas. A zebra reduz a temperatura da pele graças ao jogo do branco e do preto, que cria microcorrentes de ar: um refrescamento completamente gratuito que podemos imitar nas casas e nas cidades.
Alguma coisa já foi realizada?
Na Alemanha, o Instituto Fraunhofer desenvolveu um método para aproveitar a eletricidade que deriva do calor do corpo: a diferença entre a temperatura do nosso corpo e a do ambiente ao redor, mais quente ou mais frio, é suficiente para produzir eletricidade. Quando os novos sistemas forem melhorados, bastará uma diferença de 0,3 graus para gerar a energia suficiente para fazer um celular funcionar.
(Ecodebate, 08/06/2010) publicado pelo IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação.
[IHU On-line é publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]
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