Cerca de 50 milhões de pessoas a mais passaram fome em 2007. Número de famintos aumentou por causa da alta dos preços dos alimentos
Roma, Bruxelas, Brasília, 3 de julho de 2008 – Cerca de 50 milhões de pessoas aumentaram em 2007 a lista da população que sofre de fome, como resultado da alta dos preços do alimentos, disse ontem o Diretor-Geral da FAO, Jacques Diouf, durante conferência no Parlamento Europeu, em Bruxelas. Da FAO Brasil, 03/07/2008.
“Os países pobres estão sentindo o forte impacto da alta dos preços dos alimentos e da energia”, disse Diouf. “Necessitamos com urgência de novas e fortes parcerias para enfrentar o crescimento dos problemas de segurança alimentar nesses países. Nenhuma instituição ou país conseguirá resolver essa crise isoladamente. Países doadores, instituições internacionais, governos dos países desenvolvidos, sociedade civil e o setor privado têm papel importante na luta global contra a fome.”
Diouf afirmou que a crise atual é uma combinação do aumento da demanda por produtos agrícolas devido ao crescimento da população e o desenvolvimento econômico nos países emergentes; da rápida expansão dos biocombustíveis; e da oferta insuficiente, devido às mudanças climáticas que afetaram a produção, particularmente secas e inundações, num momento em que os estoques de cereais, cerca de 409 milhões de toneladas, estão no menor nível dos últimos 30 anos.
Esses fatores são exacerbados, ainda, por medidas restritivas tomadas por alguns países exportadores para proteger seus consumidores e pela especulação nos mercados futuros.
Os altos preços dos insumos agrícolas são grandes obstáculos ao aumento da produção nos países em desenvolvimento. De janeiro de 2007 a abril de 2008, os preços dos fertilizantes em particular subiram muito mais rapidamente do que os preços dos alimentos.
Desafios futuros
Para reduzir o número de subnutridos no mundo e satisfazer as demandas crescentes, a produção global de alimentos precisa dobrar até 2050. Esse aumento de produção deve ocorrer principalmente nos países em desenvolvimento, onde vivem as populações pobres e famintas, e onde deve acontecer mais de 95% do aumento populacional previsto. Seus agricultores vão precisar de acesso a insumos modernos, instalações para armazenagem e infra-estrutura rural.
A agricultura mundial também terá grandes desafios, como o controle da água e das mudanças climáticas. Mais de 1.2 bilhão de pessoas vivem hoje em bacias hidrográficas com absoluta falta de água e a tendência de aumento da escassez de água é preocupante, mas a África Subsaariana está utilizando apenas 4% de seus recursos hídricos renováveis. O mundo também está perdendo cerca de 5 a 10 milhões de hectares de terra agrícola todos os anos devido à grande degradação dos solos, mas na África, América Latina e Ásia Central há um grande potencial para a expansão de terras cultiváveis.
“Governos e agricultores também terão que lidar com o fardo das mudanças climáticas na agricultura. Se as temperaturas subirem mais de três graus, plantações de grãos como o milho devem diminuir entre 20 e 40% em partes da África, Ásia e América Latina”, disse Diouf. E ainda, secas e inundações poderão se intensificar e causar grandes perdas de grãos e pecuária.
Investindo na agricultura
“A situação atual é resultado da negligência de longo tempo da comunidade internacional na agricultura dos países em desenvolvimento”, acrescentou Diouf. “A participação da agricultura na ajuda oficial ao desenvolvimento diminuiu de 17% em 1980 para apenas 3% em 2006. O investimento em pesquisa agrícola nos países em desenvolvimento é menor que 0.6% do seu Produto Interno Bruto, comparado com mais de 5% nos países desenvolvidos.”
O aumento da produção agrícola nos países em desenvolvimento só será alcançado com maior investimento público e privado. “A FAO estima que o incremento em investimento público deve ser de cerca de US$24 bilhões todos os anos – isso inclui novos recursos para o manejo de água, estradas rurais, instalações para armazenagem, assim como pesquisa e extensão,” afirmou Diouf.
“As promessas de doação feitas recentemente na Cúpula de Alimentação da FAO, de cerca de US$20 bilhões, indicam fortemente que a comunidade internacional está comprometida a agir em apoio às comunidades agrícolas dos países pobres”, acrescentou.
Apoiar os agricultores nos países em desenvolvimento, com o fornecimento de sementes e fertilizantes, deve ser uma prioridade no sentido de aumentar a produção agrícola nos países mais pobres. A produção de cereais nos países de baixa renda e com deficiência alimentar, com exceção da China e da Índia, diminuiu 2.2% em 2007, particularmente na África, e deve baixar ainda mais em 2008, já que os agricultores pobres não estão conseguindo pagar por insumos adequados com preços cada vez mais elevados.
“A FAO está atualmente envolvida em 35 países, apoiando a produção de alimentos com o fornecimento de sementes melhoradas, fertilizantes e outros insumos agrícolas essenciais para a temporada de plantio de verão e espera trabalhar em muitos outros países nas próximas semanas”, afirmou Diouf. A FAO aprovou recentemente projetos em seu Programa de Cooperação Técnica num total de US$23,7 milhões para iniciar o apoio à produção em 54 países pobres.
Diouf afirmou ainda que também deveria ser dada prioridade ao apoio financeiro aos países com deficiência alimentar, cujas contas de importação de alimentos subiram cerca de 37% em 2007 e devem aumentar mais 56% em 2008. São hoje quatro vezes maiores do que em 2000.
“Em médio e longo prazos, o foco deverá ser no aumento de investimento na agricultura, tanto público como privado, para melhorar as infra-estruturas rurais e permitir que pequenos produtores se beneficiem das oportunidades de mercado. Medidas que devem ser acompanhados por um reforço da capacidade institucional para assegurar a sustentabilidade do desenvolvimento agrícola”, salientou Diouf.