Inambari, a polêmica hidrelétrica brasileira, provoca violentos protestos no Peru
[EcoDebate] O Brasil vive atualmente um impressionante “boom” de hidrelétricas. Na Amazônia temos as duas do rio Madeira, Belo Monte no Xingu e o complexo hidrelétrico do Tapajós com cinco hidrelétricas que irão a leilão ainda esse ano. E também temos as hidrelétricas de Estreito, Serra Quebrada, Tupiratins, Marabá no rio Tocantins, fora outras que serão construídas no sul do país mostrando que essa onda de hidrelétricas não é um privilegio somente da Amazônia brasileira.
O fato é que grande parte dessas obras afeta diretamente vários povos indígenas do sul ao norte do país. Tampouco essa onda se restringe aos limites de nosso país. O Brasil também está exportando suas megas hidrelétricas aos países vizinhos, como o Peru.
Desde novembro de 2006 que Peru e Brasil vêm iniciando um entendimento para uma integração energética entre os dois países. Acordo que prevê a construção de seis hidrelétricas na Amazônia peruana: Inambari com 2.000 mw, Sumabeni com 1.074 mw, Paquitzapango com 2.000 mw, Urubamba com 950 mw, Vizcatán com 750 mw e Chuquipampa com 800 mw. As seis hidrelétricas gerarão mais de sete mil mw a partir do início de seus funcionamentos em 2015. O Brasil promove e financiará essas obras com a pretensão de comprar 80 % dessa produção.
Mas o número de hidrelétricas não ficará em apenas seis, ambos os governos falam de um total de 15 hidrelétricas a serem construídas com tecnologia brasileira para atender o mercado brasileiro. De acordo com o ministro de Minas e Energia do Brasil, Edison Lobão, esta produção poderia atingir 20 mil mw.
O Acordo para o Fornecimento de Eletricidade ao Peru e Exportação de Excedentes ao Brasil que durará 30 anos já está pronto e prestes a ser assinado.
Inambari será a primeira dessas seis hidrelétricas já previstas. Um projeto econômico e energeticamente ambicioso. Até hoje a Amazônia peruana nunca tinha visto nenhuma obra desta dimensão. Inambari será a maior hidrelétrica do Peru, a quinta da América do Sul, e com seus 41 mil ha de área de inundação formaria o segundo maior lago do país, só perdendo para o próprio lago Titicaca.
Seus dois mil mw representam hoje a metade de toda a demanda energética atual do Peru e o Brasil ficará com 80 % dessa energia. Para levar a energia até o Brasil construirão 1.500 km de linhas elétricas de transmissão, que conectará as redes elétricas de ambos os países. Inambari custará quatro bilhões de dólares, demorará cinco anos e será feita por um consórcio integrado pelas brasileiras OAS, Electrobras e Furnas que investirão quatro bilhões de dólares na sua construção. Grande parte desses recursos será fornecido pelo BNDES.
Com o início de suas obras previsto para o final deste ano Inambari inundará 27 centros povoados peruanos, deslocará 3.500 pessoas e afetará 4.600 moradores indiretamente.
Localizada a 300 km da fronteira com o Brasil, nos limites dos departamentos peruanos de Puno, Cusco e Madre de Dios, Inambari também represará água para promover um maior aproveitamento das hidrelétricas de Jirau e Santo Antonio, no rio Madeira, durante as épocas de estiagem.
Protestos
Nos últimos dia 4 e 5 de março os moradores dos 27 centros povoados afetados pela hidrelétrica promoveram um protesto de 48 horas na cidade de Puno. Mais de 1.800 moradores participaram e houve bloqueio das principais ruas que dão acesso a cidade. O comércio foi fechado e vários trabalhadores e donos de transportes públicos juntaram-se a paralisação.
Durante as manifestações milhares de pessoas gritaram durante horas “não a central hidrelétrica de Inambari”. Afirmam que Puno não quer essa hidrelétrica e questionam o Governo que negocia as escondidas com o Brasil sem consultar a região, afirmando que não vão permitir isso.
Houve enfrentamentos com os policiais e a prisão de três líderes do movimento, o que provocou um ataque dos manifestantes e alunos da Universidad Nacional del Altiplano (UNA). Os estudantes atacaram a delegacia com pedras e a polícia respondeu com gases lacrimogêneos. Atacaram também a sede do Governo estadual de Puno onde fica a Seguridade do Estado quebrando suas janelas.
O projeto de construção da hidrelétrica é rejeitado por mais de 60 organizações sociais andinas que sinalizam que em breve vão fazer uma marcha até a cidade de Lima, capital do país. Na região Amazônica mais de 30 comunidades nativas pertencentes a Federação Nativa de Madre de Dios – FENAMAD rejeitaram também a hidrelétrica através de um comunicado oficial.
Expertos sinalizam que o custo ambiental e social será muito alto. O colégio de engenheiros do Peru declarou que o seu país consumirá muito pouco da energia produzida, mas ficará com todos os impactos sociais e ambientais. Em fevereiro deste ano também um grupo de organizações da sociedade civil peruana e universidades assinaram um termo com questionamentos e recomendações ao projeto de integração energética que ambos os países estão prestes a assinar.
O Peru vem de uma série de conflitos sociais violentos por causa da agressiva política do atual presidente Alan García em conceder para a exploração os recursos amazônicos sem consultar os seus moradores indígenas. Em 5 de junho de 2009, a menos de 1 anos atrás, os indígenas amazônicos peruanos em protesto contra essa política de Governo que pretendia facilitar o acesso a suas terras para plantações de biocombustíveis entraram em violentos confrontos com a polícia. O resultado foi um saldo de 33 mortos, sendo 23 policiais, 5 civis e 5 indígenas. Uma tragédia que sacudiu o país. Tudo parece que novos confrontos estão sendo gerados no Peru e desta vez nós brasileiros poderemos estar diretamente envolvidos.
Por Hilton S. Nascimento e Helena Ladeira
Colaboração de Helena Azanha, CTI – Centro de Trabalho Indigenista, para o EcoDebate, 11/03/2010
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