Brasil paga para cuidar de um sistema carcerário falido, critica relator de CPI
O relatório final a ser apresentado pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Sistema Carcerário na próxima terça-feira (24) revela que 80 % dos presos brasileiros não estudam ou trabalham. A CPI foi criada pela Câmara dos Deputados no ano passado para avaliar as condições dos presídios do país. Por Paula Laboissière, da Agência Brasil.
O resultado, segundo o relator da CPI, deputado federal Domingos Dutra (PT-MA), é que o detento cumpre a pena prevista e, quando recebe liberdade, volta a cometer novos delitos. “Sai mais velho, analfabeto, sem qualificação e ainda com o atestado de preso.”
Para Dutra, o conceito de que uma pessoa que comete um delito deve ser sempre punida com cadeia é “equivocado”. A responsabilidade do Estado, segundo ele, deve ser a de recuperar o detento, já que o país não conta com sentenças de prisão perpétua ou de pena de morte.
“Todo aquele que comete um delito é condenado e é recolhido a um estabelecimento penal. Um dia, ele irá sair e, se sair pior do que entrou, quem irá pagar a conta somos nós, com novos crimes e novas vítimas. Pagamos com patrimônios roubados, com impostos desviados de outros setores, para cuidar de um sistema carcerário falido”, avaliou.
O relator defende que sejam responsabilizados pela situação das prisões brasileiras os diretores de presídios, secretários, juízes de execução e outras autoridades, mas lembra que alguns membros da CPI divergem por acreditarem que a responsabilidade maior pertence aos estados. Até a próxima terça-feira, ele acredita que os parlamentares devam chegar a um acordo.
“Fiz um trabalho, ao longo desses oito meses, com a maior ponderação e prudência, mas não posso dar meia volta e nem fazer jeitinho para proteger esse ou aquele governador. Tenho dados que envolvem governadores do PT, de estados que são governados pelo PMDB e pelo PSDB”, disse.
O deputado ressalta que a proposta de analisar e investigar o sistema carcerário brasileiro reflete “preocupação” não apenas com os detentos, mas também com quem está fora dos presídios e pode se tornar vítima dos delitos cometidos por “feras humanas”.
“Uma pessoa que é presa, às vezes, porque roubou um rádio de pilha ou duas latas de leite, é colocada na cadeia e quando sai dali – barbarizada, torturada e vivendo como animal – já sai como soldado do crime organizado. Porque o Estado faliu na sua missão de recuperar aquele que ele puniu.”
Essa falha, segundo o parlemnetar, pode ser constatada ao se analisar os índices de presos que não trabalham e que não estudam, da deficiência verificada na assistência jurídica e das condições “desumanas” registradas em presídios e em estabelecimentos penais.
“Esperamos construir um acordo de tal forma que a gente contribua não só com quem está preso e praticou o crime, mas também que melhore a segurança pública do Brasil.”
Relator da CPI do Sistema Carcerário qualifica presídios como “verdadeiro inferno”
A melhor definição que qualifica o sistema carcerário brasileiro é a de um “verdadeiro inferno”. A avaliação é do deputado federal Domingos Dutra (PT-MA), relator da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Sistema Carcerário.
Às vésperas de entregar o relatório final da investigação – resultado de oito meses de visitas a presídios de vários estados do país –, ele relata que a situação encontrada reflete um “caos absoluto”, provocado, sobretudo, pela superlotação de celas.
Segundo o parlamentar, os casos mais graves foram registrados nos estados da Bahia, do Pará, do Rio Grande do Sul, de Rondônia e de Mato Grosso do Sul.
Um dos casos que será destacado no relatório é o de uma colônia agrícola em Mato Grosso do Sul. O local, projetado para abrigar 80 presos, registrava um total de 680 detentos. E, segundo o deputado, cerca de 60 deles dormiam junto com porcos.
No distrito de Contagem (MG), foi encontrada uma cela construída para 12 presos, mas que abriga um total de 70. Os detentos, segundo o deputado, se revezam para dormir à noite e usam um sanitário impróprio.
Já no estado do Ceará, o deputado afirma que a comida é servida aos presos, muitas vezes, em sacos plásticos, sem nenhum tipo de talher.
No Presídio Lemos de Brito, em Salvador, a CPI encontrou um comércio alternativo também provocado pela superlotação. Ovos e cebolas, segundo Dutra, são vendidos pelo valor superfaturado de R$ 0,50 a unidade.
O deputado relata que, no estado do Rio de Janeiro, os presos são separados de acordo com a facção criminosa a que pertencem. Cada presídio e cada delegacia fluminense, de acordo com o relator, é comandado por facções como o Terceiro Comando, o Comando Vermelho, o Amigo dos Amigos (ADA) ou o Inimigo dos Inimigos (IDI).
“Esse é o retrato da situação de 440 mil presos que existem no Brasil, sendo que, para manter cada preso, gasta-se por mês de R$ 1,3 mil a R$ 1,5 mil. Esse valor é injustificável, a quase absoluta totalidade dos presos que nada fazem.”