Desastres naturais: Amostras de hoje indicam o futuro, artigo de Maurício Gomide Martins
Porto Príncipe (Haiti) – O tremor sentido, em 20/01, na capital do Haiti, que teve o seu epicentro ao sul do país, causou a queda dos escombros no o bairro de Bel Air, região central da capital, uma das áreas mais atingidas na semana passada. A população revira os escombros atrás de objetos que possam ser vendidos Foto: Marcello Casal Jr/ABr
[EcoDebate] As recentes tragédias em Angra dos Reis e Haiti são apenas exemplos episódicos da evidência de que o rumo desta civilização é equivocado. Indica também a força orquestrada da mídia em geral. Outras ocorrências naturais em locais diferentes, com conseqüências e significados importantes, passam sem que o mundo tome conhecimento pelo simples fato de que, no critério da mídia, é melhor ignorá-los. No Haiti mesmo temos a prova disso. Se o epicentro do tremor ocorreu a 15 km de Porto Príncipe, é claro que houve grande devastação no círculo territorial que abrange essa distância. No entanto, só cuidam da tragédia da capital; as desgraças das cidades das cercanias são ignoradas.
Em Angra, fica escancarada a reação natural à ocupação humana desrespeitosa aos espaços geográficos moldados pela natureza. No Haiti, a maior tragédia é a miserabilidade do povo, numa demonstração do quanto é injusta a sociedade organizada em bases econômicas em que se privilegiam as riquezas individuais. Antes da catástrofe, havia 380.000 órfãos no país, para uma população feminina de 4 milhões. Isso equivale a quase 10% de orfandade, o que constitui um indicador bastante expressivo da degenerescência social. E o país tem pujança de natalidade. Após o terremoto, ainda não se sabe a quantidade de crianças sem referencial de vida. Devemos enxergar e aprender, naqueles acontecimentos, que diversos procedimentos da humanidade se chocam contra os interesses da Natureza.
Quanto a Angra, os desabamentos das encostas constituem apenas uma reação natural do solo à degradação de suas bases, onde se impõem as reações baseadas nas leis físicas, de conhecimento dos homens. O terremoto antilhano, por si já uma desgraça, fica sumamente agravado pela existência de uma sociedade impulsionadora de mais miséria, representada por analfabetismo generalizado; crenças religiosas obtusas; desflorestamento intensivo; exploração política, policial e econômica; alta taxa de fertilidade; ausência de infra-estrutura.
O Haiti tem um histórico para país miserável por conseqüência de diversos fatores criminosos perpetrados pela exploração econômica irracional e desumana. No princípio, mataram os índios que ali viviam e os substituíram pelos negros escravizados em África, ocupando-os nas atividades da cana de açúcar em benefício dos patrões franceses. Depois destes, os americanos sugaram tudo o que havia ali de recursos naturais e abandonaram o local. O poder político-policial-econômico foi apossado por pequeno grupo de mulatos que se locupletaram, sendo Papa Doc o mais expressivo desses carrascos. Resumo: a miserabilidade do Haiti é o resultado da atividade puramente econômica, sem qualquer motivação de caráter social. Isso reduz a zero a capacidade de ele se reerguer.
Por que essas ações e reações? As ações humanas apenas ajudam e antecipam ou agravam as reações naturais. Isso nos dá uma lição simples: as forças naturais são tão poderosas que, quando molestadas ou feridas, tecnologia nenhuma lhes barra o caminho. Ademais, põe em evidência o fato de que o planeta tem vida própria, como já afirmara James Lovelock, isto é, sua existência cósmica é dinâmica. Tem o poder de reagir, da forma que lhe convém, às ações humanas que a molestem. E, nesse caso, o bom senso indica que Gaia deve ser bem tratada, cuidada, zelada, com ternura e delicadeza.
Os povos antigos já tinham esse respeito, motivo por que procuravam tratá-la com o máximo carinho, chegando mesmo a lhe oferecer seus sacrifícios. E nós, homens modernos? Não podemos, nessa emergência, oferecer-lhe nossos sacrifícios também, representados pela renúncia aos confortos tecnológicos iníquos e reformulação de nossa estrutura social, ora construída na base do egoísmo, injustiça e ganância desmedida?
Dirão alguns que terremotos são ações naturais e não reações. Concordamos. Mas tais eventos são agravados pelos fatores negativos apontados acima, principalmente pela existência de quantidade excessiva da população e suas ações predadoras. Essas ocorrências são localizadas e constituem uma amostra insignificante do que vai acontecer à biodiversidade se o sistema exploratório continuar a depredar o planeta.
No caso de Ilha Grande, situada no município de Angra dos Reis, lição importante é a de que estamos ocupando espaço desnecessário, apenas para fins de turismo. E que fique bem claro que turismo é uma forma de consumismo. Dilapidador, portanto, do nosso meio ambiente. Esse ramal consumista, que atende aos interesses econômicos, ajuda a solapar a integridade geológica do ambiente. Tal atividade vem sendo incentivada por todos os meios, ocasionando em ritmo crescente o agravamento dos seus malefícios ao meio ambiente.
Aos céticos, fica o aviso da Natureza, além dos outros sinais concretos já do conhecimento geral.
“Maurício Gomide Martins, 82 anos, ambientalista, residente em Belo Horizonte(MG), depois de aposentado como auditor do Banco do Brasil, já escreveu três livros. Um de crônicas chamado “Crônicas Ezkizitaz”, onde perfila questões diversas sob uma óptica filosófica. O outro, intitulado “Nas Pegadas da Vida”, é um ensaio que constrói uma conjectura sobre a identidade da Vida. E o último, chamado “Agora ou Nunca Mais”, sob o gênero “romance de tese”, onde aborda a questão ambiental sob uma visão extremamente real e indica o único caminho a seguir para a salvação da humanidade.
* Colaboração de Maurício Gomide Martins para o EcoDebate, 27/01/2010
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