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Notícia

Governo cede aos militares e deve alterar proposta da Comissão da Verdade no Programa Nacional Direitos Humanos

Ministro Paulo Vannuchi diz que Comissão da Verdade não é contra as Forças Armadas. OAB critica Jobim por reagir à criação de comissão para investigar ditadura militar.

Quando retornar das férias, no dia 11 de janeiro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva determinará que sejam feitos ajustes no texto do Programa Nacional de Direitos Humanos. Informado de que o texto divulgado não representava um consenso de todas as áreas do governo e havia sido contestado pelos setores militares, Lula mandou informar aos comandantes militares que pedirá para que o texto seja alterado.

O principal ponto de discordância dos militares é quanto à abrangência da ação da futura Comissão Nacional da Verdade, a ser criada em projeto do governo que será enviado ao Congresso Nacional. Os militares interpretaram o texto do programa como uma forma de limitar a atuação desta comissão aos fatos e personagens envolvidos apenas na repressão militar durante o período da ditadura de 1964 a 1985.

Os militares querem incluir todos os envolvidos nos “conflitos políticos” daquela época. Na área militar, teme-se que o trabalho da comissão e o próprio projeto a ser mandado ao Congresso alterem a Lei de Anistia, de forma a punir ex-integrantes do regime acusados de tortura. Eles querem que essa atuação fique restrita à “recurepação histórica”, e não a reparações.

O ponto de vista dos militares foi levado ao presidente Lula pelo ministro da Defesa, Nélson Jobim, logo após a solenidade em que Lula e boa parte do Ministério lançaram o novo Programa Nacional de Direitos Humanos. Jobim, segundo militares que acompanharam o episódio, estava disposto a sair do governo, mas foi informado pelo presidente que a divulgação do texto não passara de um mal entendido.

“O PNDH-3 [o terceiro Programa Nacional Direitos Humanos] dá um importante passo no sentido de criar uma Comissão Nacional da Verdade, com a tarefa de promover esclarecimento público das violações de Direitos Humanos por agentes do Estado na repressão aos opositores”, diz o texto apresentado pelo governo na semana passada.

Segundo o Programa Nacional de Direitos Humanos, a Comissão da Verdade terá as seguintes funções: requisitar documentos públicos e privados; reconstituir a história dos casos de violação de direitos humanos e dar assistência às vítimas; localizar e identificar corpos e restos mortais de desaparecidos políticos; tornar públicas as estruturas utilizadas para a prática de violações durante a ditadura; e esclarecer as circunstâncias de torturas, mortes e desaparecimentos.

Ministro Paulo Vannuchi diz que Comissão da Verdade não é contra as Forças Armadas

O ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, disse que a criação da Comissão da Verdade não é um ato contra as Forças Armadas. Ao defender a apuração de fatos ocorridos no período da ditadura militar, Vannuchi argumentou que não há motivos para divergências entre a área de direitos humanos do governo e as pastas da Defesa e militares.

“Criar a Comissão da Verdade é a favor das Forças Armadas, que são formadas por oficiais militares das três armas, pessoas dedicadas à pátria, ao serviço público, com sacrifícios pessoais, das suas famílias. Esses oficiais não podem ser misturados com meia dúzia, uma dúzia ou duas dúzias de pessoas que prendiam as opositoras políticas, despiam-nas e praticavam torturas sexuais, que ocultaram cadáveres. É um grande equívoco e eu tenho certeza de que o ministro da Defesa [Nelson Jobim] sabe disso”, disse Vannuchi em entrevista à Agência Brasil.

O ministro defendeu a criação da Comissão da Verdade como forma de não permitir o uso das Forças Armadas para acobertar crimes contra os direitos humanos. “É necessário terminar um processo sem revanchismo, sem retorno ao passado e de mãos estendidas para a reconciliação nacional. Mas essa reconciliação não pode representar acobertar, jogar milhares de bons cidadãos brasileiros, do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, na defesa de pessoas que praticaram crimes de lesa-humanidade”, defendeu.

A criação de uma comissão especial para investigar casos de tortura e desaparecimentos ocorridos durante a ditadura militar (1964-1985) causou divergência entre Vannuchi e Jobim, além de desagradar aos militares. Para Jobim e para os representantes das Forças Armadas, a comissão especial teria o objetivo de revogar a Lei de Anistia de 1979.

Vannuchi, no entanto, diz que quem se opõe não leu o projeto. “O programa não é contra a Lei da Anistia. Não se trata nem de revisão e nem de anular a Lei de Anistia. Está lá, no item que propõe a ação programática 23, que propõe a elaboração de um projeto de lei, até abril, instituindo uma Comissão Nacional da Verdade, nos termos definidos pela Lei da Anistia. Não vou ficar neste momento correndo atrás da imprensa para explicar. Não há nenhum sentido revanchista”, disse o ministro.

A questão, de acordo com Vannuchi, será resolvida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em uma reunião que deverá ocorrer assim que ele voltar ao trabalho. “Neste momento há uma clara orientação do presidente Lula, que está na Bahia para um recesso merecido. No dia 11 de janeiro, ele estará de volta e nesse dia estaremos juntos ouvindo as orientações do presidente.”

OAB critica Jobim por reagir à criação de comissão para investigar ditadura militar

“Anistia não é amnésia”, disse, no dia 30/12/2009, o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Britto, ao criticar as o que chamou de “pressão” do ministro da Defesa, Nelson Jobim, e de comandantes militares contra a criação da Comissão da Verdade, prevista no Programa Nacional de Direitos Humanos.

“O Brasil não pode se acovardar e querer esconder a verdade. Anistia não é amnésia. É preciso conhecer a história para corrigir erros e ressaltar acertos. O povo que não conhece seu passado, a sua história, certamente pode voltar a viver tempos tenebrosos e de triste memória como tempos idos e não muito distantes”, declarou Britto.

A criação de uma comissão especial para investigar torturas e desaparecimentos ocorridos durante a ditadura militar (1964-1985) causou divergência entre o ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria Especial de Direitos Humanos, órgão responsável pela elaboração do programa, e o ministro da Defesa. Nelson Jobim. Para Jobim e para os militares, a comissão especial teria o objetivo de revogar a Lei de Anistia de 1979.

“Um país que se acovarda diante de sua própria história não pode ser levado a sério. O direito à verdade e à memória garantido pela Constituição não pode ser revogado por pressões ocultas ou daqueles que estão comprometidos com o passado que não se quer ver revelado”, disse Britto.”O Brasil que está no Haiti defendendo a democracia naquela país não pode ser o país que aqui se acovarda”.

A OAB defende no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Superior Tribunal Militar (STM) ações reivindicando a abertura dos arquivos da ditadura e a punição aos torturadores. Já o ministro Jobim disse que a busca pela verdade não pode significar “revanchismo”.

Reportagens da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 04/01/2010

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