Emissões do Etanol
Brasil tem melhor base de dados sobre balanço de gases do efeito estufa do etanol de cana; projeção mostra emissão caindo até 2020
O pesquisador associado do Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético (Nipe) da Unicamp Isaías Macedo apresentou no dia 11 de abril dados de seu paper “Green house gases emissions in the production and use of ethanol from sugarcane in Brazil: The 2005/2006 averages and a prediction for 2020”, publicado em 14 de janeiro no site da revista internacional Biomass and Bioenergy, em que mostra os números referentes ao balanço de emissão de gases de efeito estufa (GEEs) para o sistema de produção de etanol a partir de cana-de-açúcar. No Boletim Inovação UNICAMP n° 104.
Os dados do artigo de Macedo contestam os do artigo “Use of U.S. Croplands for Biofuels Increases Greenhouse Gases Through Emissions from Land Use Change”, de Timothy Searchinger e mais sete autores, publicado na revista Science em 7 de fevereiro. Dizem esses autores no resumo do paper: “Estudos anteriormente publicados encontraram que a substituição de gasolina por biocombustíveis reduz os gases do efeito estufa porque biocombustíveis seqüestram carbono por meio do crescimento do feedstock. Essas análises erraram ao não contar as emissões de carbono que ocorrem quando agricultores de todo o mundo respondem a preços maiores e convertem floresta e pastagens em novas áreas cultivadas para repor os grãos (ou a área plantada) desviados para biocombustíveis. Usando um modelo da agricultura mundial para estimar as emissões resultantes da mudança do uso do solo, nós encontramos que o etanol de milho, ao invés de produzir uma redução de 20% nas emissões, quase dobra as emissões de gases em 30 anos e aumenta as emissões durante 167 anos. Esses resultados trazem preocupações sobre a obrigação de adicionar percentuais de biocombustíveis em gasolina e enfatizam o valor do uso de resíduos”.
Macedo critica a inclusão, no balanço, do chamado “efeito indireto” da produção de biocombustíveis sobre a mudança de uso do solo — justamente a novidade do artigo publicado na Science. O efeito indireto é o aumento da área plantada que resulta do aumento do interesse por biocombustíveis. Os dados de Macedo foram apresentados no seminário “Sustentabilidade em Biocombustíveis”, promovido pelo Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP) e pelo Pólo Nacional de Biocombustíveis da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq-USP), de Piracicaba (SP).
Na palestra, Macedo chamou a atenção para o espaço que as discussões em torno das metodologias para mensurar a emissão de GEEs tem ocupado na imprensa especializada. A metodologia utilizada por Searchinger e outros no artigo da Science computa no balanço das emissões os GEEs resultantes do efeito indireto da mudança do uso do solo (leia mais sobre mudança do uso do solo e efeito estufa). Um exemplo do “efeito indireto” dos biocombustíveis na mudança do uso do solo: o aumento da área de cultivo de milho nos EUA teria incentivado o plantio de soja no Mato Grosso e a derrubada da floresta no arco do desmatamento. Nas metodologias hoje existentes, inclui-se apenas o uso direto, ou seja, a substituição de uma cultura por outra — por exemplo, laranja por cana-de-açúcar. Faz-se a conta para ver se essa substituição aumentou ou diminuiu a emissão de GEEs.
Novo artigo atualiza números brasileiros
Na palestra no IEA, Isaías Macedo apresentou os dados constantes do paper em que mostra números atuais referentes ao balanço de GEEs para o sistema de produção de etanol a partir de cana-de-açúcar e projeta as emissões para 2020. O pesquisador falou ainda dos debates internacionais sobre as metodologias para mensuração dos gases estufa, com ênfase nas discussões européias. O artigo é uma atualização de artigo equivalente publicado por ele em 1998 na mesma revista.
De acordo com o atual estudo de Macedo, a emissão total de gás carbônico para a produção de etanol de cana em 2005/2006 foi de 417 quilos de gás carbônico equivalente por metro cúbico para o álcool hidratado, e de 436 quilos de gás carbônico equivalente por metro cúbico para o álcool anidro. Para 2020, a projeção é inferior, por conta de melhorias tecnológicas e ausência de queima — 330 quilos de gás carbônico equivalente por metro cúbico para hidratado e 345 quilos de gás carbônico equivalente por metro cúbico para anidro. Entre as formas de bioenergia, esse é o melhor balanço possível, segundo o pesquisador.
Nas metodologias usadas hoje, é incluída a emissão de gases estufa provocada por mudanças no uso do solo por conta da expansão do cultivo da cana. Mas há países, como a Alemanha, defendendo ser preciso medir e considerar o fato de a expansão da produção de cana poder expulsar outros cultivos, como os alimentares e de exportação, para áreas de florestas. Nesse caso, entraria na conta da emissão de GEEs do etanol a derrubada das matas, mesmo que elas ocorram para plantação de outros cultivos.
O que entra na conta da emissão de GEEs
Desde 1984, o Brasil tem trabalhos científicos procurando quantificar as emissões de GEEs na cadeia do açúcar e do etanol, segundo Macedo. A partir de 2006, aumentou a preocupação no exterior em definir metodologias por conta do interesse dos países desenvolvidos em usar etanol e biodiesel. “Não haverá uma planilha universal para biocombustíveis, mas é possível colocar princípios, recomendações sobre o que entra e não entra em um balanço”, destacou.
A seguir, Macedo detalhou o que é analisado nas emissões de GEEs em etanol. Primeiro, são contabilizadas as emissões nos fluxos de carbono associados com a absorção do carbono atmosférico por fotossíntese; a liberação na queima da palha da cana na colheita; a liberação gradual por oxidação de resíduos não queimados no campo; a liberação de gás carbônico na fermentação da sacarose e combustão do bagaço nas usinas; e a liberação do gás carbônico pelos motores dos automóveis. Essas emissões, disse o pesquisador, são consideradas neutras na emissão total, pois os volumes de carbono emitido e seqüestrado são semelhantes.
Outros dados que entram no balanço de emissões se relacionam aos fluxos de carbono associados com o uso de combustíveis e a produção dos insumos usados na agricultura e na indústria, na fabricação de equipamentos, prédios e em sua manutenção. Aqui entra o gás carbônico emitido pelo uso de combustíveis fósseis na agricultura, como o diesel consumido pelos veículos que transportam a cana para as usinas, por exemplo. E também o gás emitido pelos produtores de insumos agrícolas, como herbicidas, pesticidas, mudas etc. Nesse quesito, disse Macedo, há um aumento da quantidade de gás carbônico na atmosfera.
Um terceiro item que entra na conta de emissão dos GEEs são os gases não associados ao uso de combustíveis fósseis, principalmente metano e óxido nitroso. A emissão desses gases é medida no processo de queima da cana, na liberação com o uso de fertilizantes, na combustão dos bagaços nas caldeiras e do etanol nos motores. Também são fluxos que ampliam o volume de GEEs na atmosfera.
Um quarto grupo trata das emissões que seriam evitadas, ou emissões de mitigação. É uma conta que diz quanto haveria de carbono a mais na atmosfera se, ao invés do etanol, fosse utilizado um combustível fóssil. Aqui entram as emissões de GEEs evitadas pela substituição de gasolina por etanol, de óleo combustível por bagaço para geração de energia nas usinas, e com a co-geração de energia. Emissões por conta da mudança do uso do solo são consideradas à parte.
“É importante ter uma base de dados sólida para GEEs, como a que o Brasil tem para o etanol de cana. Em 2005/2006, fizemos um balanço com base na análise de 44 usinas do Centro-Sul e para 100 milhões de toneladas de cana produzidas por ano. Não há dados como esses para a produção de etanol a partir de milho, por exemplo”, afirmou. Macedo destacou ainda que o ideal é fazer um cálculo usina a usina.
O pesquisador defendeu que as metodologias envolvam dados de forma mais abrangente, devido ao aumento da complexidade do sistema produtivo do etanol. Muitas usinas estão produzindo co-produtos, como ácido cítrico, lisina, leveduras especiais; há o uso do bagaço e da palha para produção de energia que pode ser co-gerada e vendida ao mercado, substituindo as formas convencionais de produção de energia elétrica; há a produção de plásticos e solventes, o uso conjugado de etanol e biodiesel na parte agrícola e industrial, em rotação de cultura de soja. Esses elementos não têm sido considerados nas metodologias.
Discussões internacionais
Segundo Macedo, nenhuma metodologia discutida em âmbito internacional considera, no cálculo, a remoção futura de floresta por conta do deslocamento de culturas promovido pela expansão do uso de biocombustíveis, um dos temas abordados no artigo da Science em fevereiro, a que os pesquisadores chamam de efeito indireto por mudanças no uso da terra. “Quando plantamos em pasto degradado, o balanço será positivo. Não se pode é plantar em cerrado lenhoso, com alta densidade de madeira, ou em floresta”, disse ele. Nesse tipo de ação, haveria um aumento de emissões de carbono.
Algumas discussões em torno dessas metodologias e certificações sinalizam as barreiras que o etanol nacional pode enfrentar no que se refere ao quesito mudança de uso do solo para cultivo da cana-de-açúcar. No Reino Unido, por exemplo, discute-se a exigência de informar para o vendedor de qual área do país de origem é proveniente o etanol, especificando se foi uma área de substituição do uso da terra. Isso já é contado nas metodologias existentes. Ainda não incluíram o efeito indireto — deslocamento de culturas para áreas florestadas por conta da expansão da bioenergia —, mas estudam fazê-lo. A diretiva da União Européia (UE) também analisa se vai incluir esse impacto em sua metodologia. A tendência, segundo Macedo, é que as diretivas nacionais de cada país europeu dêem lugar à diretriz da UE.
Já na Alemanha, a norma pretende ser mais dura. Se o país exportador de etanol não quiser provar que produziu o combustível sem ter provocado a mudança de uso da terra, será considerado “culpado”, e emissões maiores de carbono serão parte da conta. Por exemplo, o etanol produzido no Centro-Sul do Brasil implica a derrubada do cerrado úmido. Se o produtor nacional não provar que não derrubou a vegetação, isso será contabilizado como emissão de GEEs — o que, na prática, vai impedir a compra do biocombustível. Em contrapartida, as vantagens do sistema produtivo do etanol estão sendo desconsideradas pelos que discutem metodologias de emissão de GEEs no exterior. No Reino Unido, limitam a inclusão da eletricidade exportada, ou seja, a energia co-gerada.
No debate no IEA, iniciativa privada critica metodologias
Participaram também da reunião Marcos Jank, presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), Weber Amaral, coordenador do Pólo Nacional de Biocombustíveis e do Programa Temático Ambiental sobre Sustentabilidade do IEA, Delcio Rodrigues, pesquisador do Instituto Ekos Brasil e do Instituto Vitae Civillis, e Pedro Dias, diretor do Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC).
No debate, Jank destacou que, para a importação de petróleo, não há nenhum tipo de certificação exigida, mesmo para o produto vindo de países com vida política e social complicada e problemas agravados, muitas vezes, pela luta pelo petróleo. Chamou de “trabalho maluco” a consideração dos efeitos indiretos em mudanças do uso do solo e disse não ver como isso pode ser tratado metodologicamente.
“A cana está onde deveria estar, perto dos grandes centros consumidores. A cana não precisa entrar no Pantanal, no Amazonas; não faz sentido agronomicamente e não há infra-estrutura e logística para tal”, acrescentou. Para ele, os cientistas, com seus estudos, têm as melhores condições de responder às críticas vindas dos outros países. (J.S.)
O etanol, como todos percebemos, está em grande expansão, principalmente no Brasil. Sabemos também que o petróleo é limitado. Esses dois fatos so levam a um caminho, mesmo não sendo muito desejável pelos países líderes na produção de petróleo, o etanol será o combustível do futuro, e pensando no futuro, devemos nos preocupar sim, com o uso de territórios importantes para manter o equilíbrio no meio ambiente, que serão usados indevidamente no plantio de cana. Não adianta fazer o bem por um lado, que é a menos emissão de co2, e por outro destruir as florestas para “plantar combustível”. O brasil está no rumo do desenvolvimento combustível. So falta a industrialização!!
principais líderes na produção de p