Os riscos na economia com as mudanças no clima
O Brasil corre o risco de ter uma perda na economia de um a três bilhões de reais em 2050, caso nada seja feito para reverter os impactos das mudanças climáticas. As regiões mais vulneráveis à mudança do clima no Brasil seriam a Amazônia e o Nordeste, com perdas expressivas para a agricultura em quase todos os estados. Além disso, a previsão é de uma menor a confiabilidade no sistema de geração de energia hidrelétrica, com redução em torno de 30% da energia e uma perda do patrimônio das zonas costeiras brasileiras, avaliado em mais de R$ 130 bilhões. Esses são alguns dos resultados do estudo Economia das mudanças do clima no Brasil, uma iniciativa pioneira de uma grande equipe formada por cientistas de 11 instituições de pesquisa. Reportagem de Iara Cardoso, na ComCiência*.
“As mudanças climáticas, de fato, terão um impacto no PIB (Produto Interno Bruto), e esse impacto será maior em algumas regiões do que em outras, aumentando a desigualdade no país, já que as regiões mais impactadas serão a Norte e a Nordeste, que já são menos ricas”, diz Carolina Dubeux, coordenadora técnica do estudo e pesquisadora do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
O estudo analisa e quantifica o impacto da mudança do clima na agenda de desenvolvimento do país e aponta que a redução do PIB poderá ser de 0,5% a 2,3% em cenários de altas emissões de CO2 (cenário sujo) e baixas emissões (cenário limpo), tendo como parâmetro o ano de 2050. Segundo o estudo, embora o cenário mais limpo gere perdas de até 2,3% no PIB, ainda assim gera mais riqueza do que o cenário mais sujo. As estimativas foram feitas baseadas em valores climáticos médios e não consideraram eventos extremos.
Para minimizar os problemas destacados, o estudo aponta algumas prioridades de ação, entre elas: o fortalecimento de políticas de proteção social, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, as mais afetadas; o esforço para manter a matriz energética do país limpa; a redução do desmatamento da Amazônia; e o incentivo ao aumento do conhecimento sobre modelos climáticos e seus impactos nos diversos setores da economia.
O estudo foi inspirado no relatório Stern, o primeiro grande cálculo do impacto da mudança climática na economia global, feito em 2006. “A diferença é que o relatório Stern fez um cálculo custo-benefício entre os custos dos impactos e os custos em mitigação (prevenção). No caso do nosso estudo, como o clima depende da economia global e não da local, fizemos uma análise do impacto local de duas possíveis trajetórias de crescimento global; uma mais limpa e uma mais suja. Concluímos que se crescermos mais limpos, cresceremos mais”, comenta Dubeux.
O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que colaborou com o estudo, contribuiu com os modelos climáticos regionais desenvolvidos pelo Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC). Com base nos dados fornecidos pelo Inpe de temperatura, pluviosidade e outros parâmetros ambientais futuros para o Brasil até 2100, foram gerados os modelos setoriais de disponibilidade hídrica que implica em oferta de hidroeletricidade, energia eólica, aptidão agrícola, entre outros. Os modelos climáticos regionais possuem incertezas e, por isso, optou-se pela escolha de dois cenários de emissões de CO2.
“Os modelos climáticos globais e regionais têm incertezas, e os modelos usados pelos outros grupos (de economia, saúde, agricultura, energia, etc) também têm incertezas, e as incertezas podem ir crescendo, como uma cascata. Isso limita os resultados, mas não invalida os mesmos”, diz José Marengo, pesquisador do Inpe.
O estudo aborda perspectivas regionais e setoriais de vários setores cruciais para o Brasil, como agricultura, energia, uso da terra e desmatamento, biodiversidade, recursos hídricos, zona costeira, migração e saúde. Aponta, ainda, que haverá um aumento das desigualdades regionais brasileiras com o aumento da temperatura global. O setor da agricultura, por exemplo, não sofreria impactos negativos no Sul e no Sudeste, que passariam a ter temperaturas mais amenas, mas em todas as outras regiões existiriam perdas expressivas das safras.
No Nordeste em especial, as chuvas tenderiam a diminuir cerca de 2 a 2,5 mm/dia até 2100, causando grandes perdas agrícolas em todos os estados da região. O declínio de precipitação causaria também uma redução dos recursos hídricos no Nordeste. Os resultados projetados seriam alarmantes para algumas bacias, com uma diminuição das vazões de mais 50% até 2050. Com isso, a geração de energia seria bastante prejudicada. O déficit hídrico reduziria ainda a capacidade de pastoreio de bovinos de corte, favorecendo, assim, um retrocesso à pecuária de baixo rendimento.
Na Amazônia, o aquecimento pode chegar a 7 ou 8°C em 2100, o que pode levar a uma alteração radical da floresta amazônica – a chamada “savanização”. Estima-se que as mudanças climáticas resultariam em redução de 40% da cobertura florestal em boa parte da Amazônia, que será substituída pelo bioma savana.
As outras instituições que participaram do consórcio para elaboração do estudo, além da UFRJ e do Inpe, são a Universidade do Estado de São Paulo (USP), a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS), a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe).
* ComCiência, Revista Eletrônica de Jornalismo Científico, LABJOR(Unicamp)/SBPC
EcoDebate, 14/12/2009
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