Mata Atlântica: Indústrias e rodovias alteram composição química de plantas
Betume asfáltico também influencia na composição química de plantas e solo
As rodovias que cortam a Mata Atlântica no estado de São Paulo, bem como as indústrias instaladas nestas regiões influem na composição química do solo e de algumas espécies de plantas. Sete espécies de plantas foram monitoradas em duas áreas da Mata Atlântica, em Cubatão e em Ubatuba, respectivamente exemplos de áreas impactadas e bem preservadas. Os resultados revelam que as plantas apresentaram em suas composições concentrações elevadas de elementos tóxicos na região de Cubatão, por influência de atividades humanas, e de sódio na região de Ubatuba, por influência do spray marinho.
Segundo o biólogo André Luís Araújo, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA), da USP em Piracicaba, as análises foram realizadas em duas regiões de Mata Atlântica: no núcleo Itutinga-Pilões, em Cubatão, e núcleo Picinguaba, em Ubatuba. Os locais fazem parte do Parque Estadual da Serra do Mar.
A partir de 2006 e até metade deste ano (2009), Araújo se dedicou a analisar espécies de plantas e solos nas regiões, para seu estudo de mestrado Complexidade da acumulação de elementos químicos por árvores nativas da Mata Atlântica, que foi orientado pela professora Elisabete A. De Nadai Fernandes, do CENA. A pesquisa foi realizada com base em dados de um estudo do engenheiro agrônomo Elvis Joacir de França realizado no Parque Estadual Carlos Botelho, núcleo Sete Barras. Lá, um local considerado de pouca intervenção humana, o engenheiro observou a composição química de várias espécies arbóreas comuns da Mata Atlântica.
Com esses dados em mãos, Araújo decidiu avaliar a composição de sete espécies em outras regiões mais próximas a rodovias e áreas industriais: a samambaia-açu (Alsophila sternbergii); a cavarana (Bathysa australis); o palmito juçara (Euterpe edulis); bacupari (Garcinia gardneriana); canjiqueiro (Guapira opposita); aricurana (Hyeronima alchorineoides); bocuva-açu (Virola bicuhyba).
Alterações
Araújo conta que as alterações observadas tanto no solo quanto nas plantas, em relação aos índices levantados no estudo de França, ficam evidentes. Na região do sistema Anchieta-Imigrantes, por exemplo, ele descreve que foram encontradas no solo grandes concentrações de arsênio e antimônio, o que resultou em concentrações também em quantidades consideráveis nas folhas das plantas. “Ao mesmo tempo pude observar baixos índices de elementos alcalinos, como potássio, cálcio, bário e rubídio”, descreve o pesquisador. Segundo ele, arsênio e antimônio são elementos relacionados à queima de combustíveis fósseis. Amostras de solo e folhas apresentaram correlação das concentrações de arsênio e antimônio com a distância da rodovia, sendo que a cerca de 50 metros do sistema Anchieta-Imigrantes, foram observados alguns valores extremos.
Araújo lembra ainda que em relação a arsênio, a recomendação da Cetesb tem como valor de prevenção o máximo de 15 miligramas por quilograma (mg/kg). “Ao longo da rodovia, naquele sistema, chegamos a encontrar até 125 mg/kg. Ao mesmo tempo, os elementos considerados essenciais às plantas, como o potássio, foram encontrados em concentrações menores nesses locais”, conta. Com base em suas análises, o biólogo acredita que a acidez no solo próximo à rodovia pode ser ocasionada pela ação das chuvas somadas aos poluentes, o que causa a diminuição de elementos alcalinos, prejudicando as plantas.
Áreas de coleta
O pesquisador conta que os pontos de coleta das amostras de folhas e solo no núcleo Itutinga-Pilões variaram de 50 a 7.000 metros do sistema Anchieta-Imigrantes. “Em São Bernardo do Campo fomos a cerca de 700 metros da pista”, descreve. Já na região de Cubatão, as amostras foram retiradas a cerca de 1 quilômetro e nas proximidades de Santos, 7 quilômetros da estrada. “De maneira geral, houve impacto no solo que se refletiu nas plantas próximas às rodovias”, relata, lembrando que, “nas amostras coletadas próximo de algumas indústrias e mais distantes da rodovia o solo não estava tão impactado, mas mesmo assim houve maior incidência em folhas de elementos químicos que não são absorvidos de forma eficiente pela raiz das plantas, como tório, escândio, cério e samário.”
Já na região de Ubatuba, o pesquisador detectou maior presença de sódio. Isso, segundo ele, devido à proximidade do mar. “As plantas analisadas estavam a cerca de 2 quilômetros da orla marítima. Pudemos notar que algumas delas se adaptam a ponto de mudar a espessura de suas folhas.” Araújo lembra também que os poluentes nas plantas podem afetar a diversidade de insetos, já que nas áreas com menos intervenção humana e com menores índices de poluentes era visivelmente observada uma taxa maior de folhas comidas.
Na visão de Araújo, fica evidente que se tem um problema de concentração de poluentes, como material particulado, proveniente das indústrias e de elementos tóxicos que resultam de origens fósseis, proveniente não apenas dos veículos em geral, como do betume asfáltico das rodovias. “No Brasil deveria haver sistemas efetivos de biomonitoração de vários organismos, como ocorre em países da Europa, o que facilitaria a tomada de decisões visando a maior preservação”, recomenda.
Além da orientação da professora Elisabete De Nadai Fernandes, Araújo contou com a supervisão de Elvis Joacir de França para realizar seu estudo.
Mais informações: (19) 3429-4829, com André Luís Araújo, ou no email allaraujo@cena.usp.br
Reportagem de Antonio Carlos Quinto, da Agência USP de Notícias, publicada pelo EcoDebate, 02/12/2009
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