Indústria naval brasileira: passado e futuro, artigo de Carol Salsa
[EcoDebate] A indústria de construção naval no Brasil é muito antiga, vinda dos tempos remotos coloniais. Já teve seus dias de glória, período em que os portugueses transformaram a empírica “marinharia medieval” numa ciência que permitia navegar com relativa segurança em qualquer parte do mundo.
A posição geográfica e estratégica do Brasil em relação à rota da Índia e a grande disponibilidade de madeira de boa qualidade foram os ingredientes necessários para a instalação de estaleiros tanto para reparação em embarcações como para projeto e construção de vários outros.
As primeiras embarcações de tipo europeu construídas foram dois Bergantis feitos no Rio de Janeiro, em 1531.
O mais importante, e que continuou sendo até meados do Século XIX, foi o Arsenal da Marinha da Bahia, em Salvador, fundado por Thomé de Souza. Ao instalar o Governo Geral, em 1549, trouxe de Portugal um grupo de artífices especializados que incluía um mestre de construção, carpinteiros, calafates( calafetadores) e um ferreiro. Lá, foram construídos dezenas de navios, inclusive grandes naus que eram os maiores navios de guerra do seu tempo.
Quarenta anos mais tarde, Gabriel Soares de Souza no seu Tratado Descritivo do Brasil menciona a existência de 40 carpinteiros na Bahia, portugueses e mestiços que se ocupavam de fazer navios, diz Hoepner Ferreira.
O primeiro estaleiro estabelecido foi o da Ribeira das Naus, ao final do século XVI, também na Bahia, durante o governo de D. Francisco de Souza.
A construção naval no Brasil beneficiou-se consideravelmente pela padronização estabelecida pela Junta das Fábricas da Ribeira ( estaleiro de Lisboa), que estabelecia proporções e regras simples facilitando o projeto de peças dos mais variados tipos de embarcação.
Segundo o historiador, essas padronizações- diríamos hoje Normas Técnicas- vigoraram até fins do século XVII e chegaram mesmo a ser empregadas no Brasil até meados do século XIX.
Em 1666, surge na ilha do Governador uma Fábrica de Fragatas, situada na ponta do Galeão. Nela foi construída a nau Padre Eterno, por volta de 1670, tida como o maior navio existente no mundo. Crescia a indústria naval brasileira com estaleiros particulares, como o que existia em 1711, em Cananéia e no Rio de Janeiro.
Na transferência da capital federal da Bahia para o sudeste, cria-se em 1763, o Arsenal da Marinha do Rio de Janeiro até hoje existente, e cuja primeira construção foi a nau S. Sebastião, de 1767, responsável pelo considerável impulso à construção naval. Outros Arsenais da Marinha foram organizados pelo governo português no litoral brasileiro, em Recife e Belém.
A partir de 1840, foi contínua e notável a ampliação e modernização do Arsenal do Rio, com a implantação de novas oficinas e com a vinda dos primeiros brasileiros com curso formal de engenharia naval na Europa, destacando-se os nomes de Napoleão Level, Trajano de Carvalho e Carlos Braconnot.
O primeiro navio a hélice foi construído em 1852, o primeiro navio encouraçado em 1865, e o primeiro de construção inteiramente metálica em 1883. Em 1890, foi construído o cruzador Tamandaré, de 4.537 t, navio cujo porte só seria ultrapassado 72 anos depois, em 1962. No início de 1972, duas fragatas foram construídas, a última lançada ao mar em 1975.
Tratava-se de navios modernos, com complexos e sofisticados sistemas de armas, máquinas e sensores, cuja construção representou um grande desafio e um enorme avanço tecnológico. Seguiu-se a construção de corvetas. O maior desafio foi a construção dos submarinos classe Tupi, de projeto alemão, também no Arsenal da Marinha, passando o Brasil para o restrito número de países no mundo capaz de construir submarinos. Nessa época, o Arsenal chegou a atingir um adiantamento técnico comparável ao que havia nos centros mais avançados da Europa.
A história da construção naval no Brasil continua até 1979 dando início uma grave crise na indústria naval, persistindo até meses atrás, quando uma nova bandeira desfraldada vislumbra o início de um novo ciclo.
Hoje, acompanhamos a descoberta da camada do pré-Sal. Com ela, o ressurgimento da indústria naval já esquecida, de tantas batalhas ganhas que agora volta a explorar um mercado dantes navegado. A indústria, que em 1979 tinha 40.000 empregados diretos na construção de 50 navios, totalizando 1.394.980 t, sete para exportação, abre as portas a novas e promissoras carreiras profissionais de um passado não muito distante para se tentar o recomeço.
O Programa de Modernização e Expansão da Frota da Transpetro, subsidiária da Petrobrás deve gerar 20 mil empregos com a licitação de 26 navios.
O mercado brasileiro já detém a quinta maior carteira de encomenda do mundo, com estudo para a construção de até 17 estaleiros, segundo fontes do setor. Já tivemos o boom do ressurgimento da indústria naval, após 20 anos sem encomendas. Com isso, vieram os estaleiros virtuais, hoje uma realidade, e investimentos na modernização e ampliação de outros, já existentes.
Propostas para construção de oito cascos em série para navios-plataforma que vão operar em Tupi, foram negociados pela Petrobrás.
Plataformas, sondas, petroleiros e embarcações de apoio em encomendas bilionárias da Petrobrás podem fazer do Brasil a Meca dos investimentos nos próximos anos. Os valores chegam a US$ 17 bilhões numa primeira fase ( entre 2009 e 2010), podendo ir a US$ 40 bilhões até 2012, diz o Monitor Mercantil, jornal especializado em economia e negócios.
Num aceno ao passado onde tantos foram os artífices da indústria naval brasileira e tantos engenheiros navais formados pelas universidades brasileiras, nossos votos para que o mercado naval aquecido possa gerar emprego e renda e volte a ser pioneiro em tecnologias de ponta.
Carol Salsa, colaboradora e articulista do EcoDebate é engenheira civil, pós-graduada em Mecânica dos Solos pela COPPE/UFRJ, Gestão Ambiental e Ecologia pela UFMG, Educação Ambiental pela FUBRA, Analista Ambiental concursada da FEAM ; Perita Ambiental da Promotoria da Comarca de Santa Luzia / Minas Gerais.
FONTES:
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro da Academia Nacional de Engenharia
Academia Paulistana de História
EcoDebate, 17/09/2009
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