MPF/PA questiona modelo de audiência pública de Belo Monte
Rio Xingu, Belo Monte. Foto do MPF
Procuradores da República e promotores de Justiça se retiraram da audiência de Belém, realizada em um teatro sem capacidade para abrigar todos os interessados. Com lotação ultrapassada e segurança precária, dezenas ficaram do lado de fora
Começou tumultuada a quarta audiência pública para debater o projeto da hidrelétrica de Belo Monte, realizada na noite de ontem, 15 de setembro, em Belém (PA). Os procuradores da República Daniel Azeredo Avelino, Rodrigo Costa e Silva e Ubiratan Cazetta assim que chegaram ao local tiveram que intervir, juntamente com o promotor de Justiça Raimundo Moraes, para garantir a entrada dos indígenas e sem-terra, impedidos de entrar por homens da Força Nacional.
O coordenador da Força Nacional, diante da argumentação dos membros do MP de que era necessária a participação de todos os movimentos sociais, avisou que ninguém mais poderia entrar, uma vez que a lotação do local estava esgotada. “Se mais pessoas entrarem, eu não posso me responsabilizar pela segurança”, disse.
O local escolhido pelo Ibama para a realização da audiência foi o teatro Margarida Schivazapa, no centro de Belém, com capacidade para 480 pessoas. Com a entrada dos índios e dos sem-terra, cerca de 600 pessoas já lotavam o teatro e as escadarias, e ainda assim dezenas se amontoavam do lado de fora. Eram pesquisadores e estudantes universitários, assim como integrantes de movimentos sociais.
Os membros do MP tentaram negociar com o presidente do Ibama, Roberto Messias, para que a audiência fosse realizada em um auditório maior, que abrigasse todos os interessados. Eles argumentaram que não seria possível garantir nem a segurança de quem estava dentro, nem a participação de quem estava fora.
A promotora de Justiça Eliane Moreira, que chegou alguns minutos depois de iniciada a negociação, relatou que até no estacionamento estava impossível entrar. Mas Messias não concordou: alegou que quem não tinha entrado acompanharia pelo telão instalado do lado de fora e descartou um acordo para adiar a audiência.
Sem acordo, a audiência se iniciou em meio a tumultos, mas foi logo interrompida. Após o pronunciamento do representante do governo do estado, Maurílio Monteiro, o procurador da República Rodrigo Costa e Silva consignou novo protesto pelo formato escolhido para as audiências e anunciou a retirada dos membros do MP.
“Estamos consignando novamente nosso protesto contra esse formato de audiência pública. Estivemos presentes as três audiências anteriores e já tivemos todas as prerrogativas do Ministério Público cerceadas pelos organizadores. O regulamento aprovado pelo Ibama não permite a efetiva participação nem do MP, nem a popular”, iniciou Costa e Silva.
Foi seguido no protesto pelo representante do Ministério Público do Estado do Pará, Raimundo Moraes, que afirmou: “Essa audiência é inédita em Belém. Nunca vi uma audiência pública feita com tanta força policial, impedindo até autoridades de entrarem no estacionamento. Nunca vi uma audiência pública em que a sociedade civil não participa da mesa, ao menos simbolicamente. Nenhum debate se faz dessa forma acanhada, restritiva, com violência institucionalizada. Até o regulamento dessa audiência é inconstitucional”
Eles anunciaram que ingressarão com pedidos na Justiça para tentar garantir a mínima participação popular nos debates sobre Belo Monte. E conclamaram os presentes a se retirarem. Cerca de metade das pessoas que estavam no auditório se retiraram, incluindo os índios presentes, entre os quais o cacique Kayapó Paulinho Payakan.
A audiência recomeçou, com vários lugares vazios no teatro. O único movimento social que permaneceu foi um grupo de moradores da região do Xingu favorável à implantação da hidrelétrica. Usavam uma camiseta com os dizeres “Belo Monte, Eu quero”.
Enquanto os que ficaram assistiam a uma apresentação de 50 minutos feita por uma das técnicas contratadas pelo consórcio de empreiteiras – Camargo Correa, Norberto Odebrecht e Andrade Gutierrez – que fez os estudos de viabilidade da obra, uma manifestação se iniciava no hall do teatro. Uma das ruas contíguas ficou interditada por alguns minutos.
* Informe da Procuradoria da República no Pará, publicado pelo EcoDebate, 17/09/2009
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