EcoDebate

Plataforma de informação, artigos e notícias sobre temas socioambientais

Notícia

Casa Nova, BA: Juiz volta atrás em decisão que beneficiava empresários em grilagem de terras

Ontem (26), durante audiência pública que terminou há pouco, o juiz do município de Casa Nova (BA), Eduardo Ferreira Padilha, voltou atrás na decisão que beneficiava a dois empresários pela posse de aproximadamente 30 mil hectares de terras e determinava a expulsão de mais de 300 famílias. A decisão inusitada foi comemorada pelos trabalhadores com festa e uma passeata pelas ruas da cidade. Matéria de Clarice Maia, Articulação Popular São Francisco Vivo, publicada pelo EcoDebate.

A audiência foi convocada e coordenada pelo ouvidor Agrário Nacional, desembargador Gercino José da Silva Filho, com objetivo de apurar “possível atuação ilegal da Polícia Militar e da Polícia Civil durante o cumprimento de mandado de imissão de posse; destruição de casas, cercas e currais de posseiros; grilagem de terras públicas; regularização fundiária na modalidade denominada Fundo de Pasto; e desapropriação para fins de reforma agrária”.

Logo no início o juiz local encaminhou nova sentença que foi lida em público. No documento ele voltou atrás na sentença anterior, reconheceu a presença de posseiros na área e deliberou o direito dos trabalhadores retornarem às terras a fim de resguardar as benfeitorias e trabalhos.

As comunidades são conhecidas como Fundo de Pasto – quando há característica predominante das áreas coletivas, pastagens em áreas abertas para pequenos animais e pequenos roçados – em Casa nova, as famílias tem como principais fontes de renda a criação de caprinos – cerca de 15 mil cabeças, e a apicultura, com aproximadamente 3 mil caixas. Organizadas em quatro associações, elas vivem na área mais próxima da água e tem a área de produção dentro da caatinga.

A partir de hoje o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a Coordenadoria de desenvolvimento Agrário (CDA) da Bahia devem vistoriar as terras, fazer estudos e revisão de processos no sentido de regularização das famílias. Os empresários ainda podem recorrer da nova sentença. Um oficial de justiça foi enviado para a área onde estão os representantes dos empresários para notificação da decisão e a polícia recebeu a responsabilidade de assegurar a saída dos seguranças e volta das famílias.

Histórico dos conflitos recentes
Os empresários Carlos Nisan Lima e Silva e Alberto Martins Pires Matos pagaram R$ 639 mil ao Banco do Brasil, principal credor das dívidas deixadas pela falida Agroindustrial Camaragibe SA, referente a uma dívida milionária passando a ser proprietários dos direitos e deveres da empresa. Dessa forma negociaram com os herdeiros as dívidas existentes por R$ 700 mil, que foram pagas não em dinheiro, mas na forma das quatro fazendas onde estão localizadas as comunidades e onde as famílias indicam presença de moradores há mais de 100 anos.

Os conflitos se intensificaram no dia 06 de março, quando Carlos Nisan Lima e Silva e Alberto Martins Pires Matos, com a Imissão de Posse das quatro fazendas – Lages e Baixa da Umbuzeira, Curralinho e Urecê – supostamente propriedade da Camaragibe S.A., conseguiram o apoio das policias militar e civil, um agente que se identificou como policial federal, seguranças fortemente armados e tratores. De posse do documento assinado pelo juiz local, os empresários iniciaram a destruição de casas, roçados, cercados e outras benfeitorias. Durante a ação dois agricultores chegaram a ser presos de modo arbitrário, nem sequer foram levadas à delegacia.

No dia 12, em audiência com o Ouvidor Agrário Nacional, Incra, CDA, Tribunal de Justiça, Promotoria de Justiça, Conselho de Operações da Polícia Militar da Bahia, Casa Militar da Bahia, Coordenação de Desenvolvimento Agrário da Bahia e advogados, foi estabelecido a investigação dos possíveis abusos e irregularidades cometidas por policiais e seria encaminhada uma representação junto a Corregedoria Geral do Tribunal de Justiça para apurar possível ilegalidade cometida pelo juiz de Casa Nova.

No dia 15 de março, cerca de 300 pessoas, representantes das famílias atingidas, resolveram parar a construção de guaritas que estavam sendo levantadas na entrada das propriedades para restringir a entrada e saída dos moradores, ainda retiraram tratores e os seguranças armados das terras. A maior preocupação era a de conter a destruição do trabalho de anos.

No dia 17 nove homens fortemente armados ameaçaram o grupo de morte, agrediram pessoas fisicamente, chegaram a queimar algumas delas, inclusive mulheres e crianças que foram usadas como escudo humano para coibir reações.