Barragem Atalaia, uma pequena hidrelétrica que poderia ter dado certo, artigo de José Bonifácio
[Blog Cerrados/GP1] A presente reordenação da matriz energética nacional, voltada, sobretudo para o chamado Aproveitamento Hidrelétrico (AHE), é orientada devido à falta de recursos públicos para investimentos em grandes empreendimentos, além das preocupações com projetos que possam causar impactos ambientais.
Somente na bacia do rio Parnaíba estão sendo projetadas a implantação de 08 barragens, entre Palmeirais e Santa Filomena, pelo lado piauiense. Dessas, sete serão construídas no próprio Parnaíba: AHE Castelhano (Palmeirais), AHE Estreito (Amarante), AHE Cachoeira (Floriano), AHE Uruçuí (Uruçuí), AHE Ribeiro Gonçalves (Ribeiro Gonçalves), AHE Canto do Rio (Santa Filomena/Tasso Fragoso), AHE Taquara (Santa Filomena/Alto Parnaíba), além do AHE Taboa (Sambaíba), no rio Balsas.
Significa dizer que o médio e o alto Parnaíba serão um imenso lago artificial, em detrimento das populações ribeirinhas. Como consequência, as áreas disponíveis à agricultura familiar simplesmente desaparecerão, e restarão apenas as terras altas (os Cerrados propriamente ditos), exatamente aquelas apropriadas ao setor do agronegócio.
Mas os tecnocratas do Governo Federal entendem que essas Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH´s) surgem como uma alternativa viável, utilizando como pretexto o custo acessível, o menor prazo de execução, as facilidades oferecidas pela legislação, dentre outras vantagens intrínsecas, como a não interferência no regime hidrológico do curso d’água.
Os AHE´s não são tão pequenos assim – É evidente que as usinas hidrelétricas costumam ser bem-vindas, pois utilizam a água para a geração de eletricidade. Entretanto, suas construções podem causar sérios impactos ambientais, como a inundação de áreas produtivas, perda de vegetação e da fauna, apenas para citar alguns exemplos.
Essas pequenas e médias Centrais Hidrelétricas não são tão acanhadas assim como apregoam. Na verdade, o objetivo principal da implantação desses reservatórios previstos para serem concluídos até o ano 2025, é alterar a navegabilidade do rio Parnaíba, em função das atuais condições, e fazer viabilizar o transporte da produção agrícola do cerrado maranhense e piauiense, através da ferrovia Transnordestina.
Para que se tenha idéia da magnitude das referidas Barragens, o lago formado pelo AHE Uruçui terá a extensão de 257 quilômetros. Por sua vez, a represa da barragem Taquara, que deverá represar quase todo o rio Taquara, deverá se estender por 195 quilômetros. Assim sendo, fará sumir as ‘Corredeiras da Taboca’, lugar onde o leito do rio Parnaíba se apresenta atulhado por blocos e matacões rochosos ou correndo sobre grandes lajeados, o que favorece também a formação das piscinas naturais. O trecho é ladeado pelos municípios de Alto Parnaíba e Barreiras do Piauí, distante cerca de 90 quilômetros da cidade de Santa Filomena.
Questionando sobre os reais benefícios dos referidos barramentos, o advogado Décio Hélder do Amaral Rocha, em seu Blog (deciorocha.blogspot.com), afirma: “Confesso que a simples ideia da construção de barragens ao longo do rio Parnaíba e afluentes na região do Alto Parnaíba me deixam apreensivo, quer pelo aspecto sócio, cultural, ecônomico e ambiental, quer pela não concepção de ver parte das terras de Alto Parnaíba e Santa Filomena tomadas pelas águas das represas”.
Outra preocupação, segundo os analistas, é como as administrações públicas dos vinte municípios diretamente beneficiados irão propor – em seus Planos Diretores Municipais – a ocupação do solo na bacia de contribuição, de modo que possa evitar a desordem fundiária no entorno das futuras usinas hidrelétricas.
Barragem Atalaia seria uma PCH – Nesse contexto, quedas d’água de pequeno porte, como a idealizada pelo engenheiro civil Adolpho Hannihost, representam uma importante opção de geração de energia elétrica. E olha que o mencionado projeto surgiu entre 1948 e 1954, quando esse alemão construiu um paredão de cimento, com 30 metros de comprimento por 8 metros de dimensão vertical, com o intuito de represar o Brejo Sumidouro, à altura do balneário Atalaia.
A finalidade da pequena Barragem era, segundo o pecuarista Armando Lustosa Dourado, eletrificar a cidade de Santa Filomena. “Foram fincados marcos, a fim de que fossem colocados os postes da rede elétrica, na época, uma novidade que ninguém por aqui acreditava”. E conclui: “Mas a obra do doutor Adolpho não pode ser terminada, pois o mesmo teve que ir residir no Rio de Janeiro”.
Embora o sistema de geração de energia elétrica não tenha sido instalado, por muito tempo, o lago se transformou em importante área de lazer e recreação.
A boa idéia que foi abandonada – Num momento de expansão da economia nacional, em que todos nós somos reféns do atual modelo energético brasileiro, unimodal, dependente das hidrelétricas e altamente predatório para a natureza e para a sociedade, é lamentável ver o estado de abandono em que se encontra aquela obra.
Vale ressaltar a tentativa do então prefeito municipal, Antonio Luiz Avelino, no sentido de transformar aquela represa na pequena hidrelétrica, imaginada e soerguida pelo engenheiro Adolpho, irmão do padre Guilherme, naquele tempo pároco na prelazia de Santa Filomena.
A experiência ocorreu em 1967, porém com uma nova modalidade na infraestrutura. Ou seja; no local do novo canal, formado pelo rompimento lateral, anexa à construção de concreto, foi edificado um paredão de ‘barro batido’. Todavia, a dita parede de terra não suportou o volume hídrico acumulado, vindo a se romper anos depois e as águas do Brejo Sumidouro foram desviadas para a sua margem esquerda, permanecendo até os dias atuais.
A luta dos irmãos germânicos, a mais de meio século, era talvez um grito de alerta para a gravidade da questão energética que estava por vir, mesmo quando a população filomenense ainda nem sonhava com os benefícios da luz elétrica. Seria apenas uma pequena hidrelétrica, que não provocaria alagamento dos vales e o afogamento das veredas e de seus produtivos buritizais. Enfim, a Barragem Atalaia, bem que poderia ter dado certo.
Artigo originalmente publicado no Blog Cerrados/GP1 e enviado pelo Fórum Carajás
EcoDebate, 04/08/2009
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