Estudo conclui que tuberculose tem alta incidência em populações indígenas de Rondônia
Foto: Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN)
Os indígenas do estado de Rondônia apresentam os maiores índices de adoecimento por tuberculose do país, de acordo com estudo realizado por Linconl Uchôa Sidon, aluno de mestrado da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz). Outra constatação é que cerca de 30% desses casos foram notificados em menores de 15 anos. O estudo apontou também que essa população apresentou melhores resultados no tratamento, com proporções de cura, abandono e óbito mais favoráveis do que os de não indígenas. O trabalho Tuberculose nas populações indígenas de Rondônia (1997-2006), Amazônia Ocidental – Brasil foi orientado pelo pesquisador da Ensp Paulo Basta.
No estudo, foram utilizados dados secundários provenientes do Sistema de Informações de Agravos de Notificação (Sinan/TB/RO) da Coordenação Estadual de Controle da Hanseníase e Tuberculose, no período entre 1997 e 2006. “Em consulta às variáveis de identificação dos indivíduos, realizou-se um processo de classificação dos casos de tuberculose em dois diferentes grupos (indígenas e não indígenas). Após classificação, depuração dos dados e exclusão de registros duplos, encontramos 6.407 casos elegíveis para análise. Desses, 420 foram classificados como indígenas (6,5%) e 5.987 como não indígenas (93,5%)”, conta Linconl. “Entre os resultados obtidos, constatou-se que 98% dos casos notificados residiam em Rondônia e que 70% eram provenientes dos seis municípios prioritários para o controle da tuberculose no estado. De acordo com a variável zona de residência, 80% dos casos indígenas foram provenientes da zona rural enquanto 80% dos não indígenas provinham da zona urbana”. Segundo o pesquisador, isso pode ter implicações sobre o acesso dos doentes indígenas aos serviços de saúde, que, em sua quase totalidade, concentram-se nas sedes dos municípios.
Linconl comenta que, no Brasil, existem cerca de 220 etnias indígenas, mas as informações específicas sobre essas populações ainda não são captadas pelo Sinan. “As ações usualmente empregadas pelo Programa Nacional de Controle da Tuberculose (PNCT) na rotina de vigilância e controle da tuberculose ainda não estão adaptadas à realidade da maioria dessas sociedades. Isto se dá provavelmente devido à dificuldade de integração entre os serviços de assistência e controle da tuberculose ofertados à população em nível municipal e as ações desenvolvidas pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa), instituição responsável pela assistência à saúde aos indígenas no país”, explicou.
Mesmo sem perder de vista as limitações inerentes aos estudos pautados em dados secundários de notificação, tais como subregistros e erros de classificação, somadas à dificuldade de obtenção de informações demográficas confiáveis sobre os povos indígenas no Brasil, foi observada uma tendência de redução da carga de tuberculose entre 1997 e 2006 para os dois grupos analisados. No entanto, Linconl indica que a incidência média do período para todas as formas da doença foi 14 vezes maior entre os índios (515,1 casos por 100 mil habitantes para indígenas e 36,0 por 100 mil habitantes para não indígenas).
Estudo registra elevada proporção de tuberculose entre índios menores de 15 anos
A média de idade dos casos de tuberculose entre os não indígenas ficou perto de 39 anos, enquanto entre os indígenas foi bem inferior e girou em torno de 29 anos, destacando-se a elevada proporção (33%) de casos nos indígenas menores de 15 anos. “O grande número de casos de tuberculose em crianças indígenas é um indicador indireto de que pode estar havendo transmissão do bacilo de Koch nas aldeias e que a situação epidemiológica está longe de ser controlada. Ainda que esses achados sejam relevantes, devemos estar atentos para fatores que também intervêm na proliferação da doença, tais como a estrutura populacional indígena mais jovem, os problemas relacionados à dificuldade de diagnóstico, principalmente nessa faixa etária, e as possíveis falhas na vigilância dos contatos”, enfatiza Linconl.
Na pesquisa, foi verficada também a existência de falhas no que se refere à realização de exames complementares, que são imprescindíveis para o correto diagnóstico e notificação de um caso de tuberculose. De acordo com Linconl, “para o diagnóstico de crianças, onde se observou elevada proporção de casos em indígenas, é necessário, além dos exames convencionais, a aplicação de um indicador intitulado sistema de pontuação para o diagnóstico de tuberculose na infância, que deve ser aplicado antes do início do tratamento em crianças”. Ainda segundo o pesquisador, “esse indicador leva em consideração alterações radiológicas, sinais e sintomas clínicos, história de contato com doente tuberculoso, situação vacinal com BCG, resposta ao teste tuberculínico e estado nutricional”.
“Entre os indígenas, na maioria dos casos de tuberculose notificados com a forma clínica pulmonar, observou-se baixa proporção de realização de exames de escarro (baciloscopia e cultura) e de teste tuberculínico, assim como ausência de informação sobre o exame de contatos. Ao que parece, a ampla maioria dos diagnósticos foi realizada a partir de critérios clínicos, sem confirmação bacteriológica e sem aplicação do sistema de pontuação; portanto, em desacordo com o preconizado pelo Ministério da Saúde”, alerta Linconl.
Outro achado significativo do estudo mostra que os indígenas apresentaram elevada taxa de reincidência de tuberculose e, contraditoriamente, melhores proporções de cura, abandono, óbito e tratamento supervisionado em relação aos não indígenas. Linconl ressalta, ainda, que esse dado parece contraditório, pois “as falhas observadas no diagnóstico, somadas à precária vigilância dos contatos e à baixa proporção de acompanhamento dos casos sob o regime de tratamento supervisionado, naturalmente, deveriam intervir negativamente nos desfechos dos casos tratados, tornando-os também mais vulneráveis à persistência da doença e ao desenvolvimento de multidrogaresistência”.
Ao final, Linconl constatou que, mesmo com as limitações e fragilidades observadas no Sinan/TB/RO para o período estudado, os dados estimados indicam que as populações indígenas apresentam mais vulnerabilidade ao adoecimento por tuberculose em relação aos não indígenas daquele estado. “Na perspectiva de descentralização do Sistema Único de Saúde (SUS), parece urgente a necessidade de reorganizar o planejamento das ações de controle da tuberculose em Rondônia, com vistas a garantir uma melhor qualidade dos serviços de diagnóstico, tratamento e acompanhamento dos casos em indígenas e, desta forma, produzir informações mais confiáveis e que se aproximem da real situação epidemiológica experimentada por esse segmento da população”.
* Informe Ensp / Agência Fiocruz de Notícias, publicado pelo EcoDebate, 30/07/2009
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