Novos desafios para o planeta, artigo de Marcelo Barros
Imagem: IHU
Apesar de todas as agressões e crimes cometidos contra o Planeta, ainda podemos salvá-lo
[Brasil de Fato] Em torno ao dia 05 de junho que a ONU consagra como “dia internacional do meio ambiente”, o mundo inteiro promove uma série de discussões e eventos que durarão toda a semana. De fato, os problemas ambientais se agravam. Hoje, não há quem não se assuste com a freqüência e a intensidade de inundações e secas, assim como, em algumas regiões do mundo, terremotos e furacões ganham fúria nunca vista.
Como disse Leonardo Boff na assembléia geral da ONU: “se a crise econômica é preocupante, a crise da não sustentabilidade da Terra se manifesta, cada dia mais, ameaçadora. Os cientistas que seguem o estado do Planeta, especialmente a Global Foot Print Network , haviam falado do Earth Overshoot Day, isto é, do dia em que se ultrapassarão os limites da Terra. Infelizmente, os dados revelam que, exatamente no dia 23 de setembro de 2008, a Terra ultrapassou em 30% sua capacidade de reposição dos recursos necessários para as demandas humanas. Neste momento atual, precisamos de mais de uma Terra para atender à nossa subsistência. Como garantir ainda a sustentabilidade da Terra, já que esta é a premissa para resolver as demais crises: a social, a alimentar, a energética e a climática? Agora, não temos uma “arca de Noé” que salve alguns e deixe perecer a todos os demais. Como asseverou recentemente, com muita propriedade, o Secretário Geral desta casa, Ban Ki-Moon: ´não podemos deixar que o urgente comprometa o essencial´. O urgente é resolver o caos econômico, mas o essencial é garantir a vitalidade e a integridade da Terra. É importante superar a crise financeira, mas o imprescindível e essencial é como vamos salvar a Casa Comum e a humanidade que é parte dela. Esta foi a razão pela qual a ONU adotou a resolução sobre o Dia internacional da Mãe Terra (International Mother Earth Day) a ser celebrado no dia 22 de abril de cada ano. Dado o agravamento da situação ambiental da Terra, especialmente o aquecimento global, temos de atuar juntos e rápido. Caso contrário, há o risco de que a Terra possa continuar, mas sem nós” (discurso na ONU – abril de 2009).
Infelizmente, governos e instituições internacionais continuam insistindo no modelo capitalista depredador. Somente o governo americano destinou este ano mais de US$ 4 trilhões a salvar bancos e multinacionais irresponsáveis que perderam dinheiro no cassino financeiro da imprevisibilidade. Este dinheiro do povo, dado aos ricos, “é um valor 40 vezes maior do que os recursos destinados a combater as mudanças climáticas no mundo e a pobreza” (Le Monde Diplomatique Brasil, maio de 2009, p. 3). O próprio governo brasileiro advoga que, contra a crise econômica que assola o planeta e também atinge o Brasil, a solução será consumir e comprar, porque isso gera empregos e receitas. As conseqüências ecológicas desta escolha não se colocam. Menos ainda o a questão ética fundamental. Quantos brasileiros podem viver esta febre do consumo? O PNUD do ano passado confirma: 20% das pessoas mais ricas absorvem 82% das riquezas mundiais, enquanto 20% dos mais pobres têm de se contentar apenas com 1, 6% desta riqueza que deveria ser comum. Uma ínfima minoria monopoliza o consumo e controla os processos econômicos que implicam na devastação da natureza e em uma imensa injustiça social.
Ainda nestes dias, a Câmara dos Deputados aprovou a Medida Provisória 458 que permite legalizar milhares de posse de terras públicas com até 1500 hectares (15 Km2) na Amazônia Legal. A senadora Marina Silva alerta que esta medida acabará de abrir totalmente as portas para a grilagem na Amazônia, para a destruição da floresta, além de favorecer a concentração de terras já escandalosa.
Ao contrário, em alguns países, como a Alemanha e o Canadá, investimentos públicos incentivam o uso de energia limpa, ao mesmo tempo em que contribuem para a luta contra o desemprego. Entretanto, cada vez mais os analistas e cientistas percebem que todo esforço será inútil se não se superar uma economia capitalista que consiste em acumulação de riquezas e desperdício de recursos, em prol de uma economia que preserve o planeta em vez de esgotá-lo.
Para quem vive uma busca espiritual, o cuidado amoroso com a Mãe Terra, com a água e com todo ser vivo fazem parte do testemunho que Deus é amor, está presente e atuante no universo. Apesar de todas as agressões e crimes cometidos contra o Planeta, ainda podemos salvá-lo. Em 2003, a UNESCO assumiu a “Carta da Terra”, como instrumento educativo e referência ética para o desenvolvimento sustentável. Participaram ativamente de sua concepção humanistas e pensadores do mundo inteiro. É preciso que a ONU assuma este documento que qualquer pessoa pode ler e comentar na internet (basta consultar: “carta da terra”). É o esboço de uma “declaração dos direitos da Terra” e toda a humanidade é chamada a conhecê-la e praticá-la.
Marcelo Barros é monge beneditino e autor de 26 livros, dos quais o mais recente é “O Espírito vem pelas Águas”. Ed. Rede-Loyola, 2003.
* Artigo originalmente publicado no Brasil de Fato.
[EcoDebate, 05/06/2009]
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