A solidão no sertão nordestino
O sertão tem perdido a força dos seus jovens atraídos pelas bonitezas que as cidades grandes oferecem, mas nem sempre o sonho vira realidade
Ensaio de Rosângela Trajano
As cidades estão crescendo e ficando cada vez mais atraentes. Seus prédios luxuosos, shoppings bonitos, restaurantes chiques e ruas asfaltadas convidam a um passeio mesmo que não tenhamos um centavo no bolso para comprar uma pipoca vale a pena sair por aí, batendo pernas e vendo como são lindas as cidades grandes!
Tão lindas que estamos deixando o nosso sertão, as nossas casinhas de taipa sem energia para trás. Assim que crescemos abandonamos a enxada e o machado, nos despedimos dos nossos pais e seguimos para a cidade grande, alegamos que é lá onde vamos crescer com mais oportunidades de empregos e estudos.
Esquecemos da vaquinha, do roçado, do velho cajueiro e arrumamos as nossas malas. Partimos com a certeza de que não voltaremos mais para aquele lugar de chão seco e que nunca chove. É isso o que tem acontecido com muitos jovens no nordeste brasileiro.
Por onde passamos vemos apenas crianças pequeninas que ainda estão em processo de formação e os idosos sentados às portas das suas casas com as suas maravilhosas histórias de lobisomens e sacis pererês para nos contar.
O sertão tem perdido a força dos seus jovens atraídos pelas bonitezas que as cidades grandes oferecem, mas nem sempre o sonho vira realidade, como eles pensam. Muitas vezes é melhor continuar cuidando do velho roçado junto com os pais e levando uma vidinha simples do que ser atraído pela ambição de uma vida melhor.
As cidades grandes têm muitos problemas. Os nordestinos sofrem o primeiro impacto ao chegarem nelas quando começam a falar e riem do seu sotaque de falar cantando ou usar expressões regionais, das suas vestimentas com sandálias de couro e camisas de chita e do seu jeito ingênuo que em tudo acredita e se deixa ser levado por palavras bonitas e promessas que nunca serão cumpridas. Por mais desconfiado que seja acaba caindo em armadilhas perigosas de pessoas de má índole.
O sertão ainda é um lugar bom para se morar. O sol quente na cabeça, a enxada nas mãos e a luta pela sobrevivência. Se não faltassem médicos e professores seria o lugar ideal para criarmos as nossas crianças, mas lá onde o sol racha o chão falta de tudo. Até comida e água para beber não existe.
Logo mais crescerão apenas os grandes agricultores, as grandes fazendas, aqueles pequeninos que plantam milho e feijão serão esquecidos num tempo em que não estudar não era problema algum e a palavra valia mais do que uma assinatura.
O sertanejo com a sua coragem e vontade de vencer dias difíceis de seca e sem comida nas panelas, está se tornando um homem frágil e morrendo pelas doenças infecto contagiosas que vêm das cidades grandes.
Até hoje no sertão quando a gente chega mesmo que só tenha um pedaço de pão e uma xícara de café somos bem-recebidos e tomamos um cafezinho com o sertanejo acolhedor. É um homem de bem. É um homem que sabe das lutas da vida, mas este homem está mudando a sua história, o seu lugar de morada e até mesmo as suas crenças. Ele está indo embora de casa para estudar, para trabalhar, para realizar o seu sonho de se tornar um doutor ou um milionário.
Sem falar nas jovens meninas que são atraídas pelos homens de má fé que prometem céus e terras, e quando de passagem pelo sertão as engravidam e depois somem no mundo ou aqueles que as carregam nos seus automóveis chiques para serem prostitutas ou escravizadas em outros países.
Nossos meninos também são levados na maioria das vezes para lugares distantes atraídos por promessas de ganhar dinheiro fácil e acabam sendo escravizados em fazendas, fábricas ou indústrias.
Depois volto com o problema das drogas e facções chegando nos sertões e atraindo os jovens para um mundo cruel da bandidagem que não tem volta.
Eu pediria aos jovens que me leem que não abandonem as suas casinhas de taipa, as suas enxadas por promessas fáceis, se quiserem estudar ou uma vida melhor vão, mas voltem um dia, nem que seja para cuidarem daqueles que ficaram rezando por vocês.
Rosângela Trajano, Articulista do EcoDebate, é poetisa, escritora, ilustradora, revisora, diagramadora, programadora de computadores e fotógrafa. Licenciada e bacharel em filosofia pela UFRN e mestra em literatura comparada também pela UFRN. É pesquisadora do CIMEEP – Centro Internacional e Multidisciplinar de Estudos Épicos. Com mais de 50 (cinquenta) livros publicados para crianças, ministra aulas de Filosofia para crianças na varanda da sua casa, de forma voluntária. Além disso, mora pertinho de um mangue aonde vai todas as manhãs receber inspiração para poetizar.
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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