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Brasil sem desmatamento: documento propõe 12 ações integradas

 

desmatamento flagrado pelo ibama
Desmatamento flagrado pelo Ibama

Para a Coalizão Brasil, é necessário adotar uma abordagem inovadora e ágil para erradicar a derrubada de vegetação nativa e, ao mesmo tempo, fomentar atividades produtivas sustentáveis

A erradicação do desmatamento no Brasil até 2030 demanda uma série de medidas, como a implementação efetiva do Código Florestal, a promoção da rastreabilidade nas cadeias produtivas, o controle das queimadas e o combate ao crime organizado na Amazônia. Estas iniciativas estão entre as recomendações reunidas na publicação “Brasil sem desmatamento: 12 propostas integradas para a conservação e o desenvolvimento sustentável”, lançada pela Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura.

O documento será entregue a diversos órgãos federais, como o Ministério do Meio Ambiente (MMA), o Ibama e o Serviço Florestal Brasileiro. O movimento ressalta que o Brasil se comprometeu em fóruns internacionais a zerar o desmatamento até o fim da década. O debate ganha ainda mais relevância no momento em que o país se prepara para sediar em novembro a Conferência do Clima (COP 30), em Belém (PA), e tenta se posicionar como líder na conservação dos ecossistemas e na transição para uma economia de baixo carbono.

A nova publicação propõe seis ações para zerar o desmatamento ilegal e outras seis medidas para desestimular o desmatamento legal, trazendo uma abordagem integrada e considerando os desafios específicos de cada cenário. Segundo Ane Alencar, colíder da Força-Tarefa (FT) Combate ao Desmatamento da Coalizão, o documento coloca no centro do debate medidas estruturantes que exigem articulação imediata entre todos os setores da sociedade.

“Diante do cenário crítico da crise climática, é imperativo que atualizemos e expandamos nossas propostas para combater o desmatamento com soluções multifacetadas”, avalia Alencar, que também é diretora de Ciência do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam). “O contexto atual nos aponta que já não é o bastante tentarmos deter somente o desmatamento ilegal, mas urge encontrar formas de incentivar que o desmatamento legal também não aconteça. Isso exige a criação de incentivos econômicos para que a floresta em pé tenha mais valor”.

O documento propõe soluções consensuais entre representantes do agro e do movimento ambientalista para o uso adequado da terra, garantindo incentivo à biodiversidade e à segurança alimentar.

A publicação também inclui ações preventivas e mecanismos de governança que envolvam estados e municípios, de acordo com as dinâmicas distintas que existem nas regiões da Amazônia e do Cerrado. Na Amazônia, por exemplo, a destruição é principalmente ilegal, impulsionada pela grilagem de terras, queimadas e atividades criminosas. Já no Cerrado, grande parte do desmatamento ocorre dentro dos limites do Código Florestal, que permite a supressão de até 80% da vegetação nativa em propriedades rurais. Essas realidades exigem soluções específicas e adaptadas a cada contexto.

Leia a seguir as 12 propostas.

Para acessar o documento completo, acesse neste link: https://coalizaobr.com.br/brasilsemdesmatamento/

1. Ações para zerar o desmatamento ilegal:

1.1 – Implementação efetiva do Código Florestal

Assegurar a implementação do Cadastro Ambiental Rural (CAR) como ferramenta essencial de regularização ambiental e de suporte para controle, monitoramento e combate ao desmatamento, viabilizando o monitoramento integrado das propriedades rurais pelo Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (Sicar), em coordenação com o governo federal e as administrações subnacionais.

Concluir a análise do CAR por meio de investimentos em equipes técnicas de órgãos ambientais estaduais e empresas especializadas, além da implementação de sistemas de análise dinamizada. Atualmente, apenas 3,3% dos cadastros no país foram analisados (Climate Policy Initiative/PUC-Rio, 2024). Esse trabalho é essencial para suspender o registro de propriedades privadas sobre florestas públicas, Terras Indígenas (TI), territórios quilombolas e áreas desmatadas ilegalmente.

Desestimular alterações nas legislações de âmbito federal ou estadual que comprometam a implementação do Código Florestal, considerando a importância de acordos multissetoriais para a conservação da vegetação nativa.

1.2 – Combate ao crime organizado relacionado ao desmatamento ilegal

Investir em recursos humanos, financeiros e tecnológicos para viabilizar a ampliação de operações de inteligência contra o crime organizado ambiental;

Integrar a atuação estratégica de órgãos como a Polícia Federal, Ministérios Públicos, forças estaduais e instituições do Sistema Nacional de Meio Ambiente, reagindo de forma efetiva e coordenada contra redes criminosas;

Desmantelar economias ilícitas e crescentemente entrelaçadas que, em muitos casos, têm o desmatamento ilegal, a invasão e apropriação de terras públicas como ponto de partida (Instituto Igarapé, 2022).

1.3. – Promoção de rastreabilidade e transparência nas cadeias produtivas

Desenvolver, consolidar e dar transparência a ferramentas de monitoramento que integrem diferentes bases de dados relacionadas ao ordenamento territorial e à produção agropecuária, como CAR, Guia de Trânsito Animal (GTA) e autorizações de supressão da vegetação (ASV);

Aprovar legislações federais e estaduais que determinem o monitoramento de todos os elos das cadeias de suprimento, em especial da carne e da soja, e incluindo fornecedores indiretos;

Fortalecer os sistemas estaduais de licenciamento e fiscalização ambiental com recursos e tecnologia.

1.4 – Aumento da destinação de florestas públicas para proteção e uso sustentável

Promover a destinação de áreas públicas com vegetação nativa, por meio do Cadastro Nacional de Florestas Públicas (CNFP), para sua proteção como áreas de uso restrito ou sustentável, especialmente em regiões sob forte pressão de desmatamento.

Estabelecer políticas abrangentes de ordenamento territorial e regularização fundiária, com ampla participação pública e social, eliminando conflitos e garantindo segurança jurídica a todos para o uso e ocupação sustentáveis do solo. Esta medida reconhece, entre outros fatores, o papel desempenhado pelas Terras Indígenas na contenção do desmatamento, já que essas áreas perderam apenas 1,2% de sua vegetação nativa nos últimos 30 anos, enquanto nas propriedades privadas a perda foi de 19,9% (MapBiomas, 2023).

Expandir o manejo florestal sustentável por meio da destinação de florestas públicas a concessões florestais federais e estaduais. Ampliar a escala e diversificar as atividades econômicas dessas concessões, incluindo possibilidade de restauração, é fundamental para impulsionar modelos produtivos sustentáveis e frear o avanço da fronteira do desmatamento.

1.5 – Aprimoramento de processo de autorização da supressão da vegetação e de uso do fogo

Fortalecer a estrutura dos sistemas de licenciamento de Autorização da Supressão da Vegetação (ASV) dos estados, garantindo apoio técnico e financeiro e pessoal qualificado;

Dar maior transparência às ASVs e às autorizações para Uso do Fogo Controlado;

Estabelecer critérios e padrões mínimos para a inserção de dados sobre licenças no Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (Sinaflor), promovendo a integração dos sistemas estaduais de licenciamento de ASV e Uso do Fogo Controlado com a plataforma.

Promover ações de comando e controle nos estados baseada na análise qualificada das ASVs.

1.6 – Estabelecimento de ações para prevenção e controle do fogo

Ampliar ações de sensibilização para produtores rurais e comunidades locais sobre os riscos do uso inadequado do fogo e as consequências das queimadas, aliando essa iniciativa à disseminação e capacitação sobre a legislação de Manejo Integrado do Fogo (MIF);

Reforçar a necessidade de regulamentação da aplicação da lei de MIF na escala estadual, promovendo o uso planejado e controlado do fogo em casos autorizados, como práticas culturais e agrícolas tradicionais, e desenvolvendo protocolos claros para sua autorização e monitoramento.

Investir na formação de brigadas locais, construir centros regionais de combate às queimadas e fortalecer parcerias para pesquisas e práticas sustentáveis baseadas na legislação de MIF.

Reforçar a fiscalização e a integração de diferentes instâncias do poder público, instituindo novos mecanismos para responsabilização criminal pelo uso irregular do fogo, aplicando penalidades rigorosas contra esta prática.

2. Ações para desestimular o desmatamento passível de autorização:

2.1 – Promover a implementação da estratégia nacional de bioeconomia

Instituir políticas públicas e incentivos financeiros voltados à bioeconomia, visando aliar o uso sustentável da biodiversidade à geração de empregos e renda para produtores familiares, povos e comunidades tradicionais.

Reduzir custos operacionais e financeiros para viabilizar e impulsionar projetos de bioeconomia, mitigando as principais barreiras à atividade, como infraestrutura precária, falta de conectividade, insegurança, complexidade regulatória, informalidade, desafios logísticos e escassez de mão de obra qualificada. A medida busca criar um ambiente de negócios favorável, dando escala a produtos, insumos e serviços, e atrair empreendedores de alta integridade, fomentando uma economia alternativa a do desmatamento e do tráfico.

2.2 – Fortalecimento do setor de restauração de paisagens e florestas

Garantir recursos e investimentos que possibilitem a execução de políticas públicas de recuperação da vegetação nativa em nível federal e estaduais.

Impulsionar a cadeia da restauração em diferentes frentes, com destaque para fortalecimento do setor de produção de sementes e mudas de espécies nativas.

Fortalecer modelos de parceria público-privada para concessões, para restauração florestal e manejo florestal, que atuam como barreira ao avanço do desmatamento e viabilização econômica para manutenção da floresta em pé, a partir de uma distribuição mais equilibrada de riscos, incluindo aqueles relacionados à segurança pública e incêndios.

Estruturar incentivos financeiros e contratuais que atraiam investidores de alta integridade e assegurem a viabilidade econômica da restauração.

Promover uma abordagem integrada de paisagem em concessões florestais, com políticas públicas que beneficiem comunidades e áreas no entorno das áreas restauradas, criando um ambiente propício para investimentos sustentáveis.

2.3 – Incentivo à silvicultura de espécies nativas

Aprimorar os marcos regulatórios federal e estaduais, visando remover barreiras para o plantio e comercialização de produtos provenientes de espécies nativas, considerando seu potencial de gerar renda, serviços ecossistêmicos e promover conservação da biodiversidade.

Aumentar o volume de investimento público e privado para projetos com espécies nativas, garantindo linhas de financiamento e seguro agrícola para o setor.

Incentivar programas de P&D voltados para o desenvolvimento tecnológico relacionado à produção e consumo sustentáveis de produtos ligados à silvicultura de espécies nativas, tendo como objetivo elevar o potencial da atividade à escala dos principais setores agroindustriais do país.

2.4 – Regulamentação da Lei de Pagamento por Serviços Ambientais

Garantir segurança jurídica para projetos, planos ou programas, públicos ou privados, que visem à conservação dos ecossistemas, dos recursos hídricos, do solo, da biodiversidade, do patrimônio genético e do conhecimento tradicional.

Implementar uma política inclusiva capaz de valorar, em especial, esforços de comunidades tradicionais, povos indígenas, produtores familiares e proprietários de Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN).

2.5 – Regulação do mercado de carbono

Regulamentar o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), assegurando a possibilidade de remuneração para produtores que preservem ou restaurem a vegetação em sua propriedade.

2.6 – Estabelecimento de incentivos financeiros e técnicos para evitar o uso do fogo

Fomentar entre os produtores rurais a transição para modelos de agricultura regenerativa, de forma a reduzir o uso do fogo na paisagem. Isso pode ser viabilizado por meio da promoção de alternativas produtivas de baixo carbono, como a Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (iLPF) e a rotação de culturas; além da ampliação de linhas de crédito específicas para práticas agrícolas sustentáveis;

Promover oportunidades de emprego e renda relacionadas ao manejo integrado do fogo, incentivando a formação de profissionais capacitados para ações contínuas e diversificadas neste campo.

Sobre a Coalizão

A Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura é um movimento composto por mais de 400 organizações, entre entidades do agronegócio, empresas, organizações da sociedade civil, setor financeiro e academia.

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394

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