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Por que prendemos os pássaros em gaiolas?

 

Imagem de sombra de pássaro engaiolado

Foto: Cristian Siallagan / Unsplash

A liberdade dos passarinhos de poderem voar pelos céus, pousarem nas nossas cabeças, fazerem ninhos nos postes de iluminação pública e fugirem dos predadores animais e humanos

Ensaio de Rosângela Trajano

Começo este pequeno ensaio com o poema do nosso amado Manoel de Barros intitulado “De Passarinhos” que nos diz nos seus lindos versos “Para compor um tratado de passarinhos / É preciso por primeiro que haja um rio com árvores / e palmeiras nas margens. / E dentro dos quintais das casas que haja pelo menos goiabeiras…

Ah, a liberdade dos passarinhos de poderem voar pelos céus, pousarem nas nossas cabeças, fazerem ninhos nos postes de iluminação pública e fugirem dos predadores animais e humanos. Sim, humanos, porque eles não conseguem fugir da maldade dos homens e muitas vezes são usados para saciarem as suas fomes e ganâncias por dinheiro.

Na minha pequena casa, os passarinhos vêm me visitar todos os finais de tarde, principalmente os pardais para os quais jogo arroz no meio do quintal. Olho com alegria eles comendo e cantando. É uma festa, uma alegria e o meu coração explode de emoção em poesia. Os meus pardais são os animais mais amados por mim!

Eu gosto de vê-los livres e voando de árvore em árvore, procurando pequeninos galhos para fabricarem seus ninhos e me emocionar com eles dando de comer aos seus filhotes ou os ensinando a voarem. Eu me acordo com os passarinhos cantando. No final da tarde, escrevo poemas com os seus cantos e à noite bela com a lua cheia eles dormem no meu cajueiro, infelizmente eu não tenho uma goiabeira como a do poeta Manoel Barros.

Infelizmente muitos homens prendem os pássaros em gaiolas para vendê-los nas feiras livres, nos mercados clandestinos e até mesmo na internet. Os mais conhecidos e vendidos no Nordeste, região onde moro, são os bem-te-vis, os galos de campina, as graúnas, os pintassilgos e os azulões.

Uma espécie de pássaro que sempre chamou a minha atenção é a do pássaro Bico de Lacre que meus irmãos pequenos criavam engaiolados aqui em nossa casa. Eles eram apaixonados por pássaros e pegaram o hábito com o meu pai de criarem passarinhos presos, eu vez ou outra os soltava nas madrugadas quando todos estavam dormindo e alegre via-os voando indo embora para os céus. Essa espécie de pássaro gosta de morar perto das nossas casas, são encantadores e de uma beleza exótica.

Conta a história que o pássaro Bico de Lacre é de origem africana e veio para o Brasil em navios negreiros para servirem de estimação para os senhores nobres que aqui moravam. Conhecido por ser um pássaro dócil e carinhoso seu canto é considerado belo e muito agradável.

Sobre o pássaro Pintassilgo o seu canto é de uma beleza única e além da plumagem ser muito bonita! Tem vários tipos de cantos e encanta a todos aonde chega. Eu amo pássaros de todas as espécies, mas os pardais são os que mais me encantam, gente. Eu tenho um amor grande por eles talvez por serem os que depois de grande eu pude tê-los ao meu lado sem gaiolas ou alçapões.

O Pardal tem origem no Oriente Médio e se espalhou pela Europa e pela Ásia. Na América chegou por volta de 1850 e aqui no Brasil chegou por volta dos anos 1903 quando o prefeito do Rio de Janeiro Pereira Passos autorizou a sua soltura oriunda de Portugal. É um pássaro muito conhecido nas cidades e no campo. Gosta de fazer ninhos até mesmo dentro das casas abandonadas.

As pessoas costumam vender os pássaros que têm uma beleza e canto bonitos por valores altíssimos, quanto mais o pássaro canta mais ele vale. Por mais que os fiscais do IBAMA tentem impedir esse tipo de comércio mesmo assim ele ainda existe nas feiras e mercados livres, infelizmente. As pessoas não compreendem que os pássaros devem viver livres e que a liberdade Deus deu para os homens e os animais.

Na região Nordeste uma ave que é muito apreciada pelos homens é a Arribaçã que mesmo proibida a sua venda e matança ainda assim ela serve como petisco em alguns bares que não são fiscalizados e até mesmo para matar a fome de famílias que não têm o que comer. É uma pena, mas precisamos falar sobre isso. A arribaçã é muito apreciada na culinária do nordestino e presa fácil dos alçapões feitos de pauzinhos de madeira que servem como armadilhas para prendê-las.

A arribaçã é uma ave típica do sertão nordestino e geralmente faz seus ninhos em qualquer lugar, sendo facilmente encontrada pelos sertanejos elas servem para matar a fome na época de seca grande, mas isso não justifica a sua grande matança, porque muitos homens a matam mesmo para comercializá-las como renda mensal das suas famílias, o que também não justifica sua matança.

Tem gente que gosta de criar pássaros presos em gaiolas, como faziam meus irmãos quando eram pequenos. As gaiolas sempre com pouco espaço, alpiste e água colocados pelo proprietário do pássaro que costuma incentivar a ave a cantar para ele assobiando insistentemente para que o bichinho cante mesmo se sentindo ameaçado naquele pequeno espaço.

Algumas crianças incentivadas pelos pais seguem os seus mesmos caminhos e caçam pássaros para comerem ou aprisionarem em gaiolas e depois os venderem nas feiras. É um comércio grande o de pássaros. Acredito que a fiscalização deveria ser maior nesta área. Não gosto nada de ver pássaros engaiolados. Na verdade, nunca gostei. Acho que a liberdade é uma coisa linda que Deus nos deu de presente e os pássaros têm o direito de voarem livres.

Sem árvores nas grandes cidades eles estão desaparecendo aos poucos e os que resistem fazem seus ninhos em locais inapropriados como postes de iluminação pública impedindo a manutenção de alguns trabalhadores de empresas de energia elétrica conscientes da importância das aves a efetuarem seus serviços para não desmancharem seus ninhos ou matarem seus filhotes.

Desde os tempos mais antigos quando Noé soltou a pomba para ir ver se o dilúvio já estava perto de acabar e ela lhe trouxe um galhinho mostrando que as águas começavam a baixar no mundo e que já havia terra à vista, os pássaros são os melhores amigos do homem em termo de belezura e encantamento.

Prendê-los em gaiolas é um grande erro. Criá-los em cativeiros outro maior ainda. Nas minhas andanças pelo interior do Brasil já passei em casas com muitas gaiolas penduradas nas suas varandas e aquela cantoria de pássaros pra tudo quando era lugar. A gente vê isso mais nas cidades pequeninas, mas também nas cidades grandes existem muitos criadores profissionais de aves silvestres.

Algumas espécies de pássaros silvestres brasileiros estão em extinção, tais como a Arara-Azul e o Sabiá-Castanho seja pela caça indiscriminada, pela derrubada de árvores e queimadas das mesmas, ou seja, pela prisão dessas árvores em cativeiros domésticos. Por mais fiscalização que se faça ainda assim os comerciantes conseguem driblar os fiscais escondendo essas aves em locais impróprios.

Quando criança havia muitos sabiás perto da minha casa. Hoje, a gente já não os vê mais tanto assim. O homem está acabando com a natureza tomado pela ambição e pela vontade de ganhar dinheiro fácil. Um pássaro que canta muito chega a valer um bom preço e às vezes pode ser trocado por algum objeto de valor.

Tem a história de um garotinho que foi meu aluno que inocentemente comprou um pássaro na feira livre em que o vendedor dizia ser um azulão. Quando o garoto chegou em casa e colocou água para o pássaro tomar banho ele começou a mudar de cor. O menino viu que era um pardal e ficou chorando por ter sido enganado. Seu sonho era criar um azulão. Eu disse para ele que não devemos criar pássaros em gaiolas, mas o menino insistiu que um dia ia comprar um azulão e eu fiquei em silêncio e continuei a aula sempre levando o tema da liberdade para sala de aula.

Assim, deixo você com o canto e a boniteza dos pássaros no poema de Mário Quintana intitulado “Poeminho do Contra” que nos diz “Todos esses que aí estão / Atravancando meu caminho, / Eles passarão… / Eu passarinho!” Que sejamos passarinhos iguais a Quintana não permitindo que aqueles que são do contra nos prendam em gaiolas emocionais e físicas, mas que nos deixem livres para amarmos e sermos amados por quem os nossos corações tiverem os olhos de uma graúna.

Rosângela Trajano, Articulista do EcoDebate, é poetisa, escritora, ilustradora, revisora, diagramadora, programadora de computadores e fotógrafa. Licenciada e bacharel em filosofia pela UFRN e mestra em literatura comparada também pela UFRN. É pesquisadora do CIMEEP – Centro Internacional e Multidisciplinar de Estudos Épicos. Com mais de 50 (cinquenta) livros publicados para crianças, ministra aulas de Filosofia para crianças na varanda da sua casa, de forma voluntária. Além disso, mora pertinho de um mangue aonde vai todas as manhãs receber inspiração para poetizar.

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394
 

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